Chega para cá ou chega para lá? Ventura saúda “aproximação” de Montenegro

André Kosters / Lusa

André Ventura durante sessão do orçamento

André Ventura acredita que os recentes comentários de Luís Montenegro sobre os desempregados e a imigração indicam uma aproximação do líder do PSD ao Chega.

O crescimento do Chega até terceira força política tem sido acompanhado por questões sobre como o PSD deve lidar com a ascenção da extrema-direita, dado parecer cada vez menos provável que os sociais-democratas consigam formar Governo sem o apoio da extrema-direita.

Questionado recentemente sobre está disposto a dar a mão a Ventura, Montenegro pareceu responder com um “nim”. O líder do PSD referiu que não quer ser primeiro-ministro “com arranjos parlamentares” visto que esse é o “caminho de António Costa” e frisou que a possível aliança com o Chega não está “na agenda de prioridades”.

“A minha prioridade são os portugueses. Digam que eu sou ambíguo e continuem a falar daquilo que não interessa às pessoas”, atirou aos jornalistas.

Mas André Ventura está a ver na postura de Montenegro sinais promissores. Esta segunda-feira, o presidente do Chega saudou uma “aproximação de posições” do PSD ao seu partido, dizendo que, mesmo sem reuniões, Luís Montenegro já deixou cair algumas “linhas vermelhas” na imigração e nos apoios da Segurança Social.

“Se começa a utilizar as bandeiras do Chega e diz aquilo que o presidente do Chega diz, até é melhor. Não quer reunir comigo, mas já diz o que eu digo, imagine depois de reunir comigo, sai de lá a dizer que temos um governo fortíssimo de direita para os próximos anos em Portugal“, afirmou.

Recorde-se que Montenegro recentemente considerou “imoral uma sociedade onde as pessoas que trabalham chegam ao fim do mês e ganham menos do que pessoas que não trabalham” e referiu que Portugal deve acolher imigrantes “de forma regulada” e “procurar pelo mundo” as comunidades que se integram melhor.

Ventura foi questionado, em concreto, se declarações recentes de Luís Montenegro sobre imigração e sobre os rendimentos das pessoas com apoios da Segurança Social seriam uma tentativa de esvaziar as bandeiras do Chega.

“A tentar está, mas apenas consegue esvaziar as do PSD. O PSD sempre disse que não podia falar com o Chega porque haveria três ou quatro linhas vermelhas, e entrem elas estão a imigração ou os apoios da Segurança Social”, respondeu.

Para André Ventura, “ter o líder do PSD a dizer, de uma forma diferente, o que diz o Chega e o presidente do Chega só pode significar que não há linhas vermelhas“. “Estamos no bom caminho para formar um Governo, registo este ‘mea culpa’ do dr. Luís Montenegro, este volte face do PSD”, rematou.

Questionado sobre a recusa reiterada do presidente do PSD em reunir consigo, André Ventura considerou que se trata de uma “questão pessoal” para colocar a Luís Montenegro, mas desvalorizou esse aspecto.

“Depois veremos quem lidera a direita, neste momento ainda é o PSD nas sondagens mas temos esperanças que muito em breve possa ser o Chega. Para já é um sinal muito positivo esta aproximação de posições”, saudou.

Pode uma aliança com o Chega prejudicar o PSD?

Será que a ambiguidade social-democrata sobre uma aliança com o Chega pode prejudicar o partido nas próximas eleições?

De acordo com André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, uma aproximação à extrema-direita acarreta dois grandes riscos para o PSD —  faz “prevalecer o discurso anti-sistema do Chega” e limita os possíveis “entendimentos à esquerda e à direita” no futuro, ficando o PS com um leque de possíveis alianças mais abrangente.

Já José Santana Pereira, professor de Ciência Política no ISCTE, explica ao Público que o PSD arrisca perder dois tipos de eleitores ao romper com o cordão sanitário à extrema-direita.

“Por um lado, os mais moderados, para os quais uma coligação com o Chega é indesejável (estes talvez se abstenham ou votem no PS). Por outro, os que são mais de direita, que, não sentindo a pressão para votar estrategicamente no PSD com vista a aumentar a probabilidade de um Governo de direita, preferirão votar sinceramente no Chega”, argumenta.

Há já também provas preliminares que a estratégia ambígua de Rui Rio sobre o Chega pode ter sido parcialmente culpada pelo desaire do PSD nas legislativas de há um ano.

José Santana Pereira, um dos autores de um estudo preliminar sobre as eleições de 2022, aponta que indícios de que esta postura de Rio pode ter fomentado a “mobilização por parte do eleitorado de esquerda e de centro (que não veria, com certeza, com muito bons olhos o Chega no governo) e voto estratégico desse mesmo grupo de eleitores no PS”.

Quando as sondagens indicavam que o PSD iria vencer as eleições, o eleitorado de esquerda abandonou os parceiros da geringonça e apostou as fichas no PS para travar o regresso da direita ao poder e a possibilidade de o Chega integrar o Governo. Ao mesmo tempo, o eleitorado da direita também foi influenciado.

“Ao não expressar um claro afastamento em relação à possibilidade de coligação (ou geringonça de direita), Rui Rio não terá fomentado grandemente voto estratégico entre os eleitorados de direita”, remata José Santana Pereira.

Por outro lado, a aproximação ao Chega pode permitir ao PSD recuperar o eleitorado que perdeu para outros partidos da direita, como a Iniciativa Liberal e o próprio Chega, nas últimas eleições. Resta a Montenegro fazer as contas sobre o custo-benefício de uma aproximação à extrema-direita.

Adriana Peixoto, ZAP // Lusa

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