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Nem a cegueira e surdez travaram Sabire, a guardiã da última estátua de um ditador albanês

Gent Shkullaku / AFP

Sabire Plaku, 85 anos, a guardiã da última estátua de Enver Hoxha.

Sabire Plaku, de 85 anos, está parcialmente cega e surda. A albanesa é a guardiã da última estátua de Enver Hoxha, o infame ditador do pequeno país do Báltico.

Uma estátua de bronze de Enver Hoxha, o tirano comunista mais temido e duradouro da Europa, está agora deitada de barriga virada para cima, escondida num estábulo na pequena vila montanhesca de Labinot Mal, na Albânia.

Enver Halil Hoxha foi primeiro chefe do Governo socialista da Albânia, ao qual serviu por quatro décadas. A Albânia era talvez o país mais patriarcal da Europa. As mulheres eram proibidas de herdarem qualquer coisa dos seus pais e eram discriminadas até mesmo em caso de morte.

Enver Hoxha criou um culto de personalidade que deixou a Albânia inundada de estátuas grandiosas, bustos de mármore e retratos gigantes em sua homenagem.

Os anos passaram e, com eles, a adoração pelo ditador. Sobra agora apenas uma estátua de bronze, desgastada pelo tempo e já fora do seu pedestal original. No entanto, ainda é vigiada dia e noite por Sabire Plaku, uma albanesa de 80 anos, parcialmente cega e surda.

“Na sua época, ele era um bom homem, mas já ninguém o quer”, disse Sabire em declarações ao The New York Times. “Eu protegi-o com todas as minhas forças”.

Todos os dias, Sabire dirige-se desde de sua casa até ao estábulo para se certificar que a estátua continua segura. Embora não tenha sido uma defensora acérrima das medidas de Hoxha, Sabire sente-se no dever de zelar pela que é quase certamente a última estátua intacta na Albânia.

Afinal de contas, o falecido ditador foi o homem que colocou a sua remota e agora abandonada aldeia no mapa. Foi lá que Hoxha assumiu pela primeira vez o comando do Partido Comunista da Albânia durante a Segunda Guerra Mundial e presidiu a fundação do Exército de Libertação Nacional, explica o Times.

Sabire é a guardiã do último legado de Hoxha, numa altura em que já nem o Governo se mostra interessado. O museu localizado na vila está em ruínas, com o telhado parcialmente destruído, mas o Governo não parece querer saber. É lá à beira do museu que fica o estábulo que guarda aquela que se acredita ser a última estátua de Hoxha.

A sua remoção foi orquestrada pelo próprio Governo. Muitos sugerem que essa foi a última vez que o Estado prestou tanta atenção à aldeia.

“Vamos colocá-la de volta”, disse Islam Balla, albanês de 72 anos ouvido pelo jornal norte-americano. “Equipas de filmagens virão e vão filmar-nos. Talvez então o mundo se lembre de que ainda existimos”.

Os únicos visitantes são alguns “fanáticos” que chegam uma vez por ano para colocar uma coroa de flores na base do pedestal da estátua tombada, conta Balla.

Ao contrário do seu Governo, Sabire mostra-se preocupada que os ladrões queiram roubar a estátua de bronze e derretê-la para vender na sucata.

Sabire conta agora com a ajuda da sua filha, Fatush Balla, de 66 anos. “Cumpri o meu dever”, disse à sua filha. “Agora é a tua vez de protegê-lo”.

Daniel Costa, ZAP //

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