Nos 20 anos desde que o filme “Parque Jurássico” fantasiou sobre como os dinossauros poderiam ser clonados a partir do sangue encontrado em mosquitos presos em âmbar, os coleccionadores de fósseis não descansaram à procura de um espécime semelhante.
Ao longo destes anos, alguns grupos de paleontólogos afirmaram ter encontrado um mosquito fossilizado com sangue preso no abdómen, mas todas as descobertas acabaram por recelar-se o resultado de erro ou contaminação.
Agora, foi anunciado que há finalmente um espécime: um mosquito cheio de sangue. preservado em xisto durante cerca de 46 milhões de anos no noroeste de Montana, nos EUA.
E qual é a coisa mais surpreendente acerca da descoberta?
É que foi feita há três décadas, por um caçador de fósseis amador – um estudante de doutoramento em Geologia chamado Kurt Constenius – e esteve abandonada num sótão até agora.
Só recentemente o espécime foi reconhecido pelo bioquímico Dale Greenwalt, que se tem dedicado a recolher fósseis para o Museu Smithsonian de História Natural.
O espécime, descrito num artigo que Greenwalt publicou com investigadores do Smithsonian e com o entomologista Ralph Harbach na revista Proceedings da Academia Nacional de Ciências dos EUA, encontra-se preservado preso em pedra, não âmbar,
E, infelizmente para os entusiastas do clássico de Steve Spielberg, não é suficientemente velho para ter sangue de dinossauro.
Fóssil descoberto por acaso
Certo dia, Greenwalt conheceu a família de Constenius, e quando lhes descreveu o seu trabalho, a família decidiu doar sua coleção de fósseis para ao Smithsonian.
O bioquímico começou a catalogar as caixas dos fósseis e, quando se deparou com este espécime em particular, soube imediatamente que era diferente.
Greenwalt suspeitou que o abdómen escuro e opaco do mosquito, preso num pequeno pedaço de xisto, poderia conter sangue com 46 milhões de anos de idade.
A equipa de Ciências Minerais do laboratório do museu usou uma série de técnicas para analisar a amostra a fundo, incluindo espectroscopia de raios-X.
“A primeira coisa que descobrimos é que o abdómen está cheio de ferro, que é o que se esperaria de sangue”, explica Greenwalt ao Smithsonian.
Além disso, a análise utilizou um espectrómetro de massa de iões secundários, que revelou a presença de heme, o composto que dá aos glóbulos vermelhos sua cor distinta e lhes permite transportar oxigénio por todo o corpo.
Outros testes mostraram a ausência destes compostos em outras partes do fóssil.
Os resultados serviram como prova definitiva de que o sangue tinha sido preservado dentro do insecto.
Mas, neste ponto, os cientistas não têm nenhuma forma de saber a que criatura pertence o sangue – isto porque o DNA se degrada demasiado depressa para sobreviver depois de estar 46 milhões de anos preso em pedra (ou mesmo em âmbar).
Um estudo recente mostrou que o DNA do sangue, mesmo em condições ideais, tem uma meia-vida de cerca de 521 anos, isto é, uma determinada quantidade de sangue leva 521 anos a perder metade do seu DNA.
Nada de “Parque Jurássico”
Isto significa que, mesmo que milagrosamente houvesse algum DNA de uma criatura antiga no fóssil, há ainda uma tonelada de problemas técnicos que impedem uma clonagem semelhante à de “Parque Jurássico”.
Para montar um genoma completo a partir de fragmentos de DNA, precisamos de ter conhecimento de todo o seu genoma – o que não temos, neste caso.
Em seguida, para o transformar num animal vivo, seria necessário colocar esse DNA num óvulo de uma espécie viva muito intimamente relacionada com a criatura misteriosa – que, antes de mais, neste caso nem sabemos qual é.
Então, infelizmente, não será graças a esta nova descoberta que poderemos ver criaturas antigas ressuscitadas a passear por aí .
Ainda assim, o achado é cientificamente significativo, e vai ajudar os cientistas a entender melhor a evolução dos insectos que se alimentam de sangue.
Até agora, a coisa mais próxima de um mosquito cheio de sangue que tinha sido encontrada era um mosquito com restos do parasita da malária dentro do seu abdómen.
Embora esse fóssil tenha fornecido provas indirectas de que os mosquitos já se alimentavam de sangue há cerca de 15 a 20 milhões de anos atrás, esta nova descoberta representa a mais antiga prova directa do comportamento dos sugadores de sangue.
A descoberta mostra também, pela primeira vez, que as moléculas biológicas como o heme podem sobreviver num fóssil.
ZAP / HypeScience