Embora alguns protótipos do chamado tanque voador tenham chegado a levantar voo, os projetos acabaram sempre por cair por terra.
A rápida evolução de máquinas de guerra nos anos após a Primeira Guerra Mundial mudou os paradigmas do combate bélico.
A Frente Ocidental da Primeira Guerra tinha desenvolvido rapidamente linhas de trincheiras estáticas. Milhares de homens morriam nos ataques para ganhar poucas centenas de metros de território. Arame farpado, artilharia e metralhadoras aumentaram enormemente os custos dos avanços frontais.
A invenção dos primeiros tanques armados em 1917 rompeu esse impasse. Os tanques conseguiam mover-se através do arame farpado e eram, em grande parte, imunes aos ataques das metralhadoras.
Assim, as táticas militares voltaram-se para uma nova forma de máquina de guerra que imitava as antigas campanhas de cavalaria — enormes batalhas disputadas ao longo de amplos territórios. E outra arma mais moderna — o avião — ampliou ainda mais essa capacidade.
Nos anos 1930, diversos exércitos começaram a imaginar como é que as tropas isoladas pelo curso da batalha ou que aterravam de paraquedas muito além das linhas inimigas poderiam conseguir apoio blindado com rapidez.
A melhor forma parecia ser combinar pequenos tanques com os grandes aviões bombardeiros. Experiências foram realizadas, especialmente na União Soviética, nos anos 1930. Entre os conceitos, havia pequenos tanques com armamento leve e metralhadoras sob as asas de grandes aviões bombardeiros.
Os aviões aterravam, descarregariam os tanques e descolariam novamente. Tecnicamente, era viável, mas havia uma importante desvantagem: seria preciso ter terra plana suficiente por perto para que os grandes aviões pudessem pousar.
Por isso, surgiu outra ideia mais extravagante: porquê aterrar o avião se o próprio tanque poderia descer à terra? Assim surgiu a noção do “tanque planador”.
O desenvolvimento da ideia
O planador foi desenvolvido na primeira metade do século XX, principalmente para fins militares. A Alemanha, a União Soviética, o Reino Unido e os EUA dedicaram grandes esforços para desenvolver planadores que pudessem transportar tropas e carga para o campo de batalha.
Os planadores eram rebocados por aviões de transporte — como os planadores modernos, que são rebocados por aviões leves — e libertados perto do alvo para prosseguir até ao seu destino. Para serem eficazes, os planadores precisavam de espaço limpo para aterragem, mas foram uma arma decisiva na Segunda Guerra Mundial.
No início dos anos 1930, os estrategas militares procuravam máquinas de guerra com mais mobilidade. Com isso, os tanques diminuíram de tamanho.
O engenheiro americano J. Walter Christie tinha inventado um sistema de suspensão inovador que foi empregado em muitos tanques na Segunda Guerra Mundial. Ele começou a examinar o conceito do tanque voador no início dos anos 30.
O projeto de Christie era mais ambicioso que os que se seguiram. Envolvia aparafusar um par de asas e uma cauda ao tanque, além de um propulsor alimentado pelos motores do veículo.
Segundo Christie, o tanque conseguiria ficar suspenso no ar a cerca de 100 metros e transportado até ao campo de pouso com a sua própria potência.
“Além disso, o piloto do tanque voador não precisa do terreno plano exigido por um avião bombardeiro para descolar”, afirmou Christie, segundo mencionado na revista Popular Mechanics em 1932. “Ele pode descolar na lama, em campo acidentado e em terreno que impediria um avião de subir aos céus”.
O exército americano não tinha a mesma convicção de Christie e a sua ideia inovadora acabou por não ser aceite. Mas, alguns anos depois, outro projetista igualmente visionário tirou o conceito da mesa de desenho e levou-o para o ar, na União Soviética.
A alternativa soviética
Oleg Antonov era fascinado por aviação desde a infância. Quando ainda era adolescente, projetou o seu próprio planador. O seu talento como projetista acabou por levá-lo ao cargo de projetista-chefe da Fábrica de Planadores de Moscovo, onde projetou mais de 30 planadores diferentes.
Os estrategas militares soviéticos estavam a começar a entender que as unidades de paraquedistas poderiam precisar de armas mais pesadas para ajudá-los a sobreviver longe de forças aliadas.
Uma opção investigada foi enviar pequenos tanques a bordo de grandes bombardeiros, usando grandes paraquedas. Mas havia problemas nessa operação, como explica Stuart Wheeler, curador do Museu dos Tanques de Bovington, no Reino Unido.
“Um dos pontos que vemos nos soviéticos do pós-guerra é essa ideia de dispersão, lançando veículos com diversos paraquedas. Mas onde está a tripulação? Eles também lançavam a tripulação, mas eles poderiam aterrar muito longe e precisar de atravessar quilómetros para chegar até ao veículo”, segundo Wheeler.
