Cocaína encontrada em cérebros mumificados sugere que a consumíamos muito antes do que se pensava

Luis Pérez/Flickr

Folha de coca

Consumo de cocaína na Europa é 200 anos anterior aos registos atuais, segundo novo estudo baseado na análise de tecido cerebral de nove indivíduos bem preservados numa cripta de antigo hospital de Milão.

Vestígios de cocaína encontrados no tecido cerebral mumificado de dois indivíduos do século XVII sugerem que o consumo da droga na Europa começou muito antes do que se pensava.

As descobertas da nova investigação, liderada por Gaia Giordano, da Universidade de Milão, fazem recuar 200 anos a cronologia do consumo de cocaína no continente, desafiando assim a crença de longa data de que a droga só se tornou predominante no continente no século XIX, após o seu isolamento químico das folhas de coca.

O estudo envolveu a análise de tecido cerebral de nove indivíduos enterrados numa cripta que remonta à década de 1600 na cidade de Milão, em Itália. A cripta, que fazia parte do antigo hospital Ca’ Granda, tinha restos mortais bem preservados de pessoas que, provavelmente, faziam parte da população mais pobre da cidade.

Os cérebros mumificados que apresentavam vestígios de cocaína.

Os investigadores recolheram pequenas amostras do tecido cerebral para investigar a presença de drogas utilizadas durante esse período e, para sua surpresa, encontraram vestígios de cocaína nos cérebros de dois indivíduos — apesar de a droga desaparecer normalmente do corpo poucos meses após o consumo.

Juntamente com a cocaína, os investigadores detetaram higrina, um composto associado à mastigação de folhas de coca, o que indica que estes indivíduos tinham consumido a planta diretamente e não através de outros métodos, para uso medicinal.

As folhas de coca têm sido mastigadas há milhares de anos na América do Sul pelos seus efeitos psicoactivos e terapêuticos. Embora os conquistadores espanhóis conhecessem as propriedades da planta e tentassem exportá-la no século XVI, acreditava-se que a planta não era facilmente transportada e que o seu uso na Europa era limitado, recorda o New Scientist.

No entanto, estas novas provas sugerem que as folhas de coca chegaram de facto à Europa, pelo menos ocasionalmente, e eram acessíveis mesmo às classes mais baixas.

Colocando os resultados numa linha cronológica, os investigadores acreditam que faria parte do comércio de plantas exóticas entre a América do Sul e a Europa, provavelmente facilitado pelas redes imperiais de Espanha.

O uso da coca por indivíduos mais pobres indica que a planta estava disponível no mercado livre, acrescenta Mario Zimmermann, perito da Universidade Estatal de Boiseo, sobre o estudo publicado no Journal of Archaeological Science.

“A questão interessante agora é saber até onde e a quantas pessoas chegou”, conclui, citado pelo New Scientist.

Tomás Guimarães, ZAP //

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