A Índia tem uma aldeia onde se plantam 111 árvores por cada menina que nasce

Após a morte da sua filha, o chefe da aldeia indiana de Piplantri declarou que cada rapariga recém-nascida teria uma árvore plantada em sua honra. E, sem contar, ‘plantou as sementes’ de uma revolução cultural, ambiental e política.

Na aldeia indiana de Piplantria, a vida das raparigas é celebrada de uma forma muito peculiar, com a plantação de 111 árvores por cada menina que nasce.

É, precisamente, através das árvores que o líder da aldeia, Shyam Sunder Paliwal, conhece o seu caminho.

Todas as noites, vai na sua mota para ver uma árvore em particular, uma flor de burro, que simboliza o amor sublime. Paliwal abraça a árvore, encosta-lhe a cabeça e de olhos fechados diz: “Isto é da minha filha”.

A história é relatada pelo The Guardian.

Kiran, a filha de Paliwal, morreu em 2006, com apenas 16 anos.

Foi aí que o líder decidiu plantar aquela árvore em sua honra. Paliwal prometeu que não haveria mais lamentações quando nascesse uma rapariga. A partir dali, o nascimento de uma menina seria celebrado com a plantação de 111 árvores.

Como chefe eleito da aldeia (sarpanch, na língua nativa), a sua palavra e paixão tinham peso – e, assim, nasceu uma tradição.

Desde 2006, quando nasce uma bebé, as novas mães estendem um tecido vermelho dentro de um grande cesto de vime. Deitam as suas filhas lá dentro e levam-nas para o local onde vão ser plantadas as novas árvores.

Revolução cultural, ambiental e política

Piplantri, construída sobre uma colina, situa-se nas terras semi-áridas do distrito de Rajsamand, no estado indiano do Rajastão, junto ao Paquistão.

Se olharmos para a paisagem ondulante por baixo da aldeia, veremos um tapete de verde. Mas em sempre foi assim. “Em 2005, a seca era tão grave que o governo teve de nos enviar comboios de água”, recorda Paliwal, ao The Guardian

A mudança começou com a árvore de Kiran. Paliwal foi muito além da plantação desse dia especial. Continuou a plantar árvores ao longo do ano e instou os outros aldeões a fazerem o mesmo. Colocaram tubos para levar água às mudas, espalhadas por todo o lado. No total, foram plantadas 350.000 árvores.

“Com isto, estamos a fazer duas coisas: mostrar alegria pela chegada de uma filha e honrar a terra onde os meus antepassados viveram e morreram”, disse Paliwal.

Juntamente com as árvores, são recolhidos donativos sempre que nasce uma rapariga. “Dá segurança financeira à família. Em troca, comprometem-se a cuidar das árvores, a mandá-las para a escola e a não as casar antes da idade legal de 18 anos”, explica Paliwal.

Paliwal conta que está sempre em movimento. Percorre, todos os dias, a sua aldeia de mota, para ver se as raparigas vão à escola e se as plantas estão a ser tratadas, assegurando que a recolha de água da chuva que iniciou está a funcionar.

Nos momentos mais calmos, senta-se à sombra do viveiro de árvores, a cortar cabaças para as galinhas bicarem.

Questionado sobre a fonte da sua energia e motivação para viver, Paliwal disse, emocionado: “Tudo o que faço é pela memória da minha filha”.

Onde entra a política?

Mas isto chega a ser uma revolução política: o governo do Rajastão tem tentado combater o infanticídio feminino desde os vergonhosos rácios entre os sexos registados no censo de 2011 e inspirou-se em Paliwal.

Pankaj Gaur, médico-chefe do distrito e responsável pela saúde, disse, ao jornal britânico que a missão de Paliwal de fazer de Piplantri uma aldeia modelo inspirou uma política governamental de 2016 que concede benefícios escalonados ao longo da vida de uma rapariga.

Segundo o The Guardian, a família recebe 2.500 rupias (25€) aquando do seu nascimento e o mesmo montante no seu primeiro aniversário. O valor duplica para 5.000 rupias (50€) se ela terminar a quinta e a oitava classes. Quando as raparigas terminam a 12ª classe, recebem 35.000 rupias (347€), perfazendo um total de 50.000 rupias (496€).

Miguel Esteves, ZAP //

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