Para Wheeler, “os tanques suspensos num [avião] Tupolev são uma solução para o problema, que não está longe do que acontecia nos Estados Unidos nos anos 1960, com helicópteros Sikorsky e veículos suspensos abaixo da aeronave”.
Mas, nos anos 30, essas ideias simplesmente não eram viáveis.
Em 1940 — apenas um ano antes da invasão da União Soviética pela Alemanha —, Antonov foi levado a trabalhar num planador que pudesse carregar pequenos tanques. Mas o projeto de Christie tinha-o intrigado e ele trabalhou num projeto de tanque voador chamado A-40.
O protótipo usava um tanque T-60, pequeno e rápido, usado para reconhecimento. Nele, eram aparafusadas duas asas e uma longa cauda estabilizadora. Wheeler afirma que não era um compromisso ideal.
“O problema é que o único veículo que realmente poderia entrar ali é um modelo de 1937, prejudicado pela sua blindagem fina e pela sua metralhadora pequena”, explicou Wheeler.
O que favorecia a ideia do tanque planador é que não exporia aviões de transporte grandes e lentos aos combates em terra. O tanque seria libertado a alguma distância da zona de aterragem e planaria até parar.
“O tanque pesa apenas cerca de seis toneladas e é bastante pequeno”, afirma o jornalista especializado em aviação Jim Winchester. “Mas a envergadura é a mesma de um pequeno bombardeiro e tem duas vezes a área das asas”.
Dois conjuntos de asas empilhados um sobre o outro são necessários para elevar suficientemente o tanque, a fim de mantê-lo suspenso.
O projeto de Antonov ficou na mesa de desenho até muito depois de a Alemanha invadir a União Soviética em 1941. Foi ali que Antonov percebeu como pode ser difícil transformar a ideia do papel para a realidade. O seu protótipo apenas foi construído em 1942.
No dia 2 de setembro de 1942, o piloto de teste Sergei Anokhin assumiu o tanque, rebocado por um bombardeiro Tupolev TB-3 com uma longa corda. O A-40 estava pronto para o seu voo inaugural.
“Para testar o voo, precisam de deixar de fora a munição e a maior parte do combustível para economizar peso”, explica Winchester. “O conceito era que, à medida que a torre do tanque girava, você movia os controlos das asas. Você simplesmente movimenta a arma para a esquerda ou para a direita”.
Mas o tanque era tão pesado que a torre também precisou de ser retirada. O Tupolev descolou com o A-40 a reboque, mas precisava de libertar o tanque cedo para evitar acidentes.
Anokhin conseguiu planar o tanque para pousar num campo. E, depois de pousar, conseguiu desmontar as asas e a cauda e conduzir o tanque de volta para a base.
A aerodinâmica básica do A-40 comprovou ser segura, mas o seu primeiro voo (que acabaria também por ser o último) demonstrou as dificuldades de fazer um veículo tão pesado sair do chão.
“Ele é chamado de tanque voador, mas, se disser isso, as pessoas vão pensar num objeto a sobrevoar e a disparar tiros, enquanto, na realidade, não era este o caso”, explica Winchester. “De certa forma, era uma solução à procura de problemas”.
Os estrategas soviéticos queriam, na verdade, que o conceito do A-40 fosse usado com o tanque T-34, muito mais pesado e eficaz.
Mas o atabalhoado voo inaugural demonstrou que não havia aeronave com potência suficiente para fazer o planador descolar com o tanque maior. Um T-34 totalmente carregado pesava 26 toneladas — mais de quatro vezes o diminuto T-60.
Este tanque pequeno poderia ter sido útil para apoiar unidades amigas, operando longe da linha de combate, mas teria menos utilidade em grandes batalhas.
“Você tem um tanque que pode ser útil em certas circunstâncias, mas não num ambiente de disputa na forma habitual”, afirma Winchester.
A tentativa japonesa
O projeto de Antonov nunca mais voou, mas não foi o fim do conceito de tanque voador. O Japão, que também se tinha interessado pelo conceito de Christie, explorou a ideia durante a Segunda Guerra Mundial.
O Tanque Leve Especial número 3 Ku-Ro japonês foi um projeto inteiramente novo, construído especialmente para a missão. Como o A-40, foi projetado para ser rebocado por uma aeronave grande e libertado para planar até ao campo de batalha.
Os projetistas descobriram que a tensão da descolagem em alta velocidade destruía rapidamente os pneus do tanque e instalaram um par de esquis.
Como as asas e as caudas, os esquis podiam ser rapidamente desmontados depois da aterragem, para que o tanque pequeno de 2,9 toneladas pudesse entrar em ação.
