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Câmaras de Lisboa e Porto contra a lei — pouco clara — para manter AL sem atividade comprovada

Mais Habitação prevê cancelamento dos registos por decisão do Presidente da Câmara, mas abre espaço a interpretação. Umas autarquias dizem seguir “sanção prevista na lei”; outras, como Lisboa e Porto, recusam-se a fazê-lo.

Mais de um terço dos proprietários de Alojamentos Locais (AL) falhou em cumprir um requisito legal fundamental — a comprovação de atividade das suas unidades, cujo prazo, já prolongado, terminava a 13 de dezembro.

Ao final do prazo estendido, quase 36% dos proprietários não apresentaram a necessária declaração contributiva, o que levanta uma questão central: o que acontece agora​ a estes registos de AL?​

A obrigatoriedade de apresentação deste comprovativo consta do pacote legislativo Mais Habitação ​e o seu objetivo era muito simples — garantir que os imóveis registados como AL estivessem efetivamente em uso, evitando a especulação imobiliária e o impacto negativo no mercado de arrendamento residencial.​

Contudo, o cumprimento da exigência legal não é tão simples como previsto e a resposta parece estar neste momento nas mãos das câmaras municipais​. As câmaras podem decidir não cancelar o registo de AL? Não é claro.

Segundo a lei, a não entrega do comprovativo “implica o cancelamento dos respetivos registos, por decisão do presidente da câmara municipal territorialmente competente”.​ E é aqui que se levantam as dúvidas. A lei não especifica claramente os critérios que as Câmaras devem usar para decidir se mantêm ou cancelam um registo, abrindo espaço para a interpretação.

Enquanto algumas autarquias, como Cascais e Lagos, indicam que seguirão as normas e aplicarão a “sanção prevista na lei”, outras, como Albufeira, ainda estão a avaliar a situação. Outras, como Lisboa e Porto, cidades com o maior número de ALs, admitem que não o farão sem audição prévia.

“A lei não é explícita a determinar os meios de prova de manutenção de atividade de exploração”, explica ao Público Neuza Pereira de Campos, responsável pelo departamento de imobiliário da SRS Legal, que admite ter dúvidas de que “os critérios aplicados pelos vários municípios sejam uniformes”.

E é precisamente essa divergência que se faz notar entre os municípios. Apesar de admitirem tomar medidas diferentes, todas as autarquias contactadas pelo Público admitem que irão analisar caso a caso antes de avançar com o cancelamento de registo de Alojamentos Locais sem licença de funcionamento válida.

Se Carlos Moedas, presidente da Câmara de Lisboa — que só recebeu o comprovativo de 11.447 de 19.917 registos — garante que “neste momento, a câmara municipal não pode, nem tem a capacidade para estar a anular todas estas licenças”, no Porto rejeitam-se os cancelamentos sem audição prévia.

“Não haverá cancelamentos tácitos de alojamentos locais”, diz fonte oficial da autarquia liderada por Rui Moreira ao matutino.

“O regime jurídico subjacente ao pacote Mais Habitação tem disposições pouco claras e que geram alguma incerteza quanto aos procedimentos aprovados. Não há dúvidas, parece-nos, de que a caducidade dos títulos de alojamento local cuja atividade não tinha sido comprovada não é automática, o que significa que, até existir um ato administrativo de cancelamento do registo do alojamento local, o mesmo mantém-se válido e em vigor”, explica

“Parece-nos que tal terá de ser o procedimento adotado, respeitando, assim, os princípios gerais de direito administrativo, já que o direito à audição prévia é reconhecido pela doutrina e pela jurisprudência como um princípio estruturante da atividade administrativa, cuja violação ou incorreta realização se traduz numa violação de uma formalidade essencial, que, em princípio, é determinante da ilegalidade do próprio ato”, completa.

ZAP //

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