Os tardígrados sobrevivem a doses brutais de radiação. Usam um truque surpreendente

ZAP // Dall-E-2

Os tardígrados conseguem sobreviver a uma dose de radiação 100 vezes superior à que seria letal para qualquer outra criatura. Qual o seu segredo? Em vez de ter um escudo protetor, simplesmente conseguem aumentar dramaticamente a sua capacidade de reparação dos danos no ADN.

Os famosos tardígrados, ou ursos-de-água, são provavelmente o único animal indestrutível da Terra.

Estas pequenas criaturas microscópicas podem aguentar quase tudo o que os humanos se lembram de lhes fazer, e vão à sua vida, perfeitamente intactas, nas suas oito patas atarracadas.

As estratégias por detrás das proezas de sobrevivência destes extremófilos são múltiplas, desde uma proteína supressora de danos que protege literalmente o seu ADN, a um estado de desidratação e animação suspensa em que podem entrar quando as condições externas se tornam insustentáveis.

Agora, os cientistas descobriram mais um surpreendente super-poder dos tardígrados: são capazes de aumentar dramaticamente a sua capacidade de reparação de danos do seu material genético.

Num novo estudo, uma equipa de investigadores da Universidade da Carolina do Norte, liderada pela bióloga Courtney Clark Hachtel, observou a reação dos tardígrados à exposição a doses letais de raios gama.

Os resultados do estudo foram apresentados num artigo publicado a semana passada na revista Current Biology.

O que vimos surpreendeu-nos“, diz o biólogo Bob Goldstein, investigador da Universidade da Carolina do Norte e co-autor do estudo. “Os tardígrados estão a fazer algo que não esperávamos.”

Há décadas que se sabe da fascinante resistência dos tardígrados à radiação ionizante. Conseguem sobreviver a uma dose 100 vezes maior do que a que seria letal para os humanos — e continuam a sua vida minúscula como se nada fosse.

Os cientistas acreditam que a Dsup, uma proteína de supressão de danos, desempenha um papel importante nos mecanismos de defesa e sobrevivência de alguns tardígrados.

No entanto, nem todas as espécies de tardígrados têm Dsup ou um homólogo desta proteína, o que sugere que há outros meios de sobrevivência em jogo.

Para identificar o fator em falta, conta o Science Alert, os autores do estudo investigaram o efeito da radiação gama numa espécie de tardígrado chamada Hypsibius exemplaris. Para tal, colocaram os tardígrados num irradiador que expôs as criaturas a raios gama emitidos pelo decaimento do césio-137.

O césio-137 sofre decaimento radioativo para bário-137, emitindo partículas beta e raios gama. Os raios gama emitidos são de alta energia e possuem alto poder de penetração, sendo nocivos para os seres vivos, pois podem afetar a estrutura das células.

Uma vez que a quantidade de radiação aplicada é conhecida, foi possível expor os tardígrados a doses específicas: uma dose mais baixa, dentro de níveis toleráveis, e uma dose letal muito mais elevada.

Para surpresa dos investigadores, embora o H. exemplaris tenha Dsup, a exposição à radiação não desencadeou os mecanismos de proteção do ADN dos tardígrados — que sofreu grandes danos.

Em vez disso, os tardígrados aumentaram a produção de genes de reparação do ADN, de tal forma que  se tornaram dos mais abundantes nos seus corpos microscópicos. 24 horas após a exposição à radiação, os tardígrados tinham reparado a maior parte do ADN danificado pela radiação ionizante.

Os investigadores expressaram então alguns dos genes de reparação dos tardígrados numa cultura de Escherichia coli e expuseram amostras da bactéria à radiação ionizante.

As bactérias que tinham sido inoculadas com genes de tardígrados mostraram uma capacidade de reparação de ADN semelhante à observada na H. exemplaris, mas não observada na E. coli não tratada.

Isto sugere, segundo os investigadores, que o H. exemplaris é capaz de sentir a radiação ionizante e montar uma resposta que lhe permite sobreviver a doses que obliterariam outros animais.

“Estes animais estão a reagir de forma incrível à radiação, o que parece ser o segredo das suas capacidades extremas de sobrevivência”, afirma Clark-Hachtel num comunicado da UNC publicado no EurekAlert.

“O que estamos a aprender sobre a forma como os tardígrados superam o stress da radiação pode levar a novas ideias sobre a forma como podemos tentar proteger outros animais e microorganismos da radiação prejudicial”, acrescenta a investigadora.

Bem, que mais se poderia esperar de uma espécie que será provavelmente a única na Terra a ver o Sol morrer?

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