O diploma que regula o teletrabalho prevê que os empregadores paguem o acréscimo nas despesas dos trabalhadores e obriga-os a aceitar que pais com crianças até oito anos trabalhem à distância.
Uma das maiores mudanças trazidas pela pandemia foi o recurso generalizado ao teletrabalho, que passou de uma modalidade laboral relativamente pouco usada a algo comum. Há a possibilidade deste hábito se tornar mais comum e ser um prática mais recorrente e a covid-19 também expôs as fragilidades da legislação laboral neste campo, e foi para colmatar estas falhas que o governo avançou com um pacote de mudanças para adaptar as regras teletrabalho ao contexto actual.
A Ministra do Trabalho acredita que o teletrabalho “pode ser utilizado como game changer [ideia com um efeito significativo para a sociedade], se aproveitarmos as vantagens e retirarmos as desvantagens”. Numa corrida contra o tempo devido à iminente dissolução da Assembleia da República, a proposta vai a votos esta sexta-feira. Afinal, o que vai mudar?
A própria definição de teletrabalho vai sofrer algumas alterações. Actualmente, o Código do Trabalho define a prática como a prestação laboral com subordinação jurídica maioritariamente fora da empresa e através do recurso à tecnologia. A mudança que vai ser agora introduzida inclui o pagamento das despesas ou matérias de saúde e segurança no caso de trabalhadores à distância sem subordinação jurídica, mas em regime de dependência económica.
Funcionários podem recusar teletrabalho sem ter de justificar
A escolha vai também continuar dependente de um acordo escrito entre os trabalhadores e os empregadores. “A implementação do regime de teletrabalho depende sempre de acordo escrito, que pode constar do contrato de trabalho inicial ou ser autónomo em relação a ele”, define a proposta do PS, que esclarece que esse acordo “define o regime de permanência ou de alternância de períodos de trabalho a distância e de trabalho presencial”.
Estes acordos têm de identificar ambas as partes, definir o local onde o trabalho será realizado, o período e o horário normal de trabalho diário e semanal, a actividade em questão, a propriedade dos equipamentos e instrumentos de trabalho, as retribuições pagas ao trabalhador e a periodicidade dos contactos presencias. O documento pode também já prever um regime híbrido entre trabalho presencial e à distância.
A duração do acordo tanto pode ser determinada como indeterminada. Caso seja determinada, não pode exceder os seis meses e renova-se automaticamente por períodos iguais. Se as partes não quiserem renovar o acordo, devem comunicar com 15 dias de antecedência. Se for indeterminada, pode ser cessado com 60 dias de antecedência.
Os funcionários têm também a opção de recusar propostas de teletrabalho apresentadas pelos patrões sem terem de justificar a escolha. Esta recusa também não pode ser usada como motivo para despedimento ou de qualquer castigo.
Já caso seja o trabalhador a querer trabalhar à distância e a actividade em causa for compatível esse regime, o empregador tem de justificar por escrito a sua recusa. As empresas também podem definir no regulamento interno quais as condições e actividades em que o teletrabalho é uma opção.
Empregadores têm de aceitar teletrabalho de quem tem filhos até 8 anos
A lei actual já enumera as condições em que as empresas são obrigadas a aceitar o teletrabalho, caso o trabalho em questão seja compatível e haja condições de o acomodar. Caso os trabalhadores sejam vítimas de violência doméstica ou pais de crianças até três anos e obedeçam a estas condições, as empresas têm de aceitar obrigatoriamente a proposta para o trabalho à distância.
O alargamento deste direito a pais com filhos até aos oito anos já foi aprovado pelos deputados. O Bloco queria que fosse até 12 anos, mas cedeu aos socialistas dado o aperto no tempo com o fim anunciado desta legislatura.
A proposta do PS refere que esta opção está em cima da mesa quando “ambos os progenitores reúnem condições para o exercício da actividade em regime de teletrabalho, desde que este seja exercido por ambos em períodos sucessivos de igual duração num prazo de referência máxima de 12 meses”. A lei deixa de fora microempresas e só se aplica a empresas com pelo menos 10 funcionários.
A medida abrange também as situações de famílias monoparentais ou casos em que “apenas um dos progenitores, comprovadamente, reúne condições para o exercício da atividade em regime de teletrabalho”. Os trabalhadores que sejam cuidadores informais não principais também são abrangidos, num período máximo de quatro anos consecutivos ou interpolados. No entanto, nestas circunstâncias, os empregadores já podem recusar o pedido dos trabalhadores.
Empresas têm de pagar despesas com energia e internet
O diploma prevê também que sejam “integralmente compensadas pelo empregador todas as despesas adicionais que, comprovadamente, o trabalhador suporte […], incluindo os acréscimos de custos de energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação de serviço, assim como os de manutenção dos equipamentos e sistemas”.
Estas despesas adicionais referem-se a “bens e/ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes [de ter iniciado o teletrabalho], assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no mesmo mês do último ano anterior à aplicação desse acordo”. As empresas podem considerar estas despesas um custo para efeitos fiscais.
Relativamente ao subsídio de alimentação, o Bloco de Esquerda queria que este benefício também fosse incluído no regime de teletrabalho, mas o PS recusou. No entanto, este pagamento pode integrar na mesma as prestações complementares definidas no acordo do teletrabalho.
Os trabalhadores também têm de se deslocar ao local de trabalho a cada dois meses, visto ser um dever do empregador “diligenciar no sentido da redução do isolamento do trabalhador“. Os funcionários também são obrigados a comparecer presencialmente para reuniões ou formações que exijam a presença física caso tenham sido convocados com 24 horas de antecedência.
As empresas podem controlar o trabalho dos funcionários com equipamentos e sistemas, mas nunca sem o conhecimento do trabalhador. Está também proibida a conexão permanente durante o horário de trabalho através de câmaras ou microfones e os patrões só podem visitar o trabalhador mediante um aviso prévio 24 horas antes e com o consentimento do funcionário.
O direito ao descanso deve também ser salvaguardado. A lei criou uma norma que prevê que “o empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ressalvadas as situações de força maior”, sendo a violação da norma considerada uma contra-ordenação grave que implica uma multa que pode chegar quase aos 10 mil euros.
No entanto, o número 1 do mesmo artigo proposto pelo PS foi chumbado. O número 1 prevê que “o trabalhador tem o direito de, fora do seu horário de trabalho, desligar todos os sistemas de comunicação de serviço com o empregador, ou de não atender solicitações de contacto por parte deste, sem prejuízo da consideração de situações de força maior, não podendo daí resultar para o primeiro qualquer desvantagem ou sanção”.
” Actualmente, o Código do Trabalho define a práctica…” Práctica?!!
Quanto à notícia, parece-me que vai haver pouco teletrabalho. Uma vez mais este desgoverno, ao não perceber a questão, não foi capaz de encontrar a melhor solução. Matou-se a questão, isto é, o teletrabalho.
Caro leitor,
Obrigado pelo reparo, está corrigido.
Isso do teletrabalho é uma seca e muito mais cansativo que o trabalho presencial na empresa. Além disso é sempre bom o contacto e convívio directo com colegas de trabalho.
Sim, até porque é difícl jogar sueca sozinho.