Costa sem apoio de Montenegro para Bruxelas. Três motivos para esta decisão

António Pedro Santos/LUSA

Luís Montenegro em reunião com António Costa

Moeda de troca, críticas internas, Justiça. A curiosa hesitação do primeiro-ministro em relação ao outro primeiro-ministro.

Ainda era primeiro-ministro com plenos poderes, vencendo as eleições legislativas de 2022, e já se falava sobre o assunto.

Agora que está de saída do Governo de Portugal, que está a despedir-se do Palácio de São Bento, a questão reforça-se: António Costa vai ser o próximo presidente do Conselho Europeu?

O ainda primeiro-ministro de Portugal é visto, lá fora, como alguém competente no cargo que exerceu ao longo de oito anos. É popular em Bruxelas, é elogiado por altos líderes europeus.

Já houve declarações públicas a favor de Costa, como de Emmanuel Macron ou Olaf Scholz, respectivamente chefes de Estado de França e Alemanha.

Basta recordar o vídeo que Charles Michel, o actual presidente do Conselho Europeu, publicou para se despedir de um homem com “bom-humor e capacidade de resolver problemas”.

Dear @antoniocostapm we will miss your good humour and problem-solving skills — very handy during the 74 summits you participated in. #EUCO

Obrigado caro António, e felicidades! pic.twitter.com/AVDXcFvqkU

— Charles Michel (@CharlesMichel) March 21, 2024

Mas Luís Montenegro não apoia António Costa para Bruxelas. Pelo menos, para já. Porque “é prematuro” falar sobre isso, segundo o próprio.

Especialistas em política apresentam três motivos para essa decisão.

Moeda de troca

O primeiro é esperar por algo em troca: “Luís Montenegro só apoia António Costa se sentir que há da parte do PS uma predisposição para negociar, para não dificultar a vida ao Governo”, comenta José Filipe Pinto na CNN Portugal. E até “faz sentido”, completa.

“Luís Montenegro pode estar a ser táctico. Não significa que não venha a fazer um compromisso formal de apoio, mas quer garantias. Não há apoios grátis. Tudo na política é uma moeda de troca”, acrescenta Paula do Espírito Santo, que acredita que essa moeda de troca “pode valer bastante. A política faz-se de apoios e de contrapartidas”.

Também é natural que o primeiro-ministro indigitado tenha outras prioridades. Formar o seu Governo é bem mais importante do que deixar teorias sobre o futuro do seu antecessor.

Mesmo assim, “é curioso que Luís Montenegro não tenha dito ainda categoricamente que não apoia uma eventual candidatura de António Costa, dando a entender que há abertura para um diálogo”, analisa o politólogo João Pacheco.

Críticas internas

Montenegro também estará a resguardar-se, evitando críticas que poderiam surgir dentro do próprio PSD.

Até porque o partido, pelo menos o núcleo central, ainda nem falou sobre o assunto, por isso é uma posição “politicamente correcta”, descreve Paula do Espírito Santo – que acredita que a visão de Estado se vai sobrepor à “visão partidária”.

É uma questão de prudência, analisa José Filipe Pinto. António Costa na liderança em Bruxelas seria valorizar Portugal e valorizar… o PS. E não convém passar a ideia de que o PSD apoia o PS.

Justiça

O terceiro motivo não é surpreendente: António Costa viu o seu nome envolvido num processo judicial. Aliás, foi por isso que se demitiu.

Luís Montenegro “entende que não se justifica apoiar um candidato que, apesar da presunção da inocência, tem um processo em curso. Esta pode ser uma justificação, a escapatória, o politicamente correcto”, resume o politólogo José Filipe Pinto.

O primeiro-ministro indigitado prefere esperar para ver se há desenvolvimentos na Operação Influencer. Mas vai ter de esperar muito tempo.