A atividade inesperada em células bacterianas adormecidas dá uma ideia de como é possível sobreviver em condições extremas.
Quando as condições se tornam um pouco extremas, algumas bactérias são capazes de entrar num estado dormente, onde os seus processos de vida param.
Estas células “não mortas”, chamadas esporos, podem resistir a imensas tensões enquanto estão neste estado, incluindo calor extremo, pressão, mesmo as duras condições do espaço exterior, e podem permanecer assim durante milhares de anos.
Depois, quando as condições se tornam novamente favoráveis, os esporos que permaneceram adormecidos durante anos podem acordar e ressuscitar numa questão de minutos — como um zombie a sair da sepultura.
Os cientistas descobriram agora que estes esporos têm a extraordinária capacidade de avaliar o ambiente circundante, enquanto estão neste estado fisiologicamente morto, de acordo com um novo estudo, publicado a 6 de outubro na Science.
Os investigadores descobriram ainda que os esporos libertam gradualmente energia eletroquímica armazenada, o que lhes permite calcular qual o momento certo para retomar a atividade biológica normal — mesmo quando os sinais ambientais são vagos e não indicam claramente condições favoráveis, avança a Cosmos.
O vídeo retrata o potencial eletroquímico codificado por cores sobreposto à imagem de um único esporo. Revela que o esporo permanece adormecido enquanto exibe a capacidade de contar estímulos, como indicado pelos flashes multicoloridos de alterações do potencial eletroquímico.
“Este trabalho muda a forma como pensamos sobre os esporos, que eram considerados objetos inertes”, realça Gürol Süel, professor no Departamento de Biologia Molecular da Universidade da Califórnia em San Diego, nos EUA.
“Mostramos que as células num estado profundamente adormecido têm a capacidade de processar informação”, acrescenta o investigador.
“Descobrimos que os esporos podem libertar a sua energia eletroquímica armazenada, para realizar um cálculo sobre o seu ambiente, sem a necessidade de atividade metabólica”, relata ainda Süel.
Muitas espécies de bactérias formam esporos — células parcialmente desidratadas rodeadas por um revestimento protetor resiliente — sendo uma delas o Bacillus anthracis, a bactéria que causa o Antrax.
Utilizando um modelo matemático e experiências com esporos de Bacillus subtilis adormecidos, Süel e os restantes investigadores conseguiram determinar que as bactérias eram capazes de detetar e contar sinais ambientais de curta duração, demasiado fracos para desencadear um regresso à vida por si próprias.
As bactérias fazem-no libertando algum do seu potássio armazenado, em resposta a cada pequena entrada, até ser atingido um limiar crítico, transformando o esporo num estado ativo.
“A forma como os esporos processam a informação é semelhante à forma como os neurónios operam no nosso cérebro”, sublinha Süel. “Tanto nas bactérias como nos neurónios, pequenos e curtos inputs são adicionados ao longo do tempo, para determinar se um limiar é atingido.
“Ao atingir o limiar, os esporos iniciam o seu regresso à vida, enquanto os neurónios disparam um potencial de ação para comunicar com outros neurónios”, nota Süel.
Esta descoberta pode influenciar a procura de vida além da Terra. “Este trabalho sugere formas alternativas de lidar com a potencial ameaça representada pelos esporos patogénicos e tem implicações no que se pode esperar da vida extraterrestre”, relata Süel.
“Se os cientistas encontrarem vida em Marte ou Vénus, é provável que ela esteja num estado dormente, e sabemos agora que uma forma de vida que parece estar completamente inerte pode ainda ser capaz de pensar nos seus próximos passos”, conclui o investigador.