As regras da atracção: porque nos “apaixonamos” por certas pessoas?

Atracção por similaridade: geralmente gostamos de pessoas que são como nós. Novo estudo revela uma das razões.

Esperamos que o João Gobern não fique aborrecido por termos trazido para o título deste artigo o nome de um dos seus programas na Antena 1.

Certamente conhece alguém – ou o próprio leitor é um exemplo – que namora, ou tem uma relação de amizade forte, com uma pessoa que conheceu pouco antes do início dessa relação. Não foi “amor à primeira vista”, mas quase.

Gestos simples, momentos singelos, opiniões comuns, um ou dois encontros. E está.

É o efeito de atracção por similaridade: gostamos de pessoas que são como nós. E não é preciso muito tempo de convivência.

Um novo estudo revela uma das origens para essa atracção – que se aplica a relações de amizade no geral, não só a namorados ou casados. A análise foi elaborada pelo professor Charles Chu e foi publicada no Journal of Personality and Social Psychology da American Psychological Association.

Motivo fulcral: o raciocínio auto-essencialista. Ou seja, as pessoas imaginam que têm um núcleo ou uma essência interior profunda que molda quem elas são, os seus interesses, gostos e desgostos; e assumem que a mesma essência vai moldar a outra pessoa – e assim os dois vão ter visões semelhantes.

“Argumentamos que acreditar que as pessoas têm uma essência subjacente permite-nos assumir ou inferir que, quando vemos alguém que partilha uma única característica, essa pessoa também deve partilhar toda a minha essência profundamente enraizada”, explicou Chu, citado no Science Daily.

Mas esta pressa em encontrar uma “alma gémea” pode acabar mal – porque pode estar baseada num pensamento falso. E pode restringir a lista de candidatos. Porque, muitas vezes, descartamos logo alguém só porque a outra pessoa não é do nosso partido político ou porque gosta de ver uma série que nós odiamos. “Somos todos tão complexos”, lamenta o autor do estudo.

As mentes dos outros costumam ser um mistério para nós mas este estudo mostra que, muitas vezes, preenchemos esse mistério com a noção da nossa própria identidade. Isso pode originar suposições erradas, sem fundamento.

Versão 1

Este estudo não é um estudo, de facto. São quatro estudos. Todos a pensar porque nos aproximamos de determinada pessoa, em vez de outra.

No primeiro estudo, Jamie era a protagonista. Jamie não existia: foi uma pessoa criada com atitudes parecidas ou opostas em relação aos participantes.

Depois de saber a opinião dos participantes em relação a um destes cinco temas – aborto, pena de morte, posse de armas, testes em animais e eutanásia – Chu perguntou como se sentiam em relação a Jamie, que podia concordar ou discordar.

Também fez perguntas sobre as raízes da sua identidade para medir sua afinidade com o raciocínio auto-essencialista.

Conclusão: quanto mais um participante acreditava que a sua visão do mundo era moldada por um núcleo essencial, mais se sentia ligado à Jamie que tinha as mesmas opiniões.

Versão 2

Jamie continuou a estar presente, mas em assuntos menos relevantes para a Humanidade: contar e categorizar pontos azuis numa página (superestimadores ou subestimadores).

Conclusão semelhante: quanto mais alguém acreditava num núcleo essencial, mais próximo se sentia de Jamie como um colega super ou subestimador.

Versões 3 e 4

Nas últimas duas experiências, o autor do estudo começou a interromper esse processo de atracção: eliminou a influência do raciocínio auto-essencialista.

No terceiro estudo, rotulou atributos (como gostar de uma certa pintura) como essenciais ou não essenciais.

No último, disse aos participantes que usar a sua essência para julgar outra pessoa poderia levar a uma avaliação imprecisa, errada, dos outros.

“Isso quebra esse processo de raciocínio essencialista, corta a capacidade das pessoas de assumir que o que estão a ver reflecte uma semelhança mais profunda”, justificou Chu.

O investigador recordou as pessoas que “essa dimensão de similaridade não está realmente conectada ou relacionada com a sua essência; a outra maneira foi dizer às pessoas que usar a sua essência como forma de entender outras pessoas não é muito eficaz“.

Comunidade

Uma das conclusões desta análise será consensual: andamos todos a procurar uma comunidade onde nos podemos divertir e ter tempo com pessoas que partilham os nossos passatempos e interesses.

“Esse tipo de pensamento é uma estratégia psicológica heurística realmente útil. Permite que as pessoas vejam mais de si mesmas em novas pessoas, em estranhos“, analisou – mas também exclui as pessoas, estabelece divisões e limites, “às vezes no terreno mais frágil”.

Porque percebe-se quando “respiramos um pouco e desaceleramos” quando ouvimos alguém a ter a nossa opinião; mas essa opinião não é uma certeza universal, não é preciso insistir nela até ao fim.

Não é isso que faz a outra pessoa “fundamentalmente boa como eu, ou fundamentalmente má porque é diferente de mim”.

Tudo é moldado pelos julgamentos que fazemos uns dos outros. Mas podemos formar impressões sobre outros sem estarmos – sempre – a falar sobre nós mesmos.

ZAP //

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