Bolsonaro e mais 3: metade dos presidentes do Brasil pós-ditadura militar foram presos

Tânia Rêgo / Agência Brasil

Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil

Recente decisão contra Bolsonaro assinala a quarta prisão de um ex-presidente do Brasil desde 1985. Por outro lado, só outros quatro não foram presos. Recorde as sagas judiciais e as decisões que motivaram as detenções.

Jair Bolsonaro tornou-se na terça-feira o quarto ex-presidente do Brasil a ser preso desde a redemocratização em 1985. A prisão domiciliária foi decretada pelo juiz Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após o ex-presidente ter violado medidas cautelares impostas no âmbito do julgamento da tentativa de golpe de Estado.

Nos últimos quarenta anos, os ex-presidentes Fernando Collor de Mello, Luiz Inácio Lula da Silva (antes de ser reeleito para um terceiro mandato) e Michel Temer também foram detidos, em diferentes circunstâncias e por diferentes motivos. Desses, apenas Collor cumpre atualmente pena. Desde maio, encontra-se em prisão domiciliária.

Por outro lado, há quatro ex-presidentes que não foram detidos desde o fim da ditadura militar: Dilma Rousseff, Fernando Henrique Cardoso, Itamar Franco e José Sarney.

Dilma foi presa e torturada pela ditadura nos anos 1970. A dirigente do Partido dos Trabalhadores foi amnistiada em maio deste ano por decisão unânime da Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Recordemos as sagas judiciais enfrentadas pelos antigos chefes de Estado e os motivos das suas detenções.

Jair Bolsonaro, em 2025

Um dos principais arguidos no julgamento da tentativa de golpe de 2022-2023, o ex-presidente foi detido esta semana após ter violado medidas cautelares, através da divulgação de mensagens em perfis de redes sociais de aliados, no último domingo. Tinha-lhe sido proibido o uso das redes sociais e a transmissão de áudios ou vídeos, mesmo que por intermédio de terceiros.

Um dia antes de ser detido, Bolsonaro, que liderou o Executivo entre 2019 e 2022, fez um breve discurso a apoiantes reunidos num ato bolsonarista em Copacabana, no Rio de Janeiro, através de uma chamada telefónica com o seu filho, o senador Flávio Bolsonaro. Participou também numa videochamada com o deputado federal Nikolas Ferreira em São Paulo.

Outras mensagens relacionadas com o ex-presidente foram publicadas ao longo do domingo nos perfis de Carlos e Eduardo Bolsonaro, também seus filhos e parlamentares. Manifestações bolsonaristas decorriam em várias capitais nesse dia.

Segundo Moraes, as publicações continham “conteúdo claro de incentivo e incitamento a ataques ao Supremo Tribunal Federal e apoio ostensivo à intervenção estrangeira no Poder Judiciário brasileiro”.

Em prisão domiciliária, Bolsonaro está agora impedido de receber visitas, com exceção dos seus advogados ou familiares autorizados pelo STF. O seu telemóvel foi apreendido pela Polícia Federal e está proibido de aceder a outros dispositivos.

O ex-presidente enfrenta acusações que, somadas, poderão resultar numa pena superior a 40 anos de prisão.

Fernando Collor de Mello, em 2023

Valter Campanato / Agência Brasil

O ex-presidente do Brasil Fernando Collor de Melo

Presidente entre 1990 e 1992, Collor foi condenado pelo STF em maio de 2023, num processo originado na Operação Lava Jato. Segundo os magistrados, o ex-presidente, posteriormente eleito senador, terá feito nomeações políticas para a BR Distribuidora, então subsidiária da Petrobras, enquanto dirigente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

Terá recebido 20 milhões de reais em vantagens indevidas em contratos da empresa, entre 2010 e 2014. Com os recursos da defesa rejeitados, foi levado em abril para um estabelecimento prisional em Maceió, no estado de Alagoas, para cumprir uma pena de 8 anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e branqueamento de capitais.

No entanto, seis dias depois, em maio, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, emitiu parecer favorável a um pedido de prisão domiciliária, passando o ex-presidente a cumprir pena em casa. A defesa alegou que Collor, de 75 anos, sofre de problemas crónicos de saúde, incluindo doença de Parkinson, perturbação afetiva bipolar e apneia do sono. Encontra-se agora com pulseira eletrónica e só pode receber visitas dos seus advogados.

Michel Temer, em 2019

Beto Barata / PR

Michel Temer

Em março de 2019, Temer teve a prisão preventiva decretada por ordem do juiz federal Marcelo Bretas. A decisão ocorreu no âmbito da Operação Descontaminação, que investigava crimes de cartel, corrupção ativa e passiva, branqueamento de capitais e fraudes em concursos públicos relacionados com a construção da central nuclear Angra 3.

Foi libertado quatro dias depois e, em maio, voltou à prisão por mais seis dias. A libertação foi decidida pela Sexta Turma do STJ, com o argumento de que não havia delito recente que justificasse a medida de coação.

Temer e o coronel João Baptista Lima, apontado como seu operador financeiro, foram acusados de desvios na construção da unidade de produção de energia, no valor de 1,6 mil milhões de reais, resultantes de diferentes esquemas.

O ex-presidente foi acusado de corrupção passiva, peculato e branqueamento de capitais. Havia outros 11 arguidos no processo.

A acusação que levou à sua prisão seria anulada pelo Tribunal Regional Federal da 1.ª Região em 2023.

Tendo ocupado a Presidência entre maio de 2016 — após o impeachment de Dilma — e o final de 2018, Temer foi alvo de diversos inquéritos. Nunca chegou a ser condenado e, por isso, permanece em liberdade.

Lula, em 2018

Num caso que se tornou um marco político e jurídico no Brasil, o atual presidente foi detido em abril de 2018 e permaneceu 580 noites preso na sede da Polícia Federal em Curitiba, até Novembro de 2019. Na altura, enquanto ex-presidente, havia sido condenado em segunda instância a 12 anos e um mês de prisão por corrupção e branqueamento de capitais, no processo do apartamento triplex do Condomínio Solaris, no Guarujá (SP).

Lula foi o primeiro ex-presidente brasileiro a ser preso por um crime comum. A primeira sentença foi proferida em Julho de 2017 pelo então juiz federal Sergio Moro, e seria depois confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), que ainda agravaria a pena para 12 anos e 1 mês de prisão.

A Justiça considerou que Lula recebera vantagem indevida da construtora OAS, no valor de 3,7 milhões de reais, na compra e reforma do imóvel, e ocultara ser o real proprietário. A empreiteira teria realizado obras no apartamento como pagamento de subornos, após o petista alegadamente a ter favorecido em contratos com a Petrobras.

Após um ano e sete meses de prisão, Lula foi libertado depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter revogado, por seis votos contra cinco, a possibilidade de início do cumprimento da pena antes de esgotados todos os recursos. À data, ainda aguardava decisão de recursos no STJ e no STF.

Dois anos depois, em 2021, o STF confirmaria a anulação das condenações de Lula nos casos do triplex e de outros dois, argumentando que não se enquadravam no âmbito da Operação Lava Jato e, por isso, não eram da competência da 13.ª Vara da Justiça Federal de Curitiba (PR), que o condenara em primeira instância.

Vinte dias depois, a Segunda Turma do Supremo decidiu ainda que Moro agira com parcialidade no julgamento de Lula, motivo pelo qual o processo deveria recomeçar do zero.

Assim, Lula pôde candidatar-se nas eleições de 2022, vencendo o seu terceiro mandato, iniciado em Janeiro de 2023. Já tinha exercido a Presidência entre 2003 e 2010.

// DW

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