Mas, dois anos depois, o projeto foi cancelado porque o Japão viu-se a travar uma guerra defensiva. O crescimento da superioridade aérea dos Estados Unidos fez com que ficasse muito perigoso lançar essas armas com aeronaves lentas e vulneráveis. O projeto nunca saiu do estágio de protótipo e o tanque propriamente dito nunca voou.
Os projetos britânicos
O Reino Unido também fez algumas tentativas de criar um tanque voador durante a guerra, com um projeto mais simples, mas igualmente extravagante — que chegou a voar.
O Baynes Bat (“Morcego de Baynes”, em homenagem ao seu projetista, L. E. Baynes) foi um conceito de planador criado para explorar um projeto maior que pudesse ser usado com um tanque. Mas, ao contrário, do A-40, tinha apenas um conjunto de asas e não dois.
Se o Baynes Bat tivesse entrado em linha de produção, teria uma envergadura muito grande, de mais de 30 metros.
A asa também era projetada para trás — um salto aerodinâmico raramente observado durante a Segunda Guerra Mundial, que se tornaria uma característica comum nos jatos supersónicos de combate introduzidos uma década depois.
O Baynes Bat não tinha cauda e, no seu lugar, tinha um estabilizador vertical, parecido com barbatanas de cauda, montado na ponta de cada asa. Na realidade, o protótipo de Baynes não incluía um tanque — o piloto sentava-se numa fuselagem minúscula, minimizada pela asa gigante.
O seu piloto, Robert Kronfeld, observaria posteriormente: “Apesar do seu projeto não ortodoxo, a aeronave é pilotada de forma similar a outros planadores leves, com controlos muito leves e ágeis e manejo seguro pelos pilotos de serviço em todos os comportamentos normais de voo”.
Mas, poucos anos depois, Eric ‘Winkle’ Brown, o piloto de testes britânico que voou com mais aeronaves na História, ficou menos impressionado. Disse que o controlo era mau e que a sua “sensibilidade específica para frente e para trás, aliada à visão indiferente da cabine de comando, torna o planador uma proposta delicada para aterragem em espaços confinados. A ideia de um tanque preso a ele faz a mente ficar confusa. Parecia uma boa ideia na altura, mas…”.
Nunca foi construída uma versão do Baynes Bat em tamanho real. Para Winchester, “o Bat foi uma forma de levar algo para o campo de batalha, mas o problema foi que, na realidade, esse ‘algo’ nunca existiu”.
O Reino Unido descartou a ideia de um tanque voador. No seu lugar, foi construído um planador suficientemente grande para carregar um tanque — o Hamilcar.
A ordem de produzir um planador grande o suficiente para carregar um tanque tinha vindo do próprio primeiro-ministro britânico Winston Churchill em 1940. O incómodo planador Hamilcar tinha tamanho suficiente para carregar um tanque Tetrarch, com capacidade para dois homens, que poderia ser conduzido através das portas frontais do planador, abertas depois do pouso.
Ele foi usado nos desembarques do Dia D, mas enfrentou os mesmos problemas do T-60. O Tetrarch tinha o tamanho máximo que poderia ser ocupado no planador sem impedir a sua descolagem, mas era terrivelmente mal equipado e desarmado para combater os tanques alemães.
O tanque similar construído pelos americanos, o Locust, também cabia dentro do Hamilcar e enfrentava as mesmas dificuldades.
O fim do projeto
Oitenta anos após o seu único voo, Winchester afirma que o A-40 era um conceito interessante, mas acabou por tornar-se um beco sem saída.
“Havia os esforços envolvidos na construção dessas asas para voos únicos e a sua vulnerabilidade — você conseguia vê-los a quilómetros de distância e eles não conseguiriam mover-se com muita rapidez se ficassem em perigo”, explica Winchester.
A invenção dos grandes helicópteros e transportes militares dedicados após o fim da Segunda Guerra Mundial tornou redundante a ideia dos tanques voadores.
Durante a Guerra Fria, os soviéticos criaram diversos veículos que poderiam ser lançados de paraquedas com a tripulação no seu interior. Os veículos eram carregados em paletes com paraquedas e um sistema especial de foguetes era disparado quando se aproximasse do chão.
Os foguetes reduziam significativamente a velocidade de descida, permitindo que os veículos entrassem em batalha imediatamente.
Já os Estados Unidos conseguiram fornecer um pequeno tanque que era ainda mais surpreendente. O Sheridan M551 seria carregado sobre uma palete de metal com paraquedas. O paraquedas abriria ainda no interior da aeronave.
A força da abertura do paraquedas arrasta a palete, que absorveria a maior parte da força da aterragem, para fora do avião. Mas a tripulação precisaria de descer de paraquedas até ao solo separadamente, de outra aeronave.
A dramática aterrissagem do Sheridan pode ser observada no vídeo acima. O conceito do tanque com asas pode ter-se espatifado no solo, mas o sonho de ver tanques a descer do ar ainda não morreu.
// BBC