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Nasceu no Alto Minho um tecido feito de bagaço de uva (mas “o sonho” está só a começar)

Soalheiro / Facebook

Vindima na Quinta do Soalheiro, em Melgaço.

A produtora de vinhos Soalheiro e a empresa têxtil Tintex, ambas instaladas no Alto Minho, criaram um tecido alternativo ao couro que é feito com algodão orgânico e bagaço de uva e que pode ser utilizado em produtos como vestuário e rótulos de garrafas.

“Além de aliar duas importantes indústrias portuguesas – têxtil e vinho – este tecido cumpre o objectivo de procurar soluções de economia circular, ou seja, de dar uma nova vida a resíduos vegetais que, de outra forma, seriam desperdício”, apontam os promotores do projecto à agência Lusa.

A Soalheiro produz vinhos Alvarinho e está instalada em Melgaço, enquanto a empresa de tingimento, acabamento e revestimento de malhas Tintex situa-se em Vila Nova de Cerveira. São cerca de meia centena de quilómetros de distância entre as duas empresas do distrito de Viana do Castelo que têm em comum a aposta na sustentabilidade e na inovação.

A ideia de aplicar os resíduos vegetais das uvas, resultantes das vindimas, no fabrico de um tecido alternativo ao couro surgiu há alguns meses numa visita à Quinta do Soalheiro feita pelo director de inovação da Tintex, Pedro Magalhães, que é um “apaixonado por vinhos”.

“Temos um resíduo que são os bagaços das uvas, que resultam da prensagem [extração do sumo que dá origem ao vinho]. Esses bagaços têm várias possibilidades de ser utilizados na indústria vitivinícola, mas a sua valorização não é significativa”, explica à Lusa o gestor e enólogo do Soalheiro, Luís Cerdeira.

“Então surgiu a ideia, com a Tintex, de fazer uma experiência e utilizar este resíduo vegetal (que no fundo são películas de uva) para revestir um tecido orgânico“, acrescenta Luís Cerdeira.

O sonho começa agora…

Desta experiência resultou a criação, há apenas alguns dias, do primeiro tecido de algodão orgânico com incorporação de uva, estando agora em aberto a sua utilização em diversos produtos e fins como um sucedâneo do couro.

“Agora é que é começa o sonho”, afirma Luís Cerdeira.

Já o diretor de inovação da Tintex diz esperar ter, “até à próxima vindima, diversos tipos de produtos” com o novo tecido incorporado, “seja em rótulo para garrafas ou em alguns tipos de vestuário“.

“As possibilidades são muitas e dependem dos nossos clientes, embora sempre em parceria connosco”, sustenta Pedro Magalhães.

Esta parceria entre as duas empresas surgiu no seguimento de um projeto em que a Tintex esteve envolvida – o TexBoost, para desenvolvimento de uma nova geração de soluções têxteis inovadoras.

Este projecto permitiu lançar a Tintex na produção de um substrato têxtil que pudesse ser considerado como uma alternativa ao couro incorporando, sobre uma malha de algodão, materiais como serrim e casca de pinheiro.

Neste âmbito, a empresa tem atualmente em submissão a patente de um “material têxtil alternativo ao couro fabricado a partir de subprodutos e resíduos de origem vegetal”, cujo pedido foi apresentado em Junho de 2016 e que espera ver concluído “num horizonte de três anos”.

“Já tivemos avaliações intercalares com resultado positivo, mas ainda falta muito tempo [para concluir o processo]. Mas como está feito o pedido internacional, a tecnologia e o know how já estão protegidos”, aponta director de inovação da Tintex.

A intenção é “entrar com este produto nos mercados europeu, norte-americano e, possivelmente, também no Brasil” e em sectores tão diversos como saúde, moda, marroquinaria, calçado ou mobiliário.

Tintex trabalha com gigantes da moda

A têxtil de Vila Nova de Cerveira é muito procurada por alguns gigantes da moda que procuram tecidos com menor impacto no meio ambiente, por exemplo, implicando menor consumo de água, utilização de matérias-primas naturais e tecidos biodegradáveis.

Atualmente, a Tintex trabalha com várias marcas, nomeadamente do Norte da Europa e escandinavas (como o é caso da COS, do grupo sueco H&M), e está “a tentar entrar também nos EUA”.

Com cerca de 130 trabalhadores, dos quais 10 dedicados exclusivamente a actividades de inovação, a Tintex investe cerca de um milhão de euros por ano em Investigação & Desenvolvimento (I&D) e prevê que o segmento dos têxteis técnicos venha a responder, no prazo de cinco anos, por 20% da facturação da empresa.

Em 2020, o volume de negócios da companhia ascendeu a 11 milhões de euros, mas o objectivo é atingir os 20 milhões em cinco anos, precisamente por via da aposta nos têxteis técnicos sustentáveis, com utilização de biopolímeros e de resíduos normalmente desvalorizados.

Vinhos Soalheiro vão ter selo vegan

Esta mesma aposta na inovação e na sustentabilidade tem vindo a ser feita pelo Soalheiro na produção dos seus vinhos. A empresa tem certificação biológica das suas vinhas desde 2006 e as uvas são usadas na produção de vinhos naturais, sem adição de sulfitos e com o mínimo de intervenção humana (sem filtração).

Em curso está a certificação de todos os seus vinhos com selo vegan, tendo instalado, no ano passado, uma cobertura vegetal na adega que permitirá uma poupança energética estimada de 26% ao ano.

Em 2021, o Soalheiro está a renovar toda a sua gama com uma garrafa sustentável, com menos 19% de vidro e com redução das emissões de carbono utilizadas na sua produção e transporte.

Feitas em Portugal (quando antes eram produzidas no centro da Europa), 90% das garrafas Soalheiro irão adoptar este novo formato até ao final do ano, o que permitirá uma poupança estimada de 56 toneladas de vidro ao ano.

Adicionalmente, também as embalagens usadas pela empresa foram repensadas para reduzir 39% do consumo de cartão, oriundo de florestas geridas de modo responsável (certificado FSC).

ZAP // Lusa

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