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“Passo arrojado”. Doentes com cancro podem vir a fazer quimioterapia em casa

Profissionais de saúde defendem que os doentes com cancro devem ter a possibilidade de fazer tratamentos em casa, nomeadamente quimioterapia, para terem que ir menos vezes ao hospital. A medida seria um “passo arrojado” que faria “a diferença na vida das pessoas”.

O coordenador do Programa Nacional de Implementação das Unidades de Hospitalização Domiciliária nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), Delfim Rodrigues, defende que os doentes com cancro devem ter a oportunidade de fazer quimioterapia em casa, entre outros tratamentos.

“Devemos começar a pensar como podemos garantir a qualidade e a segurança do tratamento em casa, evitando a deslocação do doente ao hospital“, aponta Delfim Rodrigues em declarações divulgadas pelo Jornal de Notícias (JN).

Dando o exemplo de países como a Holanda e a Dinamarca, que “fazem tratamentos oncológicos em centros comunitários e casa a casa”, este responsável diz que, em Portugal, “há um próximo passo arrojado a dar que é a quimioterapia em casa”.

Delfim Rodrigues sublinha a importância de “apostar em áreas que fazem a diferença na vida das pessoas” no âmbito da hospitalização domiciliária.

Um estudo agora publicado pelo Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISP-UP) concluiu que os doentes oncológicos gostariam de reduzir o número de deslocações aos serviços de saúde, nomeadamente através da criação de condições para realizarem o maior número possível de tratamentos e consultas no mesmo dia e da domiciliação de alguns cuidados de saúde.

Atualmente, já há 36 hospitais públicos que internam doentes em casa, só faltando incluir Braga e Beja, como avança o JN. Contudo, Delfim Rodrigues realça a importância de expandir este modelo, nomeadamente para abarcar os doentes oncológicos e tratamentos como a quimioterapia em espaço domiciliário.

Pandemia reduziu rastreios oncológicos

No estudo do ISP-UP fica também salientado que a pandemia causou uma redução dos rastreios oncológicos, além de falta de acesso aos cuidados de saúde primários, com o consequente impacto no diagnóstico e referenciação pelos médicos de família.

Este estudo sobre o impacto da pandemia em doentes com cancro recomenda um plano de recuperação estruturado que envolva diferentes parceiros na saúde e protocolos com os privados para recuperar rastreios, tratamentos e cirurgias.

O trabalho envolveu uma avaliação quantitativa com base em dados da atividade assistencial no SNS e um estudo qualitativo com entrevistas a administradores hospitalares, profissionais de saúde e representantes de doentes.

As recomendações apresentadas “resultam de sugestões dos próprios clínicos e outros atores no terreno”, nota à Lusa João Rufo, um dos responsáveis pela gestão deste projeto.

Nas entrevistas participaram administradores da área da saúde, representantes de associações de doentes com cancro e profissionais de saúde, incluindo médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, técnicos de diagnóstico e terapêutica das regiões norte, centro e sul de Portugal continental.

A reativação de todos os rastreios oncológicos de base populacional e o reforço dos rastreios de proximidade, para aumentar o número de pessoas envolvidas anualmente, assim como a contratação de mais recursos para o SNS, para aumentar a capacidade de resposta, são algumas das recomendações avançadas.

Sobre o impacto da pandemia na prestação de cuidados a doentes oncológicos, o estudo “Disrupção em Oncologia por Força da COVID-19”, que se centra no período entre Março de 2020 e Dezembro de 2021, aponta também uma diminuição na realização de primeiras consultas e de cirurgias, uma situação que acabou por levar ao atraso nos novos tratamentos de quimioterapia e radioterapia.

Consultas à distância e capacidade de adaptação são destaques positivos

Quanto ao plano terapêutico dos doentes, tanto as revisões dos estudos publicados como as respostas dos entrevistados neste trabalho, relataram mudanças nos tratamentos em comparação ao período pré-covid-19, incluindo a alteração de tratamentos intravenosos para tratamentos orais, o adiamento/atrasos nos tratamentos e cirurgias em algumas unidades de saúde.

Um dos pontos destacados pelos investigadores foi a capacidade de adaptação dos serviços de saúde, que se traduziu em “alterações de infraestruturas, readaptação de equipamentos e criação constante de novos protocolos de atuação”.

Apontam igualmente aspetos positivos como a dinamização das consultas à distância, um procedimento que consideram que se deve manter nos casos em que a deslocação não seja estritamente necessária.

Contudo, embora os inquiridos defendam que as tecnologias de comunicação devem ser mantidas, o estudo salienta as desigualdades socio-económicas no acesso à telemedicina – nem todos os doentes tinham equipamentos, literacia e competências para beneficiarem adequadamente deste recurso.

ZAP // Lusa

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