Assistir a funerais de soldados desconhecidos. Nova rotina em Israel

Porque “há um aspecto da morte em Israel que é comunitário”. Centenas de israelitas anónimos aparecem em cemitérios desde Outubro.

O rasto de morte espalha-se em Israel, desde que começou a guerra em Gaza com o Hamas, em Outubro.

Ao longo destes últimos nove meses, começou a ser visível uma nova rotina entre os habitantes locais: ir a funerais de soldados que as pessoas não conhecem.

O portal Forward estima que centenas de israelitas começaram a aparecer em cemitérios para funerais de desconhecidos.

É mais do que o apoio a famílias de luto (um ritual entre judeus); é um dever cívico para uns, é uma catarse para outros, é uma forma de conexão, quase de criação de comunidade.

Um exemplo em destaque é o de Yisrael Campbell. 61 anos, humorista, e já foi a pelo menos 24 funerais durante a guerra. Uma rotina que começou logo a seguir ao dia 7 de Outubro.

“Este pode ser o único lugar em Israel onde não há sentimento de divisão“.

“Na maioria dos dias, parece que este país se vai partir num milhão de peças, mas aqui nunca sinto isso”, justifica, junto ao Monte Herzl, o ceminário nacional de Isrel.

Outros começaram a ir a funerais de soldados porque pensavam que quase ninguém iria aparecer na cerimónia.

Até quem pensava que nunca iria ao funeral de um desconhecido, mudou de postura: “É o nosso país, o nosso exército, os nossos soldados – e este soldado morreu por mim, o que faz dele tudo menos um desconhecido”, explica Angela Stauber, junto a uma campa no mesmo cemitério.

No geral, há a sensação de que os soldados passaram a fazer parte das pessoas que agora assistem à sua despedida. “Agora é a minha vez de fazer algo por eles“, continua Yisrael Campbell.

Não é uma perda pessoal directa – familiar ou amigo – mas é um sinal de reconhecimento.

E ainda há outro contexto: um soldado que sobreviveu a ataques do Hamas. “Vou a funeral de perfeitos desconhecidos, parcialmente, como uma forma de pedir desculpa, acho eu. Peço desculpa por ser aquele que sobreviveu. E parcialmente porque é a única forma de eu chorar”.

David Shire apresenta uma perspectiva diferente: “Podia ser o meu filho naquela campa. Honestamente, sinto-me sem forças quando penso nessa possibilidade. Por isso, talvez eu vá a funerais por pensar que não vai acontecer a mim – mas sei que não há lógica isso, isto é quase masoquista”.

Yisrael Campbell finaliza ao dizer que “há um aspecto da morte em Israel que é comunitário. Fazemos coisas uns pelos outros que não se faz nos EUA. É uma das coisas que adoro neste país”.

ZAP //

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