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Foram para uma ilha curar o cancro e agora estão a morrer. “Sinto-me enganada”

O filtro de sangue Seraph100 da ExThera

Startup norte-americana, com um bilionário por trás, dizia que o seu filtro aprovado para casos de COVID-19 era melhor que qualquer outro tratamento disponível no mundo. Reportagem do The New York Times levanta suspeitas.

Uma startup norte-americana está a ser escrutinada após o seu tratamento experimental contra o cancro, que teve lugar na ilha de Antígua, no Mar do Caribe, ter alegadamente provocado a morte de vários doentes.

A ExThera, conhecida pelo seu dispositivo de filtragem de sangue anteriormente aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para casos de emergência de COVID-19, aventurou-se mais recentemente na terapia do cancro: dizia que o dispositivo poderia também curar o cancro filtrando as células tumorais circulantes (CTC) responsáveis pelas metástases. Mas agora enfrenta acusações graves de negligência médica, segundo reportagem do The New York Times.

Em Antígua, o bilionário Alan Quasha abriu uma clínica através da sua empresa, Quadrant Management, e assim passou a atuar fora da jurisdição das autoridades reguladoras dos EUA. Prometia a pacientes com cancro em fase terminal uma cura, a troco de 45 mil dólares (cerca de 42.800 euros) por tratamento. Mas as suas práticas estão agora a ser postas em causa.

Relatórios divulgados pelo NYT indicam que, das duas dúzias de pacientes tratados, pelo menos seis morreram em circunstâncias preocupantes.

Testemunhas descrevem condições terríveis na clínica, com anestesia inadequada e falta de oncologistas, por exemplo, com os pacientes a serem alegadamente instruídos a renunciar à quimioterapia.

E mesmo as alegações de que o dispositivo combate o cancro são suspeitas: resultam de um pequeno estudo croata que não foi conduzido por um oncologista e que envolveu apenas 12 pacientes.

Apesar de carecer de validação médica, Quasha investiu milhões na ExThera e estabeleceu a clínica de Antígua sob a subsidiária Quadrant Clinical Care.

Depois de testemunhar as péssimas condições da clínica o ex-diretor de assuntos médicos da startup demitiu-se. Na ilha, viu “doentes a sangrar devido a feridas provocadas por cateteres e a gritar de dor“, dizem fontes ao NYT. Mas a startup nada terá feito.

Joey John, médico responsável pela clínica, terá levado a cabo procedimentos sem orientação por imagem ou anestesia suficiente.

Os familiares dos pacientes falecidos relataram ao jornal nova-iorquino as suas experiências.

“Sinto-me tão enganada por todas estas pessoas”, disse Kim Hudlow, enfermeira cujo marido, David, foi submetido ao tratamento. “A forma como isto foi contado e como foi explicado… eles apanharam-me”, confessa.

Os funcionários da ExThera terão mentido ao casal, tendo um deles dito à enfermeira que as dores do seu marido eram um sinal de “forte ativação imunitária”. David morreu pouco tempo depois, após o seu cancro se ter espalhado de forma agressiva.

Outra paciente, Ashley Sullivan, questionou o facto de os seus tumores terem piorado após o tratamento. A responsável pela regulamentação da ExThera, Sanja Ilic, ignorou as preocupações da doente, afirmando que as suas CTC tinham chegado a zero.

“Não conheço nenhum outro tratamento disponível no mundo, neste planeta, que possa fazer coisas melhores”, disse Ilic, sem qualquer validação de qualquer estudo ou artigo. Sullivan viria a falecer três meses depois, de acordo com o jornal.

Tomás Guimarães, ZAP //

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