A Lua está a tornar os dias na Terra mais longos

NASA

Earthrise 1968, o Nascer da Terra visto da Lua pela missão Apollo 8

Ao longo da história humana, a Lua sempre foi uma presença misteriosa e inseparável sobre a Terra. A sua suave força gravitacional define o ritmo das marés e sua pálida luz ilumina os rituais nupciais noturnos de muitas espécies.

Civilizações inteiras definiram os seus calendários pela Lua, à medida que surgia e desaparecia. Alguns animais usam a luz do Sol refletida na superfície da Lua para ajudar na sua orientação.

Algumas teorias afirmam mesmo que a Lua pode ter ajudado a criar as condições que permitiram a vida no nosso planeta e até a dar início à vida na Terra, desde o primeiro instante.

Também se acredita que a sua órbita excêntrica à volta do nosso planeta influencie alguns dos importantes sistemas meteorológicos que dominam a nossa vida hoje em dia.

Mas a Lua está também a afastar-se de nós.

A cada volta do seu balett espacial extraordinariamente equilibrado em volta da Terra, em círculos, mas sempre sem piruetas (o que explica porque vemos sempre o mesmo lado da Lua), ela vai está gradualmente a afastar-se do nosso planeta, num processo conhecido como “recessão lunar”.

Disparando lasers em direção a refletores instalados na superfície lunar pelos astronautas da missão Apolo, cientistas conseguiram recentemente medir com absoluta precisão a velocidade exata de afastamento da Lua:  3,8 cm por ano.

Esta experiência foi aliás eternizada na televisão, no episódio “Lunar Excitation” da série The Big Bang Theory, no qual os personagens disparam um raio laser à Lua a partir do seu telhado.

E, à medida que isso acontece, os nossos dias vão ficando cada vez mais longos.

É tudo questão de marés”, afirma David Waltham, professor de geofísica da Universidade de Londres Royal Holloway, que estuda a relação entre a Lua e a Terra. “A força da maré na Terra reduz a sua rotação e a Lua recebe essa energia sob a forma de um impulso angular”.

Basicamente, à medida que a Terra gira, a gravidade da Lua em órbita do nosso planeta impulsiona os oceanos para criar as maré alta e a maré baixa. Essas marés, na verdade, são “volumes” de água que se estendem em forma elíptica, contra ou a favor da gravidade da Lua.

Mas a Terra gira sobre o seu eixo a uma velocidade muito maior que a órbita da Lua, o que significa que a fricção das bacias oceânicas em movimento no nosso planeta também arrasta a água com ela. Assim, o volume de água move-se levemente à frente da Lua na sua órbita, que tenta puxá-la de volta.

Este processo suga lentamente a energia de rotação do nosso planeta, reduzindo sua velocidade, enquanto a Lua ganha energia, fazendo com que ela se mova para uma órbita mais alta.

Segundo algumas estimativas, esta redução contínua da velocidade de rotação do nosso planeta significa que a duração do dia médio na Terra aumentou em cerca de 1,09 milissegundos por século desde o final dos anos 1600.

Mas, ao longo dos 4,5 mil milhões de anos de história do planeta, a mudança acumulada é muito significativa. Acredita-se que a Lua se tenha formado cerca de 50 milhões de anos após o nascimento do Sistema Solar.

Segundo a teoria mais aceite atualmente, uma colisão entre a Terra em formação e um objeto com o tamanho aproximado de Marte, conhecido como Theia, tenha arrancado um pedaço de material e fragmentos que se agregaram para formar o que hoje chamamos de Lua.

Distância maior e dias mais longos

O que fica claro a partir de dados geológicos preservados em faixas rochosas na Terra é que a Lua já esteve muito mais perto da Terra no passado.

Atualmente, a Lua encontra-se a 384.400 km da Terra. Mas um estudo recente indica que, há cerca de 3,2 mil milhões de anos, quando as placas tectónicas da Terra começavam a mover-se e micro-organismos oceânicos estavam a devorar azoto, estava a apenas 270.000 km — cerca de 70% da sua distância atual.

“A rotação mais rápida da Terra reduziu a duração do dia, de forma que num período de 24 horas, o Sol nascia e punha-se duas vezes, não apenas uma, como acontece hoje”, explica o geofísico Tom Eulenfeld, que liderou o estudo da Universidade Friedrich Schiller em Jena, na Alemanha.

“Isso pode ter reduzido a diferença de temperatura entre o dia e a noite, e afetado a bioquímica dos organismos fotossintéticos”, explica Eulenfeld.

O estudo revela ainda que a velocidade da recessão lunar não é constante – já aumentou e diminuiu ao longo do tempo.

Um outro estudo, da geóloga Vanina López de Azarevich, da Universidade Nacional de Salta, na Argentina, indica que, há cerca de 550 a 625 milhões de anos, a Lua estaria a afastar-se a 7 cm por ano.

“A velocidade a que a Lua se afasta da Terra mudou definitivamente ao longo do tempo e irá mudar no futuro”, afirma Eulenfeld. Mas, durante grande parte da história, a Lua afastou-se em velocidade muito menor que a atual.

Na realidade, vivemos atualmente num período em que a velocidade de recessão é anormalmente alta. A Lua precisaria ter de se ter afastado à sua velocidade atual durante apenas 1,5 mil milhões de anos para atingir a posição em que se encontra hoje.

“A força das marés, atualmente, é três vezes maior do que o esperado”, afirma Waltham. O motivo pode ser o tamanho do Oceano Atlântico.

A configuração atual dos continentes faz com que a bacia do Atlântico Norte casualmente tenha as proporções exatas para gerar um efeito de ressonância, de forma que a sua água se movimente de um lado para o outro a uma velocidade próxima da das marés.

Waltham explica que é como empurrar uma criança no baloiço: chegará mais alto se cada impulso for coordenado com o movimento anterior.

Se o Atlântico Norte fosse um pouco mais largo ou mais estreito, isso não aconteceria”, afirma Waltham. “Os modelos parecem mostrar que, há alguns milhões de anos, a força das marés era menor porque os continentes estavam em posições diferentes.”

Podemos então esperar que, um dia, a Terra não tenha a sua Lua? Mesmo à velocidade atual de afastamento, não é provável que a Lua chegue a abandonar totalmente a Terra.

O trágico fim do Sol provavelmente ocorrerá muito antes, daqui a cerca de 5 a 10 mil milhões de anos. E a humanidade provavelmente terá sido extinta muito antes disso.

ZAP // BBC

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