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Ordens do médico. A Peste Negra mudou os hábitos de beber álcool

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O projeto Intoxicating Spaces tem explorado a forma como as pandemias influenciaram o uso de intoxicantes, incluindo padrões de consumo de álcool, no passado.

As mortes por álcool na Inglaterra e no País de Gales em 2020 foram as mais altas em 20 anos. Os dados da Public Health England sugerem que a pandemia de covid-19 é, pelo menos parcialmente, responsável pelo aumento. A interrupção das rotinas de trabalho e sociais levou a uma onda de consumo de álcool perigoso dentro de casa.

Segundo o projeto Intoxicating Spaces, os sucessivos surtos de Peste Negra que atingiram Inglaterra, especialmente Londres, no século XVII (1603, 1625, 1636 e 1665) causaram mudanças semelhantes nos hábitos de beber das pessoas.

Como hoje, os surtos repentinos e assustadores de doenças restringiram o acesso a pousadas, tabernas, cervejarias e outros locais públicos para beber – os pilares da sociabilidade dos primeiros tempos modernos.

Uma medida de 1665 em Londres, por exemplo, identificou “bebericar em tabernas, cervejarias, cafés e adegas” como “a maior ocasião para dispersar a peste” e impôs o recolher obrigatório às 21h.

É difícil determinar até que ponto essas regras alteraram a relação das pessoas do século XVII com o álcool. Porém, as evidências sugerem que pode ter ocorrido uma mudança em que se começou a beber em casa.

Numa meditação de 1722 sobre o surto de Londres de 1665, “Preparativos para a Peste”, Daniel Defoe contou a história de um dono de uma mercearia de Londres que voluntariamente se isolou com a sua família durante a pandemia. Entre as provisões que reuniu estavam 12 barris de cerveja, tonéis com quatro variedades de vinho; 16 galões de conhaque; e “muitos tipos de águas destiladas”.

Segundo Defoe, eram “suprimentos necessários” porque, naquele período, pensava-se que o álcool tinha valor medicinal e o seu consumo moderado durante os surtos de peste era ativamente encorajado.

Ordem do médico

Os médicos acreditavam que o álcool funcionava como prevenção para a peste.

Em primeiro lugar, acreditava-se que o consumo de cervejas, vinhos e destilados fortalecia os principais órgãos de defesa do corpo, o cérebro, o coração e o fígado. Eram especialmente benéficos quando tomados no início da manhã.

No seu tratado sobre a peste de 1665, “Medela Pestilentiae”, o escritor médico Richard Kephale afirmou que é bom “beber meio litro de maligo [vinho de Málaga ou porto] pela manhã contra a infeção”.

Além disso, acreditava-se que o álcool afastava os estados mentais de medo que induziam a melancolia – terminologia moderna inicial para depressão -, que tornava as pessoas mais vulneráveis ​​a contrair a peste.

Segundo Defoe, o stock de bebidas alcoólicas do dono da mercearia não era para “alegria ou bebedeira” dele e da família, mas sim “para não deixar os seus espíritos afundarem ou ficarem abatidos, como em tais ocasiões melancólicas deveriam fazer”.

O médico William Simpson, no seu tratado sobre a peste de 1665, “Zenexton Ante-Pestilentiale”, defendeu “beber bebidas alcoólicas boas e saudáveis” para “alegrar o coração” e “causar alegria”. Isso baniria “muitas ideias enormes de medo, ódio, ansiedade, tristeza e outros pensamentos desconcertantes” e “fortaleceria o bálsamo da vida”.

O ponto-chave era o álcool ser “moderadamente ingerido”. Beber em excesso, a ponto de ficar embriagado, era advertido e “viver com temperança com uma dieta boa e generosa” permanecia como base para a maioria dos remédios contra a peste.

No entanto, é provável que a interrupção dos padrões de trabalho e lazer, juntamente com as ansiedades diárias de viver numa cidade assolada pela peste, terá levado muitos aos consolos psicológicos da garrafa de uma forma mais perigosa e habitual.

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3 Comments

  1. Sabe-se que o consumo do álcool também aumentou desde a consolidação da pandemia do Covid-19. No Brasil há informações de que a epidemia de gripe espanhola, entre o final de 1918 e o início de 1919, provocou a invenção da famosa “caipirinha”, bebida em que entram aguardente (pinga), limão e açúcar. Acreditava-se que a bebida era eficiente contra o vírus.

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