Cientistas de uma startup neozelandesa dizem ter descoberto a “penicilina dos vírus”. Pode ser usada para tratar várias doenças.
Antes da resistência antimicrobiana se tornar um problema mundial, a penicilina — o primeiro antibiótico a ser descoberto pela ciência — era o kryptonite para a maioria das bactérias, já que é uma medicação considerada de amplo espectro.
Isto significa que podia e, em alguns casos, ainda pode matar um grande número de patógenos, sem que o médico precisasse de saber qual deles atacava o paciente. Para os vírus, nunca nenhum remédio do tipo foi descoberto e, para a maioria das infeções virais, ainda não existe um antiviral específico ou similar à penicilina. Só que isso pode, em breve, mudar.
Na Nova Zelândia, cientistas da startup Kimer Med querem criar o primeiro antiviral de largo espectro, capaz de combater uma infinidade de vírus com alta eficácia e segurança. O medicamento quase milagroso tem o nome de VTose e é construído a partir de estudos anteriores que foram abandonados, com o medicamento Draco. Segundo os responsáveis, faltaram recursos financeiros para o estudo anterior.
Cada vírus representa um imenso problema para os cientistas e para a indústria farmacêutica devido à sua diversidade. Afinal, existem diferentes variações entre as estirpes virais e, às vezes, isso implica sintomas e complicações diferentes.
Por exemplo, no caso da hepatite, são cinco os tipos mais comuns (A, B, C, D e E) que afetam o fígado, mas nenhum deles age de forma exatamente igual no corpo. Cada solução deve ser individual.
Outro ponto é que a taxa de replicação dos vírus é bastante alta. Em constante evolução, eles tornam-se especialistas em fugir de medicamentos desenhados especificamente contra eles.
Esta é uma das explicações para o porquê de não termos medicamentos que consigam eliminar o vírus do HIV — o que há, no mercado farmacêutico, consegue apenas controlar a doença e, dependendo do caso, impedir que uma pessoa saudável contraia a infeção.
Como é que a startup quer modificar o combate aos vírus?
A estratégia do novo antiviral é encontrar um ponto que é comum para todos os vírus que infetam os humanos, mesmo aqueles que ainda não foram descobertos pela ciência.
Segundo a equipa da Kimer Med, durante a replicação de qualquer vírus dentro de uma célula, é produzido um ARN de fita dupla (dsARN). Este pode ser reconhecido pelo medicamento e, após a identificação, o composto VTose estimula a apoptose celular, ou seja, a morte programada da célula infetada, o que curaria o paciente.
“Até ao que sabemos, todos os vírus criam longos segmentos de dsARN como parte do seu processo de replicação. Com base nisso, temos boas razões para acreditar que o VTose pode ser eficaz contra todos os vírus humanos e animais. No entanto, tendo dito isso, podem haver exceções das quais ainda não estamos cientes”, descreve o artigo no site da startup.
Considerando a primeira versão do antiviral, aquela conhecida como Draco, o composto conseguiu eliminar, em experiências em laboratório, 15 vírus diferentes. Além disso, em testes com modelos animais, no caso de ratos, o composto melhorou os sintomas do vírus H1N1 (influenza).
De momento, a startup planeia testar a potencial penicilina contra o coronavírus SARS-CoV-2, HIV, Hepatite B, dengue e outros tipos de vírus que afetam humanos e animais. Caso a nova ronda de testes de laboratório apresente resultados promissores, a ideia é começar os testes clínicos, ou seja, com humanos.
// Canaltech
Os virus podem ser veículos de transmissão de genes que podem ter consequências positivas na evolução. Se formos muito eficazes na destruição de virus podemos estar a danificar um instrumento evolutivo fundamental. Isto é um aviso aos aprendizes de feiticeiro que, querendo fazer bem, acabam por fazer muito mal.