Até o arco-íris tem um lado negro

Em 1980, num almoço de professores num bairro de Jacarta, na Indonésia, Robert Blust apontou o dedo para um arco-íris e foi imediatamente advertido.

Um colega seu tinha aprendido na Samatra que, se o fizesse, arriscaria que o dedo ficasse dobrado como um arco-íris.

Segundo o Atlas Obscura, o dedo não sofreu represálias, mas a carreira de Robert Blust mudou a partir desse dia.

O então professor da Universidade de Leiden, nos Países Baixos, decidiu investigar etnografias em busca de crenças tradicionais.

Um relatório sobre esta proibição sugeria que o “tabu do arco-íris” – como viria a chamar ao fenómeno – não estava confinado ao Sudeste Asiático.

O professor acabou por descobrir que se estendia a 124 culturas: na América do Norte, entre os Atsugewi do norte da Califórnia e os Lakota das planícies do norte; em partes remotas da Austrália e ilhas isoladas na Melanésia; entre os Nyabwa da Costa do Marfim e os Kaiwá do Brasil; e até na Europa.

Se algumas culturas defendiam que apontar para o arco-íris implicava danos no dedo – como dobrar, paralisar, apodrecer ou inchar – outras teorizavam que os efeitos nocivos recairiam sobre a mãe de quem se atrevesse a fazê-lo.

Na maioria dos casos, era proibido apontar com o dedo indicador. A tradição sugeria que se usasse a cabeça, os lábios, o nariz, a língua ou o punho fechado para chamar a atenção para um arco-íris.

Se, por esquecimento, alguém apontasse com o dedo para o fenómeno, havia forma de reverter o castigo: molhar o dedo, colocá-lo numa cavidade corporal como a boca, o ânus ou umbigo; ou mergulhá-lo numa pilha de esterco de búfalo. Tudo dependendo da cultura em causa.

Blust, agora professor de linguística na Universidade do Havai, escreveu pela primeira vez sobre o tabu do arco-íris em 1998, mas teve dificuldade em publicar as suas descobertas devido à falta de interesse académico em ideias universalmente partilhadas. O artigo científico acabou por ser publicado este ano, na Anthropos.

O que motivava a crença?

Segundo o investigador, a crença poderia ser motivada por dois fatores-chave: pelo facto de os arco-íris serem considerados sagrados, uma manifestação de outro reino, e por ser um fenómeno encarado como “agressivo” no passado, com os guias a aconselharem frequentemente os turistas a evitá-lo.

Combinando estes dois fatores, fica claro que não se deve agir de forma agressiva em relação a um ser sagrado.

O Atlas Obscura também aponta que as pessoas tendem a agarrar-se a informações sobre ameaças, como a do dedo ou a da mãe. Além disso, os rumores sobre o perigo espalham-se muito rapidamente.

Apesar de ser quase impossível identificar, Blust sugere que o tabu do arco-íris possa ter origem no Paleolítico, mas também é provável que tenha sido repetidamente perdido e reinventado.

Liliana Malainho, ZAP //

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