Inútil ou fundamental? O dia de reflexão que se assinala hoje, em Portugal, na véspera das eleições legislativas antecipadas, é visto como cada vez mais desnecessário por muitos eleitores. E há países europeus onde nem sequer existe.
Em Portugal, a legislação não determina um dia de reflexão antes de eleições. Apenas faz referência à data de início e de fim da campanha eleitoral, apontando que esta deve terminar até às 24 horas da antevéspera do dia das eleições.
Os partidos ficam, assim, impedidos de fazer campanha, incluindo com a publicação de novos conteúdos nas redes sociais e nas suas páginas online.
Além disso, os órgãos de comunicação social não podem publicar notícias sobre a campanha ou as propostas partidárias, nem fazer debates ou ter espaços de comentário em torno do assunto.
A violação destas regras é punida com penas de prisão até seis meses e multas que vão dos 2,49 aos 24,94 euros. São valores irrisórios que existem há 45 anos, ou seja, desde a criação da regra em 1976.
“Mal não faz que exista”
Com a existência do voto antecipado e das redes sociais, onde a campanha está sempre presente, há cada vez mais quem considere o dia de reflexão inútil.
Mas a Comissão Nacional de Eleições (CNE) entende que a regra continua a fazer sentido por “haver poucas queixas sobre a matéria”, um indício de que é seguido de forma “generalizada”, conforme uma posição defendida num relatório da Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar da Assembleia da República, e segundo cita o Público.
Apesar disso, a CNE reconhece o “crescendo do incumprimento com a progressiva utilização das redes sociais”.
A Ordem dos Advogados (OA) também admite que a necessidade do dia da reflexão estará, hoje em dia, “mais esbatida” por haver “meios de informação alternativos, jornais online, blogues, grupos de whatsapp, além dos tradicionais jornais, rádios e televisões”, segundo nota que surge no mesmo relatório e também de acordo com citação do Público.
“Mal não faz que exista”, conclui, contudo, a OA.
A “tragédia” do voto antecipado sem reflexão
Mas, nas redes sociais, a maioria dos utilizadores, nomeadamente no Twitter, parece não entender a existência deste dia de reflexão, com muitas pessoas a brincarem com esta paragem na campanha eleitoral.
Entre aqueles que pedem o fim da medida na próxima legislatura, há quem lembre, com ironia, a “tragédia dos que votaram antecipadamente na semana passada sem terem direito a um dia de reflexão”.
“A existência de um dia de reflexão implica a existência de um dia de refração“, consideram ainda outros utilizadores, alinhando pelo tom da brincadeira.
A existência de um dia de reflexão implica a existência de um dia de refração pic.twitter.com/R8NB80TnbP
— Manuel Machado à procura de equipa 🇳🇬 (@manuelmachades) January 29, 2022
Estas eleições podem ficar marcadas pela tragédia dos que votaram antecipadamente na semana passada sem terem direito a um dia de reflexão. O dia da reflexão é absolutamente fundamental! Eu mudo sempre o sentido de voto no dia da reflexão. Sempre!
— Fábio Benídio (@FBenidio) January 29, 2022
Espero que haja consenso, na próxima legislatura, para acabarem com o dia de reflexão.
Se isso não for possível, espero que haja consenso para acabarem com as queixas, no dia de reflexão, sobre a existência do dia de reflexão.
— Alexandre Martins (@alexmartins) January 29, 2022
Se já acham difícil conseguir respeitar um dia de reflexão, imaginem o esforço que o Marcelo tem feito nas últimas duas semanas para se manter em silêncio!
— o Procurador (@Adolfo_Dias_I) January 28, 2022
Dia de Reflexão #legislativas #Legislativas2022 #Legislativas22 pic.twitter.com/Xynnn26wVK
— Pedro Mamede (@pedromamede) January 29, 2022
Espanha proíbe sondagens nos 5 dias anteriores
O relatório da Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar da Assembleia da República citado pelo Público fez uma comparação entre os vários regimes existentes em diversos países europeus, destacando que Espanha, França e Itália também cumprem o dia de reflexão, enquanto que Irlanda, Reino Unido e Suécia não.
Contudo, na Suécia existe uma espécie de consenso diplomático entre os partidos para não participarem em acções de campanha no dia das eleições, de modo a que os eleitores possam decidir o seu voto “sem qualquer pressão”, como repara o dito relatório.
Já na Irlanda, foi a entidade que supervisiona os órgãos de comunicação social que decretou um dia de reflexão, com início às 14 horas da véspera das eleições, num guia com as boas práticas para a cobertura eleitoral.
No Reino Unido, também foi o órgão que supervisiona os media a definir que não pode haver debates, nem sondagens enquanto as urnas estiverem abertas.
Em Espanha, além do dia de reflexão que se assinala como em Portugal, também não pode haver sondagens nos cinco dias anteriores às eleições. As penas de prisão vão dos três aos 12 meses e a multa de seis a 24 meses, sendo calculada ao dia.
No caso de França, também existe o dia de reflexão com pena de multa de 3750 euros para quem violar as regras.
Em Itália, na véspera e no dia das eleições estão proibidas as atividades de propaganda política, com multras de entre 103 e 1033 euros para quem não cumprir.
Na Alemanha, não há período de reflexão, mas não pode ser divulgada propaganda eleitoral na véspera das eleições e as multas para quem não cumprir podem chegar aos 50 mil euros.
Na Bélgica, a divulgação de sondagens e a transmissão de debates estão proibidos na véspera do sufrágio, tal como as caravanas de campanha e a distribuição de panfletos eleitorais na noite anterior ao dia de voto. Violar as regras dá direito a pena de prisão de oito a 14 dias e a multas entre 143 e 1100 euros.
Palhaçada e hipocrisia. Então para os que votaram antecipadamente, não houve período de reflexão? Então não votaram estando a campanha eleitoral a decorrer?