Células estaminais: a medula óssea falhou; a solução pode estar no fígado, diz estudo do i3S

Pinto-do-Ó, P., Cumano, A., Mesquita Peixoto, M. et al / JEM

Mapa celular do fígado embrionário

Uma equipa do i3S publicou o primeiro mapa celular do fígado embrionário. O trabalho, resultado de mais de dez anos de investigação, pode ajudar a dar resposta às necessidades de células estaminais do sangue — às quais a medula óssea do adulto não tem dado.

Uma equipa de investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) e do Instituto Pasteur, publicou o primeiro mapa celular do fígado embrionário, um órgão fundamental para o desenvolvimento das células estaminais do sangue ou hematopoiéticas.

Os investigadores esperam que esta nova ferramenta contribua para a descoberta de mecanismos para multiplicar com sucesso células estaminais hematopoiéticas para uso terapêutico.

As células estaminais do sangue foram as primeiras células estaminais a serem isoladas e as primeiras a serem utilizadas com grande sucesso na prática clínica, nomeadamente nos transplantes de medula óssea para tratamento de mais de 80 doenças.

Estas células estão presentes em zonas muito específicas da medula óssea do adulto e no sangue do cordão umbilical, mas, em ambos os casos, em número reduzido, o que limita o seu uso.

Além disso, sempre que se tenta expandir o seu número fora do organismo (dividirem-se ex vivo) estas células começam a sofrer algum tipo de diferenciação, perdendo todo o potencial terapêutico inicial, ou seja, gerar de forma continuada qualquer outro tipo de célula.

Egídio Santos / U.Porto

As equipas de Perpétua Pinto-do-Ó (na foto), no i3S, e de Ana Cumano, no Instituto Pasteur, estudaram o fígado embrionário, local onde as células estaminais do sangue se desenvolvem antes de transitarem para a medula óssea

É, por isso, urgente encontrar formas de multiplicar estas células em laboratório para que possam depois ser transplantadas com sucesso e em número. E isto depende de compreendermos quais os sinais e quais os controlos que as células vizinhas e o ambiente onde residem essas células exercem sobre elas ao ponto de as manterem neste estado.

As equipas de Perpétua Pinto-do-Ó, investigadora principal do grupo de Biologia Regenerativa do i3S, e de Ana Cumano, professora do Instituto Pasteur, em Paris, optaram por um caminho alternativo e decidiram estudar o fígado embrionário — órgão em que as células estaminais do sangue se desenvolvem antes de transitarem para a medula óssea

No decorrer do estudo, que foi apresentado num artigo recentemente publicado no Journal of Experimental Medicine, a equipa conseguiu, pela primeira vez, mapear com detalhe a localização das células estaminais neste órgão do embrião.

“Se ao fim de tantos anos a medula óssea do adulto não tem dado resposta para a proliferação das células estaminais hematopoiéticas, talvez a solução esteja no fígado do embrião”, adianta Márcia Mesquita Peixoto, investigadora do Instituto Pasteur e primeira autora do artigo.

“Foi assim que começámos a estudar em detalhe o microambiente em que estas células adquirem competências para reconstituir o sangue e o sistema imune do adulto e conseguimos não só mapear as populações conhecidas como também identificar novas populações das células do fígado embrionário e a sua localização relativa no tecido”, acrescenta a também investigadora do i3S.

Estes resultados, explicam as investigadoras, representam “uma contribuição única para a compreensão do microambiente celular em que as primeiras células estaminais do sangue terminam a sua formação e aumentam o número em que irão estar disponíveis na medula óssea durante a vida adulta”.

A forma como o fígado embrionário se organiza “é muito diferente da medula óssea”, adiantam Perpétua Pinto-do-Ó e Ana Cumano.

“Por isso, talvez a chave para perceber o que controla a capacidade de divisão e o potencial regenerativo destas células poderá ser mais facilmente acedido se percebermos o que se passa no microambiente do fígado embrionário; talvez se encontre aqui a resposta que nunca foi encontrada na medula óssea“, acrescentam.

O primeiro passo, que foi a construção deste minucioso atlas celular, já está dado”, concluem as investigadoras.

ZAP // Notícias UP

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