Manteiga vs margarina: afinal, qual é mais saudável?

A manteiga é um ingrediente básico da alimentação há séculos, muito antes de surgir a margarina, no início do século XX.

Em meados do século 20, as pessoas começaram a substituir a manteiga pela margarina, devido ao consenso cada vez maior de que todas as gorduras são más para a nossa saúde.

A indústria alimentícia reagiu, produzindo versões com baixo teor de gordura de muitos dos nossos produtos alimentícios. Paralelamente, as orientações alimentares orientavam as pessoas a reduzir a sua ingestão de gordura.

Pouco tempo depois, a atenção do público concentrou-se na gordura saturada, em vez de todos os tipos de gordura.

“A partir dos anos 1950, surgiu lentamente o conceito de que a gordura saturada seria o grande vilão e deveria ser substituída pela gordura póli-insaturada”, explica a professora de nutrição e saúde pública Nita Forouhi, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido.

Mas os ventos estão a mudar mais uma vez.

Na Austrália, o consumo de manteiga tem aumentando nos últimos anos em comparação com a margarina, explica a professora de Nutrição e Dietética Clare Collins, da Universidade de Newcastle, na Austrália.

“Existe muita confusão em torno da manteiga, incluindo os tipos de gordura”, explica ela. “Por isso, talvez as pessoas tenham voltado a comer mais do sabor de que elas gostam. Mas é útil que as pessoas entendam o que dizem as pesquisas.”

Decomposição das gorduras

As gorduras trans são uma forma de gordura insaturada. Mas as pesquisas demonstram que a alimentação com alto teor de gorduras trans está relacionada aos piores desdobramentos para a saúde.

Uma estimativa indica que as gorduras trans podem ser responsáveis por 540 mil mortes por ano. Mas, para a população em geral, a ideia de que passar a adotar alimentação de baixa gordura pode reduzir as doenças cardíacas tem sido questionada nas últimas décadas.

Pesquisas alargadas demonstraram recentemente os efeitos opostos da alimentação rica em certos alimentos com alto teor de gordura, como nozes e azeite extravirgem. Ambos são ricos em gorduras póli-insaturadas.

Não deveríamos preocupar-nos tanto com a gordura total, o importante é a proporção das gorduras”, afirma Forouhi.

Especificamente, dos três tipos de gordura que comemos – saturada, monoinsaturada e póli-insaturada – devemos ter consciência de quanta gordura saturada estamos a comer, diz Forouhi. A orientação geral é que a gordura saturada represente não mais de 10% da nossa energia total.

Mas esta é uma conta mais complicada do que parece.

“As pessoas estão a reconhecer cada vez mais que a gordura saturada não é apenas uma coisa homogénea”, explica Forouhi. “Ela é composta de cadeias de ácidos gordos individuais, com comprimentos definidos pelo número de átomos da cadeia, o que oferece a cada ácido gordo individual diferentes propriedades e diferentes impactos para a saúde.”

As pesquisas de Forouhi descobriram que ácidos gordos saturados com número ímpar de átomos de carbono (15 ou 17) são relacionados com riscos cardiometabólicos mais baixos, como o risco de desenvolver diabetes tipo 2 e doenças cardíacas.

Já os ácidos gordos saturados com números pares de átomos na cadeia (16 e 18) são associados a riscos cardiometabólicos mais altos. E Forouhi concluiu que os ácidos gordos com 15 e 17 átomos de carbono representam tipicamente os laticínios.

“Isso fez-nos pensar: talvez examinar os nutrientes isolados não seja a questão?”, conta Forouhi. “Podemos dizer que, se a gordura saturada vem do leite ou peixe, ela é diferente da gordura saturada da carne [por exemplo]?”

Forouhi prosseguiu até descobrir que a gordura saturada da carne e da manteiga está relacionada ao maior risco de doenças cardíacas, em comparação com a gordura do peixe ou produtos lácteos fermentados, como o iogurte.

