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“Regresso à Idade Média”. Itália relança polémica sobre burkini nas praias europeias

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A localidade turística italiana de Monfalcone, no norte de Itália vai proibir as mulheres de se banharem na praia vestidas, anunciou hoje a autarca do partido anti-imigração Liga, relançando uma discussão recorrente no verão na Europa.

“Estamos a trabalhar numa medida adequada que proíba os banhos de mar vestidos, de ‘burkini’ ou cobertos de outra forma”, declarou no início desta semana Anna Maria Cisint, autarca de Monfalcone, uma localidade portuária no golfo de Trieste, perto da fronteira com a Eslovénia.

“Somos pessoas sérias, e até outubro terei pronta uma medida”, acrescentou a autarca.

Anna Maria Cisint, que é membro do partido do vice-primeiro-ministro Matteo Salvini, conhecido pelas suas posições anti-imigração, ‘recuperou’ esta ideia, que já lançara em julho, depois de, no passado domingo, na praia de Lido Pedoci, ter estalado uma discussão entre banhistas locais e mulheres muçulmanas.

A Lido Pedoci, próxima de Monfalcone é conhecida por ser a única na Europa com áreas separadas para homens e mulheres, isoladas por um muro.

A discussão ocorreu quando banhistas locais protestaram contra as mulheres muçulmanas,  que pretendiam banhar-se vestidas, levando à intervenção da segurança -, que ‘convidou’ as banhistas com o corpo tapado a abandonar a praia.

O presidente da câmara de Triste, Roberto Dipiazza, da Força Itália, tomou também uma posição inequívoca na ocasião, ao comentar que “se os muçulmanos vêm para Itália, têm de se adaptar aos costumes do país”.

A Força Itália, partido de centro-direita, é parceiro da coligação governamental da qual fazem parte os Irmãos de Itália da primeira-ministra Giorgia Meloni e a Liga de Salvini.

Ao anunciar a sua intenção de proibir nas águas de Monfalcone os chamados ‘burkinis’ – os mais conhecidos fatos de banho usados pelas muçulmanas, que cobrem a maior parte do corpo -, Anna Maria Cisint argumentou que a ideia é evitar “um regresso à Idade Média”.

Até à eventual adoção da medida, as autoridades não podem impedir ou punir quem decida nadar no mar com um ‘burkini’.

Mas, segundo Cisint, que já escreveu mesmo uma carta aberta à comunidade muçulmana a desaconselhar banhos de mar com roupa, “pelo menos o aviso verbal foi suficiente para reduzir o número de casos”.

Embora a autarca tenha anunciado a intenção de proibir os ‘burkinis’ por lei, a competência neste tipo de matérias não é municipal, e a última vez que um presidente de câmara tentou avançar com idêntica legislação, foi condenado a pagar uma indemnização por discriminação racial.

O episódio aconteceu já há 14 anos, em 2009, quando o então presidente da câmara de Varallo Sesia, na região de Piemonte, também no norte de Itália, colocou sinais no território do município a proibir o ‘burkini’, a burqa e o niqab, alegando que a proibição tinha sido estabelecida por uma portaria, quando na realidade esta apenas interditava o rosto coberto.

Cinco anos mais tarde, Gianluca Buonanno foi condenado a pagar uma indemnização a duas pessoas que apresentaram queixa por se sentirem discriminadas.

As poucas decisões tomadas até agora em Itália a visar a proibição do véu islâmico foram praticamente todas anuladas, dado não ser possível impor restrições ao vestuário por motivos religiosos com base no artigo 9.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

A única norma em vigor em Itália é precisamente um regulamento na Lombardia que proíbe a burqa em locais públicos como hospitais e escritórios administrativos, por razões de segurança.

As restrições ao vestuário por motivos religiosos não são permitidas pelos tratados internacionais – de que a Itália é cossignatária -, mas uso de ‘burkinis’ tem sido alvo de contestação e polémica na Europa já há alguns anos, e não somente em países com governos de extrema-direita, sendo França o país onde o assunto tem gerado mais polémica e casos em tribunal.

Sobretudo desde 2016, após atentados terroristas de grande envergadura cometidos por radicais islâmicos, em Paris e Nice, a questão entrou na ordem do dia e têm-se sucedido os casos que terminam em tribunal.

As proibições de uso de ‘burkinis’ em praias, como aquela imposta há alguns anos em Marselha, no sul de França, foram anuladas por decisões de tribunais, mantendo-se a proibição em piscinas públicas, mas por razões sanitárias, e neste caso a Justiça até já teve foi de anular decisões de autoridades locais que queriam permitir o seu uso, como sucedeu na cidade de Grenoble (sudeste), no ano passado.

Em muitos outros países europeus a utilização de ‘burkinis’, designadamente em piscinas, tornou-se alvo de polémica ao longo dos últimos anos, incluindo em Portugal, onde não há qualquer proibição em vigor.

Ainda assim já se registaram “incidentes”, como em 2017, em Albufeira, Algarve, quando duas mulheres britânicas muçulmanas receberam ordem de expulsão de uma piscina de um hotel por estarem vestidas.

As duas mulheres garantiram ter sido humilhadas na piscina do complexo turístico onde estavam alojadas com outros familiares, por estarem a usar burkini. “Não me permitiram usar o equipamento de banho com que me sinto confortável“, queixou-se uma das britânicas.

Com uma coligação de direita e extrema-direita atualmente no poder, Itália ameaça tornar-se ainda este verão e nos próximos o novo país por excelência da polémica em torno do uso de ‘burkinis’ por mulheres muçulmanas nas praias europeias.

ZAP // Lusa

2 Comments

  1. «…Anna Maria Cisint argumentou que a ideia é evitar “um regresso à Idade Média…» – Na Idade Média homens e mulheres tomavam banho completamente nus nos rios, lagos, e mares, pela Europa fora, sem qualquer problema, a dr.ª Anna Cisint não sabe o que está dizer ou então é mal-intencionada.

  2. Numa Praia , o ridículo não mata , podem exibir a suas pertences Religiosas a vontade . Numa Piscina Municipal , é fora de questão , é higienicamente contestável !

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