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Relação anula acórdão que acusava Ivo Rosa de violar a “legalidade democrática”

Manuel de Almeida / Lusa

O desembargador autor do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que acusou o juiz Ivo Rosa de quebrar a “legalidade democrática” foi obrigado a reconhecer a nulidade de um acórdão de fevereiro de 2019.

O desembargador autor do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa acusou o juiz Ivo Rosa de quebrar a “legalidade democrática” ao exorbitar “flagrantemente o limite das competências do juiz de instrução” durante fase de inquérito e “violar a autonomia do Ministério Público”.

Tudo aconteceu devido a uma reclamação apresentada pela defesa de António Mexia e João Manso Neto, cuja equipa é liderada pelo advogado João Medeiros, que suscitava a declaração de nulidade do referido acórdão.

Medeiros invocava um erro do desembargador Ricardo Cardoso no ato da distribuição: não se tinha declarado impedido de participar nos autos do caso EDP pela sua mulher, Anabela Cardoso, também desembargadora na Relação de Lisboa, já se ter pronunciado por duas vezes no mesmo processo — como obrigava o Código de Processo Penal que estipula que os juízes que sejam cônjuges não podem tomar decisões sobre o mesmo processo. Não tendo feito isso, a defesa alegava que se verifica uma nulidade insanável.

Ricardo Cardoso, secundado pelo desembargador Artur Vargues, deu razão à defesa de António Mexia e João Manso Neto, de acordo com o Observador. Cardoso alega no acórdão emitido com a data de 26 de março de 2019 que não sabia que a sua mulher tinha tido intervenção nos autos do caso EDP.

“No caso referido, do relator Espírito Santo, o seu adjunto é e foi quase sempre, com exceção de um muito curto, outro que não a senhora desembargadora Anabela Simões Cardoso, pelo que a intervenção desta não nos era conhecida, nem sequer imaginável, tendo-nos passada totalmente despercebida a todos“, escreve Ricardo Cardoso.

Ricardo Cardoso e Artur Vargues, contudo, fazem questão de dizer que tal desconhecimento não se verificará na equipa da defesa de Mexia e Manso Neto.

“Eram conhecedores da totalidade de todos os antecedentes e muito variados acórdãos proferidos nos vários recursos do caso, em processos — sempre — autónomos e separadas, como demonstra a junção, em 24 horas após a publicação do acórdão, do assento de nascimento da senhora desembargadora, com averbamento do casamento com o relator”, lê-se no acórdão.

Só após a publicação do acórdão de fevereiro, e consequente recurso da defesa, é que “nos foi conhecido o impedimento do relator”– o qual não foi declarado, repete Ricardo Cardoso, por “desconhecimento.”

O que acontece agora é a apreciação do recurso do Ministério Público que esteve na origem do acórdão de fevereiro de 2019 agora anulado. Terá de ser repetida, sendo efetuada nova distribuição na Relação. Ricardo Cardoso não poderá apreciar esta questão.

Em causa, estava um despacho de Ivo Rosa de 23 de maio de 2018, no qual o juiz de instrução declarou nulas, a pedido da defesa de Mexia e Manso Neto, uma série de decisões dos procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto, titulares da investigação do caso EDP, sobre os presidente e administrador da EDP — ambos arguidos pelos alegados crimes de corrupção ativa e participação económica em negócio.

Os desembargadores Ricardo Cardoso e Artur Vargues tinham decidido a 19 de fevereiro comunicar o seu acórdão ao Conselho Superior da Magistratura para posterior avaliação disciplinar contra o juiz Ivo Rosa.

Os desembargadores acusavam o magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal de estar a violar anteriores decisões da Relação de Lisboa e a violar “a jurisprudência “pacífica” dos tribunais superiores, “que Ivo Rosa não desconhece” com interpretações “peregrinas”, “extravagantes e marginais” reveladoras “do desconhecimento do propósito do legislador”.

Além disso, Ricardo Cardoso afirma que a atuação do juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal ao longo de todo o caso EDP “resulta na obstaculização à aquisição de prova indiciária ainda antes de saber se ela existe e do conhecimento do seu teor”.

Apesar de declararem como nulo esse acórdão de fevereiro, os desembargadores Cardoso e Vargues decidiram manter essa comunicação disciplinar ao CSM, “independentemente do trânsito”. “Pela inusitada tramitação dos autos até ao presente incidente, com as muitas tomadas de tempo e de trabalho, remeta-se certidão ao Conselho Superior da Magistratura”, lê-se no acórdão

ZAP //

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