EUA e Rússia continuam em desacordo após reunião em Genebra. O “reverter a era pós Guerra Fria”

Denis Balibouse / EPA

Wendy Sherman (E) e o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Ryabkov.

Wendy Sherman (E) e o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Ryabkov.

Chefe da delegação russa diz que o momento “é perigoso” e a sua homóloga norte americana diz que os EUA ainda não perceberam a intenção da Rússia.

Segundo o Público, o primeiro encontro da semana de conversações entre responsáveis russos com a Ucrânia como motivo principal terminou esta segunda feira, com a exposição de divisões entre os Estados Unidos e a Rússia.

Com mais de cem mil soldados russos estacionados perto da fronteira com a Ucrânia, de acordo com os serviços secretos norte-americanos, Moscovo continua a garantir que não quer levar a cabo uma invasão do vizinho.

Wendy Sherman, secretária de Estado adjunta que liderou a delegação americana nas conversações, afirmou depois da reunião com Sergei Riabkov, que a Rússia pode provar que quer uma desescalada, ao fazer regressar os militares aos quartéis.

Os Estados Unidos, segundo a secretária de Estado adjunta, ainda não sabem se a intenção da Rússia é um alívio da tensão.

Este foi o primeiro de três encontros esta semana, seguindo-se, na quarta-feira, uma reunião do conselho NATO-Rússia e, na quinta-feira, um encontro da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa OSCE (OSCE) sobre a Ucrânia.

O chefe da delegação russa, Serguei Riabkov, afirmou, pelo seu lado, que não considera a situação impossível, mas diz que o momento “é perigoso” e que não é possível adiar mais a resolução da questão fundamental. Para a Rússia, é “obrigatório” assegurar que a Ucrânia nunca será membro da NATO.

Esta é uma de várias exigências que a Rússia fez em dezembro, sendo outra a NATO reverter o alargamento na Europa central e de Leste e o fim de exercícios militares perto das suas fronteiras.

Sherman declarou que não será dado a ninguém o poder de “fechar a porta aberta, que é a política da NATO, e que foi sempre fundamental para a aliança da NATO”.

Há vários analistas e diplomatas a expressar a opinião de que a Rússia está a fazer exigências que sabe que os Estados Unidos nunca vão concordar, para os apresentar como irredutíveis.

“Vejam as exigências de Moscovo nos encontros”, disse, antes da reunião, Melinda Haring, vice diretora do programa Eurasia do Atlantic Council, em declarações ao diário britânico The Guardian.

“Se a Rússia insistir que a NATO nunca mais se pode expandir, vamos saber que Moscovo se está a preparar para a guerra na Ucrânia, porque esta é uma linha vermelha para o Ocidente”, sublinhou a dirigente.

A Rússia tem uma escolha clara, e só o Presidente, Vladimir Putin, pode decidir, disse Sherman. A Rússia e os Estados Unidos têm posições opostas sobre o que deve ser feito, afirma Riabkov. “Precisamos de um avanço”, realça.

A realização destas reuniões está a ser vista com preocupação por alguns especialistas. Françoise Thom, historiadora na Sorbonne, acredita que muitos países não estão a perceber o que está em causa.

“Lendo a imprensa ocidental, fica-se com a impressão de que não está a acontecer nada. Os ocidentais não parecem perceber o que está em causa. Pensam que só se está a decidir o destino da Ucrânia”, escreveu na Desk Russie.

Mas não é bem assim. A “chantagem orquestrada da Rússia” pretende que “a NATO cometa hara-kiri e que os Estados Unidos sejam relegados ao papel de uma potência regional”, resume a historiadora.

Judy Dempsey, do centro de estudos Carnegie Europe, também afirma que o primeiro objetivo da Rússia é testar os Estados Unidos, a NATO e a Europa, para “reverter a era pós-Guerra Fria voltando à influência militar e política que antes de 1989 tinha na Ucrânia, Geórgia, e outros países da região”.

Dempsey questiona os Estado Unidos por não terem insistido que a UE participasse nas negociações com a Rússia, mostrando uma frente unida. Thom critica abertamente a decisão de abrir estas conversações.

“Não há nada mais perigoso que estas trocas em cimeiras”, escreveu Thom, porque estas “alimentam inevitavelmente as narrativas da elite russa”.

“Se o Ocidente for firme, o Kremlin conclui que quer destruir a Rússia. Se oferecer concessões, o Kremlin conclui que é fraco e que deve aumentar a pressão”, resume.

Na sua opinião, “muito frequentemente a melhor política com a Rússia é a do silêncio e distanciamento”. “Agarrarmo-nos ao diálogo a todo custo, especialmente quando Moscovo tem uma arma apontada à nossa cabeça, só mostra fraqueza e encoraja uma escalada.”

Enquanto isso, o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, que vai na quarta-feira a uma delegação russa em Bruxelas, disse que era possível encontrar uma via para evitar um conflito.

“O que esperamos é que seja possível acordar um modo de avançar, que possamos chegar a acordo para uma série de reuniões, que possamos concordar com um processo”, declarou, citado pela Reuters.

Ao seu lado, a vice-primeira-ministra da Ucrânia, Olga Stefanishina, disse que não era aceitável que a Rússia impusesse quaisquer condições enquanto tem tanques posicionados perto da fronteira com a Ucrânia.

A Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia em 2014 e invadiu o Leste da Ucrânia. As sanções então impostas pela União Europeia foram fáceis de ignorar, escreveu Judy Dempsey.

Dempsey defende ainda que as sanções com que os Estados Unidos e a União Europeia estão a ameaçar a Rússia em caso de invasão da Ucrânia têm de afetar o sector energético, incluindo o Nord Stream 2, que poderá duplicar o gás levado diretamente da Rússia para a Alemanha.

ZAP //

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.