“Os alimentos são muito mais do que a soma dos seus nutrientes”, explica ela. “Eles contêm macronutrientes, diversos micronutrientes diferentes, sais minerais, vitaminas, fibras, sal, aditivos e alguns são fermentados.”

Alimentos ultraprocessados

A manteiga é considerada um “ingrediente culinário processado”. Já a margarina é um alimento ultraprocessado, segundo o sistema mais usado de classificação de alimentos processados.

Diversos estudos relacionaram os alimentos ultraprocessados a más condições de saúde, como obesidade, diabetes tipo 2 e doenças cardíacas. Mas não há evidências de longo prazo que comparem especificamente os efeitos à saúde da manteiga e da margarina.

Isso ocorre, em parte, porque alguns estudos que observam os efeitos de diferentes alimentos sobre a nossa saúde consideram manteiga e margarina como um grupo, em conjunto com outros alimentos.

Um estudo concluiu, por exemplo, que as “pastas” são associadas ao aumento do risco de desenvolver diabetes tipo 2. Mas será necessário realizar pesquisas mais detalhadas, diz Melissa Lane, investigadora da Universidade Deakin, na Austrália.

Isso pode ser feito utilizando um método chamado “análise de substituição”, no qual a margarina é substituída por uma alternativa não ultraprocessada, com o mesmo número de calorias, explica Lane.

“A margarina tem o melhor perfil de nutrientes, por ter menos gordura saturada do que a manteiga, e ambas devem ser consideradas no contexto da alimentação em geral. Mas surgem evidências que indicam que há uma associação entre as más condições de saúde e a alimentação ultraprocessada, acima e para além dos nutrientes.”

Margarina x manteiga: a batalha final

Há menos evidências que demonstrem os efeitos da margarina sobre a nossa saúde porque, embora o perfil de nutrientes da manteiga varie pouco de um país para o outro, a margarina tem uma definição mais ampla.

A margarina também mudou ao longo do tempo, realça Nita Forouhi. E, quando os investigadores realizam estudos de longo prazo, analisam padrões alimentares das pessoas ao longo de décadas.

Mas, embora haja muito menos pesquisas sobre a margarina, Forouhi acrescenta que alimentos com menos gordura saturada, teor mais alto de gorduras póli-insaturadas e sem gorduras trans são a melhor opção.

São os nossos padrões alimentares de longo prazo que realmente importam, e o nosso consumo geral de gordura saturada ao longo de semanas e meses.

“A conclusão é que depende de quanta gordura comemos”, explica Clare Collins. “Se espalhamos manteiga de alto sabor sobre uma torrada uma vez por semana e o restante da nossa alimentação é saudável, isso provavelmente não importa.”

“Mas não é só isso o que a maioria das pessoas come. As pessoas têm dietas dominadas por alimentos ricos em energia e com baixo teor de nutrientes.”

“Precisa simplesmente de entrar em qualquer supermercado e olhar a quantidade de alimentos pré-embalados. Não estamos a cozinhar do zero, nem a comprar tantas frutas, legumes e verduras. Por isso, não percebemos que a nossa ingestão de energia é tão alta”, explica Collins.

A nossa escolha, seja ela qual for, deve assim ser baseada nas nossas próprias necessidades pessoais de saúde, diz Collins.

“Quase precisamos de ser detetives para definir o que é melhor para nós. Pense nas suas principais necessidades de saúde, alinhe os rótulos das pastas que normalmente escolhe e compare.”

Collins acrescenta que uma vantagem da margarina sobre a manteiga é que é mais fácil usar menos quantidade.

Por fim, a escolha de usar manteiga ou margarina é apenas uma peça do quebra-cabeça nutricional. Talvez o mais importante seja na realidade aquilo em que a aplicamos: “Se colocarmos manteiga numa espiga de milho e não num croissant, a nossa refeição será completamente diferente”, conclui Collins

ZAP // BBC

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