“Não posso responder, não posso responder”. Deputados tentaram interromper audição sobre TAP

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António Pedro Santos/LUSA

Luís Laginha de Sousa, presidente da CMVM

Até o presidente da comissão parlamentar de inquérito ficou surpreendido pelos constantes “desvios” de um (duplamente) condicionado presidente da CMVM.

O presidente da CMVM disse que a TAP não está obrigada a informar o mercado sobre o processo de privatização, porque é emitente de obrigações e não empresa cotada.

“No caso de haver obrigações, não há esta necessidade de dar essa informação ao mercado, na medida em que ela não interfere sobre o que é relevante” para os investidores, “que é o valor da obrigação e a capacidade de receber a obrigação”, afirmou o presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Luís Laginha de Sousa, na comissão parlamentar de inquérito à TAP.

O responsável do supervisor do mercado financeiro respondia a uma questão do deputado Bernardo Blanco, da Iniciativa Liberal (IL), sobre a inexistência de comunicações da TAP sobre o processo de privatização, para o qual foi chamada a assessorar uma consultora americana , que está a trabalhar com a TAP há nove meses, sem contrato.

“A intenção de avançar com um processo desses pode manter-se secreta dentro da empresa”, apontou o presidente da CMVM.

Laginha de Sousa disse ainda que “situação distinta era se a empresa fosse cotada e se as próprias ações fossem cotadas”, o que implica “um conjunto de obrigações mais alargadas e fortes em termos de comunicação ao mercado.

Já em resposta à deputada socialista Fátima Fonseca, o responsável apontou que o processo de privatização deve ser comunicado quando existir “alguma circunstância em que ele possa impactar materialmente o valor das obrigações e a possibilidade de a entidade poder satisfazer os seus compromissos perante os obrigacionistas”. “Nesse contexto, quando existir, se existir […] então aí deve ser comunicada”, disse.

Condicionado no processo

O presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) afirmou hoje que esta entidade não tinha motivos para duvidar da veracidade do comunicado emitido pela TAP que continha as razões da saída de Alexandra Reis.

“A CMVM não tinha motivos nenhuns para duvidar da veracidade de um comunicado que é emitido por uma entidade com obrigações cotadas”, afirmou Luís Laginha de Sousa, após uma pergunta colocada pelo deputado do Chega, Filipe Melo, salientando o “histórico de cumprimento da entidade em mercado”.

O deputado Filipe Melo, do Chega, questionou o responsável sobre se “acredita sempre na boa-fé” das informações enviadas à CMVM pelos emitentes ou se existiu “alguma inoperância” desta entidade.

Luís Laginha de Sousa confirmou que está a decorrer um processo de contraordenação “para apuramento de eventual responsabilidades contraordenacionais” da TAP, em informações enviadas ao regulador.

Mas o presidente da CMVM admitiu que subscreveu obrigações da TAP ainda antes de assumir funções na comissão e, por isso, não pode tomar decisões sobre o tema, incluindo sobre eventuais coimas.

Ausência de respostas

No entanto, esta audição com Laginha de Sousa foi muito preenchida com um factor: deputados a repetir e a insistir em perguntas – porque o líder da CMVM não respondia.

“Não posso entrar em mais detalhes”, ou “Está em segredo de justiça”, ou ainda “Não comentamos procedimentos internos”: foram frases repetidas pelo responsável.

Até o presidente da comissão parlamentar de inquérito ficou surpreendido pelos constantes “desvios” de um (duplamente) condicionado presidente da CMVM.

“Estávamos à espera de ter respostas mais conclusivas e mais focadas nas perguntas que foram colocadas. Eu não estava à espera de hoje ter um problema de ter aqui alguém que viesse referir a questão da existência de sigilo”, disse Jorge Seguro Sanches, lembrando que tinha falado algumas vezes com Laginha de Sousa antes desta audição, mas nunca foi informado sobre esta “limitação nas respostas”.

“Confesso a minha frustração, penso que ninguém compreende que não tenha havido esse contacto”, completou o socialista.

Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, atirou: “Quero manifestar a minha frustração em relação a esta audição. Sobre a matéria desta comissão de inquérito o presidente da CMVM não responde. Antes a CMVM dava respostas objetivas e concisas, ao contrário do Banco de Portugal. Parece que houve um processo de assimilação na forma como se responde nas comissões”.

Perante tantos “desvios”, os deputados tentaram mesmo interromper a audição, em diversos momentos.

Não aconteceu mas encontraram outra solução: passaram da primeira ronda de perguntas diretamente para a terceira (e última).

O presidente da CMVM, estreante nestes contextos, pediu desculpa e justificou-se: “Se calhar, releva também aqui o facto de ser a primeira vez que venho a uma CPI e, de facto, não me passou pela cabeça, nem me foi sinalizado essa questão”.

Após mais de quatro horas com Luís Laginha de Sousa, e após a falta de respostas, o presidente da comissão de inquérito propôs que fosse feito um pedido do levantamento do segredo de justiça no processo de contraordenação da CMVM.

A proposta foi aprovada pelos deputados e, se o segredo de justiça for mesmo levantado, a CMVM voltará ao Parlamento.

ZAP // Lusa

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