O presidente da Comissão Europeia recordou na segunda-feira ao primeiro-ministro britânico que cabe ao Reino Unido apresentar “soluções legalmente operacionais” e compatíveis com o Acordo de Saída, reiterando a disponibilidade europeia para apreciar se estas são conciliáveis com o ‘backstop’.
“O presidente [Jean-Claude] Juncker lembrou que é da responsabilidade do Reino Unido apresentar soluções legalmente operacionais que sejam compatíveis com o Acordo de Saída”, lê-se num comunicado divulgado pelo executivo comunitário após a conclusão do almoço de trabalho entre os dois líderes no Luxemburgo, noticiou a agência Lusa.
“O presidente Juncker sublinhou a permanente disponibilidade e abertura da Comissão para examinar se essas propostas correspondem aos objetivos do ‘backstop'”, acrescentava a nota informativa.
O comunicado recordou que “tais propostas ainda não foram realizadas” e vincou que a Comissão Europeia está disponível a trabalhar “24 horas por dia” para desbloquear o impasse registado no processo de saída do Reino Unido da União Europeia (UE).
“O Conselho Europeu de outubro será um marco importante no processo. Os 27 mantêm-se unidos”, conclui o comunicado divulgado após aquele que foi o primeiro encontro entre Jean-Claude Juncker e Boris Johnson desde que o britânico assumiu a liderança do Governo daquele país, em julho.
Bruxelas tem-se mostrado aberta a debater qualquer proposta apresentada por Londres, desde que esta respeite as diretrizes negociadores da UE e seja “legal e viável”, incluindo eventuais novas soluções para o mecanismo de salvaguarda, comummente conhecido por ‘backstop’, desenhado para evitar o regresso de uma fronteira física na ilha da Irlanda.
Na quinta-feira, o negociador-chefe da UE, Michel Barnier, que também participou no almoço de trabalho de segunda-feira, já tinha reconhecido que, até ao momento, o Reino Unido não tinha apresentado qualquer nova proposta para desbloquear o impasse registado a pouco mais de um mês da data do ‘Brexit’, agendado para 31 de outubro.
Boris Johnson tem-se manifestado convicto de que é possível conseguir alterações ao Acordo de Saída firmado em novembro por Bruxelas e a sua antecessora, Theresa May, nomeadamente substituir o ‘backstop’, e obter um acordo até ao Conselho Europeu de 17 e 18 de outubro.
“Se forem registados progressos suficientes nos próximos dias, tenho a intenção de participar na cimeira decisiva de 17 de outubro e de finalizar um acordo que proteja os interesses das empresas e dos cidadãos dos dois lados da Mancha e os dois lados da fronteira irlandesa”, escreveu o primeiro-ministro britânico, numa coluna de opinião publicada no domingo no Daily Telegraph.
Se não conseguir um acordo até 19 de outubro, nem conseguir autorização do parlamento para uma saída sem acordo, terá de cumprir a lei promulgada na segunda-feira que obriga o governo a pedir um adiamento da saída por três meses, até 31 de janeiro.
Os restantes 27 Estados membros da UE têm depois de concordar unanimemente com uma extensão do processo.
Boris Johnson não pretende pedir novo adiamento
De acordo com a agência Lusa, o primeiro-ministro britânico afirmou, também na segunda-feira, que não pretende pedir um adiamento do ‘Brexit’ para depois de 31 de outubro, mas que está determinado em chegar a um acordo com Bruxelas.
Segundo Boris Johnson, a reunião com Jean-Claude Juncker foi “construtiva”, tendo reiterado que está empenhado em respeitar os acordos de paz para a Irlanda do Norte e num acordo de saída da UE, mas sem o ‘backstop’.
Esta solução de último recurso pretende evitar uma fronteira física do território britânico com a República da Irlanda, permitindo a livre circulação de produtos até entrar em vigor um acordo definitivo, mas implica que a Irlanda do Norte e Reino Unido fiquem sujeitos a certas regras do mercado único e união aduaneira.
Um comunicado emitido pelo Governo explica que o primeiro-ministro “voltou a confirmar a determinação em chegar a um acordo com sem o ‘backstop’ que os deputados britânicos possam apoiar”, aludindo ao facto de o Acordo de Saída negociado pela antecessora, Theresa May, com Bruxelas ter sido chumbado três vezes pelo parlamento britânico.
“O primeiro-ministro também reiterou que não vai pedir uma extensão e que pretende retirar o Reino Unido da UE no dia 31 de outubro”, referiu o comunicado.
As duas partes concordaram em intensificar as reuniões, passando a realizar-se diariamente, e que negociações a nível político devem também decorrer entre o ministro britânico para o ‘Brexit’, Steve Barclay, e Michel Barnier.
Vaiado, falta a conferência de imprensa conjunta
Depois de ser vaiado no Luxemburgo por manifestantes contra o ‘Brexit’, Boris Johnson cancelou na segunda-feira uma conferência de imprensa conjunta com o seu homólogo luxemburguês, Xavier Bettel, à porta da sede do Governo, divulgou o Expresso.
Contudo, o chefe do executivo luxemburguês fez questão de manter a agenda para anunciar o que discutira com Boris Johnson no encontro, voltando a manifestar-se contra um novo adiamento da saída do Reino Unido da UE.
À hora marcada, Xavier Bettel explicou aos jornalistas que a reunião acabou por demorar mais do que o previsto: “Ouvi muito, mas li pouco. E preciso de avaliar as propostas por escrito, embora não esteja aqui para negociar pela UE. Essa função cabe a Michel Barnier”, atirou o governante.
Apontou para o lugar vazio do primeiro-ministro britânico, em jeito de brincadeira, mas foi taxativo ao afirmar que o processo de saída do Reino Unido da UE é um “pesadelo” e que o adiamento do ‘Brexit’ só iria agravar a situação.
“O relógio está a contar, o tempo está a passar. Na UE não será aceite nenhum acordo contra o mercado único ou contra o Acordo de Sexta-Feira Santa. Os irlandeses são parte da família da UE “, declarou o chefe do Governo do Luxemburgo.
Segundo Xavier Bettel, a “relação de amizade” do Luxemburgo com o Reino Unido não irá mudar por causa do ‘Brexit’, no entanto, os cidadãos do país também precisam de “esclarecimentos” e “certezas” no âmbito do processo do ‘Brexit’. O PM luxemburguês disse ainda que a prioridade do país é proteger o mercado único, à semelhança dos restantes Estados-membros.
Acusou os defensores da campanha pró-‘Brexit’ de terem anunciado “mentiras”, afirmando que o Reino Unido não pode responsabilizar a UE neste processo, “uma vez que os britânicos não sabem como sair de uma situação que eles próprios criaram”.