Os portugueses estão a comprar, através da Internet, medicamentos falsos contra doenças graves como as cardiovasculares, a tuberculose e o cancro, o que preocupa as autoridades, devido aos riscos que estes doentes correm.
O alerta é do presidente da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), Hélder Filipe, que recentemente foi o anfitrião de uma reunião que juntou em Lisboa alguns dos principais especialistas europeus, no combate ao tráfico de medicamentos falsificados.
Em entrevista à agência Lusa, Hélder Filipe revelou que, em 2014, foram intercetadas pelas autoridades cerca de 24 mil embalagens postais com produtos, no total de perto de meio milhão de unidades potencialmente medicamentosas.
Os supostos medicamentos para a disfunção erétil continuam a ser dos mais adquiridos por este meio, tal como para o emagrecimento, mas o que está a preocupar as autoridades é o perfil dos alegados fármacos que estão a ser adquiridos por esta via, e que “está alterar-se”.
“Assistimos a um crescimento significativo de outro tipo de medicamentos, nomeadamente usados em doenças cardiovasculares, hormonas, para doenças oncológicas, entre outros”, disse, concluindo que “o fenómeno está a mudar, em termos de oferta, para produtos diferentes das classes clássicas”, o que traz mais riscos para a saúde pública.
Também os tuberculostáticos (medicamentos para a tuberculose) estão a ser identificados nestes percursos que, normalmente, são promovidos por “redes altamente complexas de crime organizado”.
“Mais uma vez, para uma doença infecciosa, que tem de ser tratada e deve ser tratada de maneira adequada e com medicamentos de confiança. Isto é um problema”, afirmou.
O presidente do Infarmed recorda que, em média, metade dos medicamentos encomendados pela Internet é falsa.
Receitas e receios
Segundo Hélder Filipe, quem adquire os medicamentos por esta via fá-lo para “evitar as barreiras de acesso que o próprio sistema regulado impõe: receita médica e a exposição do potencial utilizador relativamente a um profissional de saúde”.
Em certas ocasiões, adiantou, o consumidor tenta ter acesso a medicamentos que, “por boas razões”, não consegue adquirir no mercado legal, por tal não ser possível.
O presidente do Infarmed avança que os preços nem sequer são a principal razão para a compra destes medicamentos pela Internet, pois em certos casos estes acabam por ser mais caros do que no mercado legal.
“As barreiras são de outro tipo”, disse.
As autoridades confrontam-se ainda com dificuldades em “perceber verdadeiramente as consequências da utilização destes medicamentos”, sabendo-se, contudo, que há um risco de o produto falsificado ter metade da dose, não ter qualquer substância ativa ou ter, mas com impurezas.
“Quando analisamos um produto falsificado, não sabemos verdadeiramente o que vamos encontrar. O que vai na composição do rótulo, se o produto está falsificado, é seguramente diferente das características do produto falsificado”.
Hélder Filipe apontou um outro fenómeno relacionado com os suplementos alimentares: “Teoricamente são suplementos alimentares, mas quando fazemos a análise encontramos na sua composição medicamentos, embora não declarados no rótulo”.
O presidente do Infarmed garante que não foi até ao momento identificada qualquer produção em Portugal de medicamentos falsificados.
Estes chegam de várias partes do globo, na esmagadora maioria dos quais por encomenda postal, como Extremo Oriente, Índia, Brasil ou Estados Unidos.
Nos casos de identificação do produtor de medicamentos falsos, a lei em vigor, e que está em vias de ser alterada, apenas punirá as situações de saúde que forem atribuídas ao consumo do produto.
“Estamos a tentar que haja alterações à própria legislação, na sequência de termos assinado a convenção Medicrime, que nos dá uma obrigação de traduzirmos os princípios assinados para a legislação nacional”.
Para Hélder Filipe, “a mudança da legislação nacional fará com que seja mais fácil punir quem intervém neste crime de falsificação dos medicamentos”.
/Lusa