ZAP // Arquivos RTP; Depositphotos

A Portuguesa em versão acelerada: actor protagonizou momento muito polémico há quase 40 anos, num programa da RTP.
Os Anjos nunca foram um assunto tão frequente nas notícias, nas conversas. E já existem há mais de 25 anos. A sua interpretação original do hino nacional português não foi bem acolhido por muita gente.
Além disso, um vídeo publicado por Joana Marques originou um processo em tribunal, que está em andamento por estes dias.
Mas este não é o primeiro julgamento na Justiça portuguesa que envolve A Portuguesa.
Recuamos quase 40 anos e ao programa Fisga, emitido em directo pela RTP. O tema naquele dia 5 de Dezembro de 1987 era a noção de pátria e o que era “ser português”.
Um dos convidados foi João Grosso. O actor protagonizava a rubrica ‘Treta Semanal’ – e protagonizou um momento irreverente e polémico.
João estava a ter mais uma conversa descontraída com os jovens elementos da plateia no Cinema Europa. Desta vez sobre a pátria e sobre Portugal.
“A pátria é uma instituição solene e pesadíssima. (…) Ora, com uma pátria destas, não se pode chegar ao pé da bandeira nacional e pôr um penico em vez da esfera armilar”, dizia o actor.
Até que deixou um desafio ao público: “E que tal se a gente fizesse uma versão acelerada do hino nacional?”.
Desafiou e concretizou:
Pediu a todos os jovens presentes para baterem com os pés no chão, a fazerem um “ritmo muito mais acelerado”.
E cantou mesmo um hino acelerado, enquanto se ia mexendo muito e rindo para a câmara, numa versão inédita na televisão portuguesa.
Quando acabou: “Já viram a bronca? Já viram a bronca? Isto não se faz! Não se brinca com os símbolos nacionais!” – mas fez e brincou.
O Estado avançou com um processo criminal contra João Grosso, por ultraje a um símbolo nacional.
O julgamento aconteceu mesmo e só terminou cinco anos depois, em 1992. A Justiça decidiu a favor do actor: a liberdade artística prevaleceu sobre o direito à honra dos símbolos. Não faltou ao respeito à pátria ou ao hino nacional, anunciou o juiz.
“Ufa”, reagiu João Grosso, depois da última sessão do julgamento, enquanto sorria: “Depois desta carga de trabalhos toda, de andar não sei quantos anos com um processo à costas…”.
Mas avisou: “Mantenho a mesma boa disposição em relação a esse tipo de símbolos: não acho que sejam coisas do outro mundo que a gente tenha de arcar com elas com má cara, ou com… Acho que podemos rir com essas coisas também”.
Aquele foi o último episódio de Fisga. O programa foi suspenso.
Agredido, noutro contexto
Um ano e meio depois da famosa interpretação do hino, em 1989, João Grosso foi agredido por um grupo de skinheads.
Aconteceu à porta de um bar, do qual era sócio. Por volta das 3h da madrugada, meteu-se numa luta a defender um indiano que estava a ser espancado.
Ia entrar no seu carro quando viu 8 pessoas a cercar um jovem: “Um dos rapazinhos, que se gaba de ser um chefe de quina (eles gostam muito da Mocidade Portuguesa), estava à frente a espancar um puto de 17 ou 18 anos, sem defesa. Cheguei ao pé desse chefe de quina, dei um grito para ele parar com aquilo e sacudi-o dali para fora, do pé da criatura”.
“E pronto: caiu-me aquela gentalha toda em cima, prenderam-me o tronco, braços e cabeça; e pontapearam-me nessa situação. Fiquei sempre em pé, nunca fui ao chão”, relatou anos depois, na RTP.
Perdeu um testículo nesse dia.