A pandemia de covid-19 tornou os termómetros omnipresentes: nas lojas, em aeroportos, em museus e nos mais variados serviços. Hoje, pode parecer óbvio que a febre está ligada a uma alta temperatura corporal, mas nem sempre foi assim.
Teresa Hollerbach, investigadora do Instituto Max Planck de História da Ciência, explica, num artigo assinado no The Conversation, que vários historiadores concordam que um membro do círculo veneziano de amigos de Galileu Galilei foi o primeiro a usar o termómetro na medicina.
Sanctorio Sanctorius (1561-1636) desenvolveu os primeiros termómetros para determinar o calor corporal dos seus pacientes.
Na altura, foi uma novidade. As pessoas estavam longe de imaginar que os números podiam estar relacionados com a saúde ou a doença e confiavam na experiência dos profissionais, que tocavam com a mão na testa para medir o tipo e a intensidade da febre.
Em vez de líquidos, o médico veneziano fez uso da expansão térmica do ar nos seus termómetros. Uma vez que o ar não se expande devido às mudanças na temperatura, mas também na pressão atmosférica, os termómetros de Sanctorius eram sensíveis a ambos.
Isto significa que qualquer medição da temperatura seria distorcida pela influência da pressão atmosférica. Nos termómetros que se seguiram, o ar foi substituído por um líquido lacrado num tubo de vidro.
Além disso, embora Sanctorius usasse o termo latino temperamentum, o seu conceito de “temperatura” era muito diferente do de hoje.
O médico aderiu à teoria humoral, que presumia que a saúde humana dependia de uma proporção equilibrada de quatro humores (i.e., fluidos corporais): sangue, catarro, bílis amarela e bílis negra.
Quando Sanctorius usou os seus termómetros de febre, o que o médico tentava medir eram certos graus de calor e frio na pele dos seus pacientes, que acreditava que revelariam as suas misturas individuais dos quatro humores.
Apesar de o diagnóstico e tratamento da febre serem uma preocupação central dos médicos da altura, os termómetros de Sanctorius não tinham uma aplicação considerável na prática médica diária, porque o aumento da temperatura não era considerado o principal fator determinante da febre.
Na prática, a “quantidade” de calor era considerada apenas um dos vários parâmetros que permitiam aos médicos diferenciar entre o calor corporal saudável e o calor febril. Na altura, a medição do calor corporal era de interesse secundário.
O termómetro só entrou no uso clínico geral no século XIX. Hoje, a febre é definida como temperatura corporal elevada e encarada como um sintoma de diversas doenças.