Descoberta rara: como os egípcios embalsamavam as múmias para uma vida eterna

Óleos vegetais e alcatrões, resinas e gorduras animais… E alguns ingredientes percorriam milhares de quilómetros. Vasos têm rótulos.

Já se sabe que muitas múmias do Egipto chegaram até aos dias de hoje praticamente intactas ou, pelo menos, muito bem preservadas.

Há muito que se vê que têm uma “vida eterna” – mas falta saber ao certo como é que o processo de embalsamento decorria. Sobretudo sobre o tipo de ingredientes utilizados.

Normalmente, o conhecimento dos especialistas sobre o assunto surge com base em textos antigos, escritos em papiros por historiadores gregos, ou por análises do conteúdo orgânico das múmias.

Mas agora surge uma descoberta rara: um grupo de cientistas descobriu uma antiga oficina de embalsamento no Egipto. Está a cerca de 30 quilómetros da capital Cairo e terá tido movimento cinco ou seis séculos antes de Cristo.

O estudo foi publicado na revista Nature, sobre as análises biomoleculares que permitem novas e mais detalhadas perspectivas sobre o embalsamamento no antigo Egipto. Uma “nova luz” sobre o assunto, como escrevem os autores da análise.

Foram analisados 31 vasos de cerâmica recuperados da oficina de embalsamamento.

E o grande avanço é que dezenas desses vasos usados no processo de embalsamamento têm rótulos, indicam que ingredientes tinham. Terá sido a primeira vez que arqueólogos descobriram frascos rotulados, neste contexto.

Assim foram identificadas misturas específicas de óleos perfumados ou anti-sépticos, alcatrões e resinas que foram utilizadas para embalsamar a cabeça e tratar os invólucros.

Os famosos ingredientes mirra ou incenso (têm sido traduzidos assim, a partir de documentos antigos) são afinal óleos de coníferas com gordura animal, mistura à base de alcatrões e um unguento com aditivos vegetais, como óleo de cipreste ou elemi e ainda resina da dâmara. Tudo isto há 2.500 anos, recorde-se.

Durante o embalsamento havia também rituais e a recitação de textos litúrgicos, já depois do tratamento químico do corpo.

Todo o procedimento de preservação poderia demorar 70 dias.

Como já mencionámos, tem-se descoberto que a mumificação não tinha propriamente como objectivo preservar os corpos – a prioridade era colocá-los noutro patamar, encaminhá-los para o divino.

O corpo quimicamente tratado seria revivido e iria adquirir uma nova identidade como um falecido ou glorificado, digno de viver noutro mundo.

Para analisar as amostras, os vasos de cerâmica foram borrifados com solventes e foram extraídos os ingredientes de embalsamento. Depois, foram analisados através de espectrometria de massa por cromatografia em fase gasosa.

Esta descoberta também revela um passado económico: é que alguns ingredientes, algumas substâncias utilizadas na mumificação, percorriam centenas ou mesmo milhares de quilómetros.

Havia negócio internacional à volta destes produtos – que vinham da zona do Mediterrâneo, de florestas tropicais, mas também do sudeste da Ásia, por exemplo. Para termos uma noção, Egipto e Indonésia, por exemplo, estão separados por quase 10 mil quilómetros.

Podemos arriscar ao classificar este negócio dos ingredientes para as múmias como o início da globalização.

O estudo reuniu arqueólogos, especialistas em línguas antigas e químicos.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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