Da mitologia chinesa e malaio-indonésia ao pânico genital dos anos 60, o distúrbio delirante tomou conta da mente de muitos. Os culpados? Para uns, o espírito da raposa matreira que drena a vitalidade; para outros, a gripe suína.
Já alguma vez viu uma tartaruga a retrair a cabeça para dentro da carapaça? Pois é exatamente daí que vem a palavra malaio-indonésia “Koro“, que dá nome, em antigos registos chineses, a um distúrbio genital delirante.
Koro é caracterizado pelo profundo medo do encolhimento dos genitais para dentro do corpo — um temor que leva os pacientes a acreditar que tal retração conduzirá à sua morte.
As primeiras menções do distúrbio remontam à literatura da Dinastia Qing, cerca de 221-207 a.C. Aqui, o Koro é retratado como um acontecimento perturbador, que ocorre geralmente durante momentos íntimos, em que o paciente acredita que o seu pénis se retrai para o abdómen. Se não tratada com certos medicamentos “quentes”, acreditava-se que a condição seria fatal.
A antiga teoria do Yin e Yang também fornece alguma compreensão sobre o Koro, sugerindo que uma deficiência em Yang — a energia ativa, masculina — resulta na retração genital.
A mitologia chinesa intensificou ainda mais o medo em torno da condição. Contos do antigos mencionam, segundo o Ancient Origins, o espírito da raposa, uma entidade enganadora que drena a vitalidade e conduz à síndrome.
Na China, acreditava-se que o espírito da raposa era o responsável e que a pessoa poderia ser espancada numa tentativa de expulsar a entidade.
As mulheres não eram imunes e também temiam a retração mamária e da vulva, recorrendo a métodos para a impedir que frequentemente resultavam em lesões graves e, em alguns casos, morte.
As curas tradicionais estão profundamente enraizadas em práticas culturais e espirituais, que vão desde exorcismos taoistas ao uso de remédios medicinais chineses com partes de animais, como pénis de veado ou tigre.
Mas embora o Koro esteja profundamente enraizado nas tradições chinesas e malaio-indonésias, a sua presença não se limita a estas culturas.
Pânico genital nos anos 60
Segundo a revista Galileu, quando os holandeses chegaram à Indonésia, no séc. XIX, também se depararam com a condição delirante, mais frequentemente nas ilhas Celebes.
Em 1967, um artigo do The Sunday Times denota algo interessante. Em Singapura, centenas de homens diziam que os seus genitais estavam a encolher para dentro do abdómen. Segundo o Mothership, o hospital de Singapura estava a receber, na altura, 70 a 80 pacientes com a condição, que seria exclusivamente psiquiátrica.
Ao início, culpou-se a febre suína e os homens, desesperados, apareciam perante os doutores com mecanismos no pénis, com o objetivo de impedir a sua retração, desde “elásticos, cordas, grampos, paus e molas da roupa”, lê-se no artigo.
Rapidamente o pânico se desvaneceu. Durante uma conferência de imprensa televisiva de emergência, a Associação Médica de Singapura (AMS) assegurou ao público que as causas do Koro eram “medo e rumores” e pouco mais, dizendo efetivamente que a doença estava apenas na mente das pessoas e culpando apenas o “medo, disseminação de rumores, condições climáticas frias e desequilíbrio entre coração e rins”.
Assim que a AMS e o Ministério da Saúde fizeram anúncios, o número de pessoas que relataram ter Koro diminuiu drasticamente. Dentro de um mês, não foram relatados mais casos.
No final do século, a psiquiatria europeia começou a examinar o Koro, interpretando-o como uma representação da ansiedade de castração.
Em anos recentes, foram testemunhados surtos de Koro em locais diversos como o Nordeste da Índia, Sul da China e Nigéria. Tais ocorrências generalizadas refutam a ideia de que o Koro é um fenómeno limitado a culturas específicas, reposicionando-o como um assunto global fascinante que une tradição antiga e discurso contemporâneo.
A Classificação Internacional de Doenças (CID), mantida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), baseia-se na biologia humana universal e não na cultura; como tal, síndromes peculiares e culturalmente localizadas como Koro estão listadas num apêndice à parte da classificação principal.