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Exposição ao chumbo pode ter alterado traços de personalidade de uma geração

Gene Daniels / EPA National Archives

Investigação detetou impactos do chumbo em traços como a agradabilidade, o neuroticismo ou a consciência. Apesar de a gasolina com chumbo ter desaparecido, a substância também está presente em inúmeros tubos de água que permanecem em contexto urbano à espera de serem substituídos.

As consequências a longo prazo da exposição ao chumbo são há muito conhecidas pela comunidade científica. Agora, um novo estudo vem confirmar que crianças expostas a esta substância registam uma redução da inteligência e perturbações da saúde mental na idade adulta, sendo, por isso, possível adaptar as conclusões a gerações inteiras de indivíduos que viveram nas proximidades de fábricas entre as décadas de 60 e 90.

Numa investigação tornada pública recentemente, Ted Schwabe, investigador da Universidade do Texas, estudou a possibilidade de a exposição ao chumbo influenciar a personalidade dos adultos.

O estudo teve por base os cinco traços de personalidade identificados pela psicologia (neuroticismo, extroversão, agradabilidade, abertura à experiência e conscienciosidade) e recorrendo a medições do nível de chumbo nos bairros onde 1,5 milhões de cidadãos americanos e europeus — que paralelamente preencheram inquéritos de personalidade online — passaram a sua infância.

“Há muito tempo que sabemos que a exposição ao chumbo é prejudicial, mas cada nova investigação parece identificar novas formas através das quais a exposição ao chumbo parece prejudicar a sociedade”, disse o investigador.

Nas conclusões da pesquisa pode ler-se que personalidades menos saudáveis entre os adultos americanos foram detetadas entre aqueles que cresceram em condados com elevados níveis de chumbo.

No entanto, esta constatação, tal como aponta o site Ifl Science, poderá facilmente ser atribuída a outros fatores, tais como as desigualdades sociais latentes entre o espaço urbano e rural.

Ainda assim, defendem os especialistas, o facto de o Clean Air Act — que propunha a eliminação da gasolina de chumbo — não ter entrado em vigor em todo o território norte-americano pode ajudar a explicar o seu ponto.

Também a investigação publicada no site PNAS indica que as pessoas nascidas após as concentrações de chumbo terem sido proibidas beneficiaram mais com a medida do que as que residiam em territórios onde a legislação só foi implementada progressivamente.

No que concerne ao continente europeu, a eliminação gradual da gasolina com chumbo e o respetivo impacto também estão em linha com os pontos defendidos por Schwabe e a sua equipa. Nos dois territórios, a exposição ao chumbo refletiu-se num maior neuroticismo e menor agradabilidade.

No entanto, uma associação oposta foi feita sobre a consciência, deixando no ar dúvidas sobre se os efeitos enunciados sobre esta característica seriam reais ou não.

Segundo Schwaba, “os indivíduos levam as suas personalidades para todo o lado“. “Mesmo um pequeno efeito negativo, quando agregado em milhões de pessoas e em todas as decisões e comportamentos diários que a nossa personalidade influencia, pode ter efeitos realmente impactantes no bem-estar e na produtividade.”

Para além das consequências enumeradas anteriormente, Schwaba e os restantes coautores do estudo também concluíram que os efeitos negativos menores e que se podem enquadrar nos traços de personalidade só foram explorados numa investigação anterior de pequena dimensão.

“Estes três traços constituem uma grande parte do que consideramos uma personalidade madura e psicologicamente saudável, pelo que são fortes indicadores do nosso sucesso ou fracasso nas relações humanas e no trabalho“, acrescentou o investigador. Normalmente, estes traços têm tendência a melhorar ao longo da vida, contudo, nas pessoas mais expostas ao chumbo “a maturidade poderá chegar mais tarde”.

Apesar de a gasolina com chumbo ter desaparecido, a presente pesquisa também aponta que muitos tubos de água revestidos com esta substância permanecem nas cidades à espera de ser substituídos, pelo que muito do solo superficial permanece contaminado.

Neste sentido, Ted Schwaba e a sua equipa sugerem que em território americano as crianças negras têm o dobro da probabilidade de serem expostas ao chumbo.

Numa previsão, o estudo avança, citando estimativas passadas, que a redução da população exposta ao chumbo poderia valer 1,2 biliões de dólares aos Estados Unidos, um número que pode estar a ser subestimado.

ARM, ZAP //

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