Segundo uma nova investigação, crianças ainda na fase pré-fala e chimpanzés usam cerca de 90% dos mesmo gestos físicos. A descoberta lança uma nova luz sobre a origem da comunicação dos primatas.
A investigação, publicada a 8 de setembro na Animal Cognition, é a primeira a classificar os gestos criados por crianças através da mesma técnica usada na classificação de gestos de outros primatas, nomeadamente de chimpanzés.
Os resultados demonstraram que crianças entre os 12 e os 24 meses usam cerca de 90% dos mesmos gestos utilizados por chimpanzés jovens e adultos. Os gestos incluem os abraços, os saltos ou pulos, o pisar e o arremesso de objetos.
Segundo os investigadores, a existência desta similitude nos gestos sugere que os gestos das crianças são comportamentos inatos – um legado da partilha comum na história evolutiva.
Os autores do estudo esperavam expor as semelhanças e as diferenças na forma como as crianças humanas usam os gestos em comparação com os primatas, na esperança de desvendar novos caminhos no desenvolvimento da comunicação humana.
“Sabendo que os chimpanzés e os humanos partilharam um ancestral comum há cerca de 5 ou 6 milhões de anos, quisemos saber se a nossa história evolucionária de comunicação também se refletiu no desenvolvimento humano”, afirmou Verena Kersken, investigadora na Universidade de Gottingen e autora do estudo.
No estudo, os investigadores observaram os gestos das crianças nas suas próprias casas ou nas creches juntos dos seus pares, familiares ou educadoras.
Na observação foram analisadas 13 crianças no total, 6 na Alemanha e 7 no Uganda. O facto de terem sido escolhidas culturas tão diferentes não é casual, e o objetivo neste método serviria para “diminuir a predisposição do impacto cultural e da língua nativa nos primeiros gestos”, lê-se no documento.
Já os chimpanzés analisados tinham idades compreendidas entre 1 e 51 anos, e foram observados no seu habitat natural na floresta Budongo, no Uganda.
Os macacos selvagens, não sendo portadores de uma linguagem vocal, utilizam cerca de 80 gestos diferentes que foram recolhidos num dicionário online, Great Ape Dictionary, que ajuda a desvendar o significado da linguagem destes mamíferos.
“Chimpanzés, gorilas e orangotangos, todos usam gestos para comunicar no seu dia-a-dia, mas até ao momento faltava um primata em toda a equação: nós“, explicou Catherine Hobaiter, autora sénior da investigação e cientista na Escola de Psicologia e Neurociência da Universidade de St. Andrews.
“Usamos a mesma abordagem para estudar chimpanzés e crianças, o que faz sentido – as crianças são apenas pequenos macacos“, revelou.
Os gestos documentados nas crianças incluem levantar braços, pisões, palmas, abraços, abanar de cabeça, agarrar entre outros num total de 52 diferentes gestos dos quais 46, ou 89%, também foram documentados nos chimpanzés. Tal como os macacos, as crianças usaram os gestos isoladamente ou numa sequência para exprimir os seus anseios.
“Achávamos que iríamos encontrar um ou outro gesto semelhante, mas estamos fascinados por encontrar tantos gestos de macacos nos gestos das crianças”, contou Hobaiter.
Quanto às diferenças, o estudo indica que as crianças terão usado com mais frequência gestos de apontar – coisa que os macacos têm muita dificuldade e até cães e lobos o fazem com mais distinção. Curiosamente, o gesto de abanar a mão em forma de cumprimento ou de despedida aparentou ser um gesto distintamente humano.
Apesar das grandes diferenças entre o Homem e o macaco, esta investigação demonstra que o ser humano reteve algum dos comportamentos partilhados anteriormente com o macaco e que são visíveis no início do nosso desenvolvimento.
Os investigadores também adiantaram que estes gestos desempenham uma importante tarefa naquilo que será, depois, o desenvolvimento da linguagem verbal.
No futuro, a equipa que desenvolveu o estudo afirma que gostaria de repetir a investigação mas com um maior número de crianças num espetro ainda mais diversificado de culturas.
Importa ainda sublinhar que, independentemente do passado comum, estes comportamentos semelhantes poderão estar relacionados com o facto de as crianças e os chimpanzés terem corpos similares, o que resulta numa igual linguagem corporal.
Afonso Guedes, ZAP // Gizmodo