A Panóplia de Dendra, uma armadura da Idade do Bronze, é uma das mais antigas do seu género. Foi finalmente testada, cerca de 3500 anos depois de ter sido forjada, por um grupo de marines — e passou no teste.
Em 1960, foi descoberta uma misteriosa armadura da Idade do Bronze, após uma tentativa de pilhagem falhada num túmulo ricamente mobilado de um guerreiro caído, escavado num sítio arqueológico perto da aldeia de Dendra, no sul da Grécia.
Considerado um dos mais antigos fatos blindados completos da Idade do Bronze europeia, a Panóplia de Dendra, como ficou conhecida a armadura, tem intrigado os arqueólogos nos cerca de 60 anos que se seguiram à sua descoberta.
Totalmente intacto, o traje parecia sólido, mas as primeiras experiências com réplicas sugeriam que não era adequado para ser utilizado em longas batalhas.
Os arqueólogos interrogavam-se se o fato seria puramente cerimonial ou se seria apenas para algum chefe militar, que conduzisse as batalhas apenas a partir da sua carruagem.
Mas não é bem esse o caso, conta o Science Alert.
Num novo estudo, uma equipa de investigadores pediu a um grupo de 13 fuzileiros navais das Forças Armadas da Grécia que testasse a armadura numa simulação combate de 11 horas de duração, em condições de batalha recriadas a partir de textos históricos.
Os investigadores concluíram que o a Panóplia de Dendra teria sido “inteiramente compatível com a utilização em combate” e com as exigências da guerra — uma conclusão que deixou os amantes de reconstituições histórias muito excitados.
A encenação das batalhas foi feita com base em informações sobre a guerra e as táticas de combate na Grécia antiga a partir de uma tradução da Ilíada, de Homero — um longo poema sobre os últimos momentos da famosa Guerra de Troia, que teve lugar por volta de 1300 a 1200 a.C.
“Uma vez que não existem relatos históricos ou descrições da Idade do Bronze tardia grega sobre o âmbito e a utilização de armaduras do tipo Dendra, recorremos a um relato fundamental — e único — sobre guerras, batalhas e combates individuais: o relato épico de Homero sobre os 10 dias da Guerra de Troia, a Ilíada”, explicam os investigadores no artigo, publicado a semana passada na PLOS One.
A equipa analisou o texto de Homero e consultou literatura adicional, procurando pormenores sobre os ambientes dos campos de batalha, a duração típica das batalhas diárias na Guerra de Troia, o que os guerreiros comiam e bebiam e os tipos de manobras, técnicas de combate e armas normalmente utilizadas.
Seguidamente, os autores do estudo combinaram estas informações com dados publicados sobre sedimentologia e geomorfologia que situam as batalhas finais da Guerra de Troia numa área baixa de 4 quilómetros quadrados nas planícies pantanosas perto do rio Scamander, que circundava a cidade de Troia.
Segundo as estimativas, os guerreiros das últimas fases da Guerra de Troia teriam lutado em junho, com temperaturas de 24-29 °C e suado com uma humidade relativa de 70% a 85%.
As operações diárias do exército duravam provavelmente 11 horas, após um pequeno-almoço típico de pão seco, queijo de cabra, azeitonas e vinho tinto.
A partir de relatos de batalhas troianas, a equipa estabeleceu também que os beligerantes atacavam constantemente, recuavam, recuperavam, ganhavam terreno e recuavam — uma atividade de combate que se assemelha ao que hoje poderíamos designar por exercício intervalado de alta intensidade.
“Tudo isto foi feito para criar um protocolo de simulação de combate que reproduzisse as atividades diárias realizadas pelos guerreiros de elite no final da Idade do Bronze”, explica Andreas Flouris, investigador da Universidade de Tessália, na Grécia, e primeiro autor do artigo.
Em última análise, graças aos esforços extenuantes dos fuzileiros em réplicas de fatos Dendra, a equipa descobriu que a armadura não teria limitado a capacidade de combate de um guerreiro nem causado grande tensão no seu utilizador.
“Embora a Ilíada possa não fornecer uma representação exacta das táticas de combate dos guerreiros micénicos gregos, é sem dúvida o melhor relato que temos para trabalhar”, explica ao Live Science o investigador.
“O nosso estudo apoia a noção de que os micénicos tiveram um impacto tão poderoso no Mediterrâneo Oriental, pelo menos em parte, devido à sua tecnologia de armadura”, acrescenta Flouris.
“Também ajuda a esclarecer um dos pontos de viragem mais assustadores da história: o colapso das civilizações da Idade do Bronze do Mediterrâneo Oriental no final do 2º milénio a.C.; uma época de destruição e convulsão que marcou o início da Idade do Ferro”, conclui o investigador.