Pirâmide “impossível” cai sempre na mesma face — e confirma teoria com 40 anos

Gergő Almádi

Bille é o primeiro tetraedro monoestável — uma pirâmide que cai sempre com a mesma face para baixo

O tetraedro, com os seus cantos pontiagudos e ângulos agudos pequenos nas suas quatro faces, foi sempre o objeto monoestável impossível de inventar. Até que um milagre da engenharia desfez essa impossibilidade.

Chama-se “Bille” e é o primeiro tetraedro monoestável alguma vez criado: uma forma piramidal com quatro faces triangulares que tem uma posição de repouso estável.

Isto significa que a bizarra pirâmide, independentemente da forma como o atiremos e como caia, voltará a ficar sempre exatamente com o mesmo lado para baixo.

Num artigo recentemente submetido ao arXiv, uma equipa de matemáticos revela o primeiro modelo físico de Bille, que confirma uma teoria proposta há décadas pelo conceituado matemático britânico John Conway.

Feito de fibra de carbono leve e carboneto de tungsténio denso, Bille é o resultado de uma série de decisões de engenharia ridiculamente sofisticadas—o que o torna tanto uma conquista tecnológica como matemática, diz o Gizmodo.

Não é surpreendente, portanto, que a sua propriedade de auto-reposicionamento tenha já algumas potenciais aplicações interessantes para a indústria espacial—que recentemente passou por dois acidentes com sondas lunares tombadas.

Na sua conjetura inicial, Conway supôs que um tetraedro com peso distribuído de forma desigual nas suas faces voltaria sempre para o mesmo lado, embora alguns anos mais tarde o próprio Conway tenha rejeitado a ideia.

Alguns matemáticos continuaram, no entanto, a tentar provar a teoria — incluindo Robert Dawson, um dos co-autores do estudo agora apresentado, que nos anos 1980 quase conseguiu provar que Conway estava certo usando um tetraedro feito com uma folha de chumbo e paus de bambu.

“Recordo-me que na altura quase funcionava devido ao momento angular, da mesma forma que se um carro passar por um obstáculo na estrada e já estiver em movimento, conseguirá ultrapassá-lo graças ao momento angular”, diz Dawson, matemático na Universidade Saint Mary’s no Canadá, ao Gizmodo.

Idealmente, o tetraedro monoestável não deveria precisar de outro impulso para voltar ao lado “base”.

Durante algum tempo, parecia que a teoria de Conway acabaria numa caixa de ideias matemáticas muito fixes mas improváveis — até há cerca de três anos, quando o matemático Gábor Domokos, da Universidade de Tecnologia e Economia de Budapeste, e o estudante de arquitetura Gergő Almádi, contactaram Dawson.

Domokos, especialista em problemas complicados de equilíbrio em geometria, já tinha descoberto o gömböc, um objeto arredondado que se equilibra apenas em dois pontos como um brinquedo “sempre-em-pé”, e que a Terra é feita de cubos.

Embora tenha sido uma descoberta impressionante, o gömböc, com o seu design essencialmente redondo e multi-facetado, apresenta condições relativamente fáceis para auto-equilibrio, explica Domokos ao Gizmodo.

Gábor Domokos

O matemático húngaro Gábor Domokos descobriu em 2006 o objeto monoestável “gömböc”

Quanto menos lados uma figura tem e quanto menores são os ângulos em cada lado, mais difícil é tornar essa figura monoestável, detalha o matemático.

Imaginemos um dado comum de seis lados. “Se for um dado justo, cairá em cada face com probabilidade igual“, explica Domokos.

Mesmo que alguém faça batota e modifique o dado, colocando algum peso extra em algumas superfícies, a probabilidade mudará ligeiramente, mas ainda deve ser possível que o dado fique em pé em todas as suas faces.

“Nesse sentido, o tetraedro, com os seus cantos pontiagudos e ângulos agudos pequenos nas suas quatro faces, torna-se o problema mais difícil, a categoria mais alta de formas em termos de monoestabilidade” — exceto se alguém desencantar algum tipo de milagre de engenharia.

Foi o que realmente aconteceu. Após derivar um modelo teórico para calcular as dimensões de Bille, Almádi procurou construir uma estrutura que, de alguma forma, tivesse um lado feito de “material realmente pesado, as partes mais leves quase ar, e um esqueleto quase vazio“, explica Domokos.

A equipa decidiu usar tubos de carbono para o esqueleto e, para a base, carboneto de tungsténio denso—uma liga metálica duas vezes mais pesada que o aço.

Mesmo depois de tudo isso, um problema permanecia: por alguma razão, Bille continuava a cair em dois lados diferentes, não apenas no lado pretendido.

“Então olhámos para ele, e havia uma pequena gota de cola que estava colada numa extremidade!” exclamou Domokos. Apesar das garantias do engenheiro-chefe de que não fazia diferença, Domokos insistiu em remover a pequena gota de cola—cuja densidade e forma também foram calculadas com precisão ridícula.

E assim foi: o Bille entrou para a história da matemática.

Os engenheiros desempenharam um papel enorme para tornar isto possível, realça Domokos. “Eles fizeram todos parte do processo de criação — a geometria, engenharia e design tecnológico. Todos precisavam de encaixar. Se retirares qualquer um destes, não funciona“.

ZAP //

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