Este “Neptuno quente” está inchado. O Webb descobriu porquê

NASA, ESA, CSA, R. Crawford (STScI)

Possível aspeto do exoplaneta WASP-107 b.

Exoplaneta tem um milésimo da quantidade esperada de metano, o que faz com que o seu núcleo seja muito mais quente. A sua órbita ligeiramente elíptica provoca o aquecimento de maré.

Dados recolhidos com o Telescópio Espacial James Webb da NASA/ESA/CSA, combinados com observações anteriores do Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA, mostram surpreendentemente pouco metano (CH4) na atmosfera de WASP-107 b, indicando que o interior do planeta deve ser significativamente mais quente e o núcleo muito mais massivo do que se estimava anteriormente.

Porque é que o exoplaneta gigante gasoso e quente é tão inchado? Duas equipas independentes de investigadores têm uma resposta.

Pensa-se que a temperatura inesperadamente elevada é o resultado do aquecimento de maré causado pela órbita ligeiramente não circular do planeta e pode explicar como é que WASP-107 b pode ser tão inchado sem recorrer a teorias extremas sobre a sua formação.

Os resultados, que foram possíveis graças à extraordinária capacidade do Webb para medir a luz que passa através das atmosferas dos exoplanetas, podem explicar o inchaço de dúzias de exoplanetas de baixa densidade, ajudando a resolver um mistério de longa data na ciência exoplanetária.

O problema do WASP-107 b

Com mais de três-quartos do volume de Júpiter, mas menos de um décimo da sua massa, WASP-107 b, considerado um “Neptuno quente“, é um dos exoplanetas menos densos conhecidos. Embora os planetas inchados não sejam invulgares, a maior parte deles são mais quentes e mais massivos e, por isso, mais fáceis de explicar.

“Com base no seu raio, massa e idade, pensávamos que WASP-107 b tinha um núcleo rochoso muito pequeno, rodeado por uma enorme massa de hidrogénio e hélio”, explicou Luis Welbanks da Universidade do Estado do Arizona, autor principal de um artigo científico publicado na Nature.

“Mas era difícil compreender como é que um núcleo tão pequeno podia acumular tanto gás e depois não crescer até se tornar um planeta da massa de Júpiter”.

Se WASP-107 b tem mais massa no núcleo, a atmosfera deve ter-se contraído à medida que o planeta arrefeceu desde a sua formação. Sem uma fonte de calor para reexpandir o gás, o planeta deveria ser muito mais pequeno. Embora WASP-107 b tenha uma distância orbital de apenas oito milhões de quilómetros (um-sétimo da distância entre Mercúrio e o Sol), não recebe energia suficiente da sua estrela para estar tão inchado.

“WASP-107 b é um alvo muito interessante para o Webb porque é significativamente mais frio e mais parecido com Neptuno em massa do que muitos dos outros planetas de baixa densidade, os Júpiteres quentes, que temos estudado”, disse David Sing da Universidade Johns Hopkins, autor principal de um outro estudo paralelo também publicado ao mesmo tempo na revista Nature.

“Como resultado, devemos ser capazes de detetar metano e outras moléculas que nos podem dar informação sobre a sua química e dinâmica interna que não conseguimos obter de um planeta mais quente.”

Um tesouro de moléculas anteriormente indetetáveis

O raio gigante de WASP-107 b, a sua atmosfera alargada e a sua órbita tornam-no ideal para a espetroscopia de transmissão, um método utilizado para identificar os vários gases na atmosfera de um exoplaneta com base na forma como afetam a luz estelar.

Combinando observações do instrumento NIRCam (Near-Infrared Camera) e do MIRI (Mid-Infrared Instrument) do Webb e do WFC3 (Wide Field Camera 3) do Hubble, a equipa de Welbanks conseguiu construir um amplo espetro de 0,8 a 12,2 micrómetros da luz absorvida pela atmosfera de WASP-107 b. Usando o espetrógrafo NIRSpec (Near-Infrared Spectrograph) do Webb, a equipa de Sing construiu um espetro independente que cobre 2,7 a 5,2 micrómetros.

A precisão notável dos dados permite não só detetar, mas também medir as abundâncias de uma grande quantidade de moléculas, incluindo vapor de água (H2O), metano (CH4), dióxido de carbono (CO2), monóxido de carbono (CO), dióxido de enxofre (SO2) e amoníaco (NH3).

“Com a espetroscopia NIRSpec do Webb obtemos uma visão direta da química de WASP-107 b”, disse Stephan Birkmann da ESA e investigador principal das observações NIRSpec do estudo. “A espetroscopia NIRSpec permite-nos sondar a composição atmosférica do planeta e complementa perfeitamente as observações MIRI e NIRCam.”

Gás em ebulição, interior quente, núcleo massivo

Ambos os espetros mostram uma surpreendente ausência de metano na atmosfera de WASP-107 b: um milésimo da quantidade esperada com base na sua temperatura presumida.

“Isto é uma evidência de que o gás quente das profundezas do planeta deve estar a misturar-se vigorosamente com as camadas mais frias a montante”, explicou Sing. “O metano é instável a altas temperaturas. O facto de termos detetado tão pouco, apesar de termos detetado outras moléculas com carbono, diz-nos que o interior do planeta deve ser significativamente mais quente do que pensávamos.”

Uma fonte provável da extra energia interna de WASP-107 b é o aquecimento de maré causado pela sua órbita ligeiramente elíptica. Com a distância entre a estrela e o planeta a mudar continuamente ao longo da órbita de 5,7 dias, a atração gravitacional também muda, esticando o planeta e aquecendo-o.

Os investigadores já tinham proposto que o aquecimento provocado pelas marés poderia ser a causa do inchaço de WASP-107 b, mas até aos resultados do Webb, não havia evidências.

Uma vez estabelecido que o planeta tem calor interno suficiente para agitar completamente a atmosfera, as equipas aperceberam-se que os espetros poderiam também fornecer uma nova forma de estimar o tamanho do núcleo.

“Se soubermos quanta energia existe no planeta e que proporção do planeta é constituída por elementos mais pesados, como o carbono, o azoto, o oxigénio e o enxofre, e quanto é constituída por hidrogénio e hélio, podemos calcular quanta massa deve existir no núcleo”, explicou Daniel Thorngren da Universidade Johns Hopkins.

Ao que parece, o núcleo tem pelo menos o dobro da massa inicialmente estimada, o que faz mais sentido em termos da formação planetária.

Em suma, WASP-107 b não é tão misterioso como parecia.

“Os dados do Webb dizem-nos que planetas como WASP-107 b não tiveram de se formar de uma forma estranha, com um núcleo superpequeno e um enorme invólucro gasoso”, explicou Mike Line da Universidade do Estado do Arizona. “Em vez disso, podemos pegar em algo mais parecido com Neptuno, com muita rocha e não tanto gás, aumentar a temperatura e fazer com que tenha o aspeto que tem”.

// CCVAlg

Siga o ZAP no Whatsapp

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.