É no mínimo estranho para quem não está a par do caso. Então as temperaturas estão a aumentar em todo o mundo, mas a Antártida acabou 2023 com mais gelo? Como assim?
Os pinguins e o seu cocó — ou melhor, o guano — podem estar a ajudar a região e a protegê-la contra as alterações climática, mostra um estudo publicado na Communications Earth & Environment.
O estudo sugere que o amoníaco emitido pelos pinguins-de-Adélia está a contribuir para o aumento da formação de nuvens e assim para a regulação do clima da zona.
Os investigadores descobriram-no perto da Base Marambio. A equipa, liderada por Matthew Boyer e Mikko Sipilä, analisou as correntes de ar vindas de uma grande colónia de cerca de 60.000 pinguins-de-Adélia, situada a aproximadamente 8 quilómetros da base. Verificaram que, quando o vento soprava na direção da colónia, os níveis de amoníaco no ar aumentavam consideravelmente — mais de 1.000 vezes o valor de base, segundo o SciTechDaily.
Este amoníaco, libertado pelas fezes dos pinguins, reage com gases que contêm enxofre para formar aerossóis. Estas minúsculas partículas atmosféricas funcionam como núcleos de condensação para o vapor de água, facilitando a formação de nuvens — que podem refletir a radiação solar e atuar como uma camada isolante, influenciando, assim, as temperaturas locais e a extensão do gelo marinho.
Mesmo após a migração dos pinguins, no final de fevereiro, os níveis de amoníaco continuaram a ser mais de 100 vezes superiores aos normais. Outras medições confirmaram um aumento acentuado na concentração de partículas de aerossóis quando o vento vinha da direção da colónia. Cerca de três horas após estas elevações, os investigadores observaram a formação de nevoeiro — provavelmente causada pelo aumento da concentração de aerossóis.
E de facto, dados recentes de satélites da NASA revelam que a Antártida registou um aumento de gelo entre 2021 e 2023.
No entanto, os cientistas da Universidade de Tongji, em Xangai, alertam que este aumento é uma anomalia temporária e não um sinal de que as alterações climáticas estejam a reverter.
O ganho de gelo, que teve uma média de cerca de 108 mil milhões de toneladas métricas por ano durante o período de três anos, é atribuído a um pico anómalo de precipitação — sobretudo queda de neve — em algumas zonas do continente.
Apesar da breve recuperação, a tendência geral desde o início da monitorização por satélite em 2002 continua a ser de perda acelerada de gelo. Entre 2002 e 2020, a Antártida perdeu centenas de mil milhões de toneladas de gelo, com as perdas anuais a aumentarem de forma significativa durante a década de 2010. Este ganho temporário pouco faz para compensar estas perdas de longo prazo.
Quatro glaciares no leste da Antártida inverteram temporariamente as suas tendências de perda, registando ganhos significativos de massa. No entanto, esta inversão coincidiu com uma anomalia extrema de precipitação e parece já ter abrandado, com os níveis de gelo em 2025 a regressarem a valores semelhantes aos registados em 2020.
Portanto, não é certo se o guano de pinguim está a salvar o continente, mas está pelo menos a ajudar a causa.