“Não é seguro e custa muito dinheiro”. Portugal junta-se à Alemanha e critica proposta europeia sobre energia nuclear

Mário Cruz / Lusa

O ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes

Portugal junta-se à Alemanha, à Áustria e à Dinamarca e está contra os investimentos europeus na energia nuclear, afirma Matos Fernandes. Sobre o gás natural, o Ministro do Ambiente já tem outra posição.

Em declarações ao ECO, o Ministro do Ambiente e da Acção Climática, João Pedro Matos Fernandes, deixou bem clara a posição portuguesa sobre o uso de energia nuclear — e a resposta é um redondo não.

O debate sobre a energia voltou a aquecer depois da recente proposta da Comissão Europeia, que abre a porta a que a energia nuclear e o gás natural sejam consideradas “verdes” e que possam por isso receber financiamento europeu no âmbito da transição energética necessária para o combate às alterações climáticas.

A posição portuguesa já era conhecida desde o último Conselho Europeu, em Dezembro, onde António Costa, sendo a energia foi um dos temas em debate.

Não se alcançou um acordo, com o primeiro-ministro a revelar que “por um lado, um conjunto de países insistem que se deve considerar a energia nuclear como uma energia importante para a transição climática”.

No entanto, há “uma maioria significativa de países”, entre os quais Portugal, “que recusa ver a energia nuclear como uma energia verde e segura”, afirmou Costa.

O Ministro do Ambiente reforçou a oposição portuguesa que já tinha sido avançada pelo chefe do Governo, recusando o uso da energia nuclear, mas não fechando a porta ao uso do gás natural.

“Os tempos recentes provam que só a aposta nas energias renováveis pode defender a Europa dos elevados preços de produção de eletricidade. São estas energias — as renováveis — aquelas que devem constar da taxonomia”, defende Matos Fernandes.

A questão energética tem dividido bastante o bloco europeu, tanto que até o eixo franco-alemão está de costas voltadas nestes assunto. A França, que é o país do mundo mais dependente da energia nuclear e que recentemente anunciou que vai voltar a construir reactores, é uma grande adepta desta alternativa e tem pressionado a UE nesse sentido, argumentando que permite manter os custos de produção baixos e cumprir as metas climáticas.

Já a Alemanha, tal como Portugal, é uma forte opositora da energia nuclear, lembrando os desastres ambientais de Chernobyl e Fukushima, os problemas com o armazenamento dos resíduos resultantes da produção e até apontou para um relatório que detalha fissuras nos canos de reactores nucleares franceses como um lembrete dos riscos da energia nuclear.

Portugal juntou-se aos alemães e ao Luxemburgo, Áustria e Dinamarca na última conferência do clima das Nações Unidas (COP26) numa declaração conjunta que defende a “taxonomia” de projetos energéticos da UE livres de energia nuclear.

“É uma má decisão colocar o nuclear dentro da taxonomia europeia. Não é seguro, não é sustentável e custa muito dinheiro“, critica o Ministro, que acredita que o dinheiro gasto na energia nuclear deve ser antes investido nas renováveis.

O responsável da pasta do Ambiente reforça que “precisamos de energia, mas que não venha de [combustíveis] fósseis” e que também não crie “lixo nuclear”, como já tinha dito em Glasgow.

Sobre o gás natural, a posição já é outra, com o executivo a defender que “a Europa e Portugal precisam de infraestruturas de transporte de gases renováveis”, especialmente no exemplo do hidrogénio verde.

“Para que se possa abastecer o centro da Europa, essas infraestruturas terão de ser construídas o mais depressa possível. Por isso, Portugal defende a inclusão na taxonomia das infraestruturas que sirvam para o transporte de gases renováveis, mesmo que, transitoriamente, estas só sejam viáveis, do ponto de vista económico, se transportarem gás natural”, rematou Matos Fernandes ao ECO.

Estas declarações surgem já depois da associação ambientalista Zero ter felicitado a oposição portuguesa à energia nuclear ao mesmo tempo que pediu ao Governo que adoptasse a mesma visão sobre o gás natural.

“Portugal tem um conjunto de investimentos ainda previstos no que respeita à rede de gás natural e que estiveram em discussão pública há poucos meses no âmbito do Plano Decenal Indicativo de Desenvolvimento e Investimento da Rede Nacional de Transporte, Infra-estruturas de Armazenamento e Terminais de GNL”, lembrou a associação, que exigiu que o executivo esclarecesse a sua posição.

A inclusão da energia nuclear é uma tema que já está a ser discutido em larga escala desde Abril de 2021, quando a União Europeia anunciou a criação de uma Taxonomia no âmbito do Green Deal — um guia de normas que determina quais os investimentos “verdes” em vários sectores.

A 1 de Janeiro, a Comissão Europeia divulgou a sua proposta de critérios que determinam quais os investimentos que merecem ser considerados para receberem fundos europeus, que inclui tanto o gás natural como a energia nuclear.

A proposta suscitou muitas críticas da Alemanha, que tem vindo a fechar as suas centrais nucleares, e também da Áustria, com Viena mesmo a ponderar avançar legalmente contra a Comissão.

A análise à proposta vai agora ser feita pelo Conselho, precisando do apoio de pelo menos 20 estados-membros que representem 65% da população do bloco europeu, para poder avançar. O Parlamento Europeu também a pode rejeitar.

Adriana Peixoto, ZAP //

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