Manuscritos recém-descobertos de antigo escritor antissemita abrem batalha legal em França

Nicolas Bove / AFP

Os manuscritos de Louis-Ferdinand Céline.

Manuscritos de Louis-Ferdinand Céline.

Jean-Pierre Thibaudat, antigo escritor de cultura de um jornal francês, revelou um conjunto de manuscritos do tão aclamado quanto polémico escritor Louis-Ferdinand Céline.

A sua magnum opus é “Viagem ao Fim da Noite”, embora também seja conhecido pela obra “Morte a Crédito”. No entanto, o autor francês tem um lado negro: escreveu três panfletos que revelam uma identidade abertamente antissemita, facto que lhe terá valido a famosa acusação por parte de Jean-Paul Sartre de ter colaborado com os nazis.

Thibaudat levou os manuscritos a Emmanuel Pierrat, um advogado especializado em propriedade intelectual. “Esta é a maior descoberta literária de sempre”, disse Pierrat citado pelo The New York Times.

Os manuscritos estavam perdidos há mais de 75 anos, com Céline a alegar que tinham sido roubados do seu apartamento em Paris quando escapou para a Alemanha, em 1944, temendo que fosse castigado por ter colaborado com as forças nazis.

Céline voltou para França em 1951 após receber amnistia. O escritor culpou Oscar Rosembly, um vizinho que contratou para fazer a sua contabilidade, pelo desaparecimento dos papéis.

O acervo contém 6 mil páginas não publicadas que incluem uma versão completa de um romance que foi impresso, mas que estava inacabado, e outra obra totalmente desconhecida até hoje.

Thibaudat diz que recebeu os manuscritos de um benfeitor ou benfeitores anónimos há cerca de 15 anos. O escritor manteve-os em segredo este tempo todo — a pedido do tal benfeitor — até que a viúva de Céline morresse, para que uma “família antissemita” não lucrasse com o tesouro literário. A ideia é manter as obras sob domínio público e acessíveis a investigadores.

A controvérsia surgiu, entretanto, com os herdeiro de Céline a entrarem com uma ação judicial contra Thibaudat em fevereiro, acusando-o de manusear bens roubados e exigindo os manuscritos como legítimos proprietários dos bens do falecido escritor.

David Alliot, um investigador literário, diz que o problema para muitos franceses era que, embora Céline fosse um “génio literário”, era um ser humano com vários defeitos.

Émile Brami, livreiro judeu em Paris que dedicou a sua vida ao trabalho de Céline, diz que nos anos 90 encontrou a filha de Rosembly, Marie-Luce, que disse que ainda tinha “muitas coisas de Céline” na sua posse.

“As pessoas que me deram os manuscritos viram como uma forma de livrar-se deles”, disse Thibaudat numa entrevista telefónica. “Era um fardo para eles”.

O antigo escritor diz que não podia ter revelado os documentos sem cumprir a promessa que tinha feito ao benfeitor.

“Fui obrigado por este juramento. Eu não poderia trair as pessoas”, disse o gaulês. “Por isso estava à espera. Não achei que fosse demorar tanto”.

Daniel Costa, ZAP //

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