Tiago Petinga / Lusa

Vários temas, um PS “sem ambição” e um governo que “é um embuste”. Um duelo mais voltado para o que está mal e menos para o que se pode fazer bem resultou num diálogo insonso e numa tentativa constante de atirar suavemente o adversário à parede. Afinal, quem anda a “gozar com quem trabalha”?
No debate que pôs frente a frente esta quarta feira o primeiro-ministro Luís Montenegro e o líder do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, foram 10 os temas discutidos num debate “murcho” mas realista, com poucas abordagens práticas, e onde houve até referências a economistas europeus e modelos de análise.
Assistimos a um Pedro Nuno Santos mais incisivo e direto, sem contornar tanto as perguntas dos jornalistas como o foi fazendo o adversário, mas a um Luís Montenegro mais confiante e mias capaz de desacreditar o oponente.
Apagão e ação
O tema “quente” da semana abriu o debate, com Luís Montenegro a defender a ação tomada pelo governo, que, diz, , “resultou tanto que tivemos zero mortes ao contrário do que aconteceu em Espanha”. Afirmou que até o país vizinho louvou a ação do governo português, que mostrou “autonomia, tivemos um bom resultado, com colaboração de empresas privadas e tivemos, sobretudo, a maturidade cívica dos portugueses”.
Já Pedro Nuno Santos afirma que teria feito um trabalho diferente. “Não vimos a ministra da Administração Interna”, atirou. “Se fosse primeiro-ministro, a primeira coisa que tinha feito era convocar o Sistema de Segurança Interna“, afirmou. O primeiro-ministro afirmou que o adversário “não tem autoridade moral” para lhe atirar acusações, expressão que aliás foi sendo repetida ao longo do debate.
Crescimento e empresas
No âmbito económico, os dois partidos não se entendem nas prioridades. O líder da oposição começou por acusar o programa do adversário de ser “um embuste”, com uma perspetiva irrealista de crescimento económico.
Nesta matéria, até houve alguma discussão técnica, e medidas concretas. O PS “opta por diminuir impostos”, e defende o modelo económico do economista italiano Mario Draghi, argumenta Pedro Nuno, enquanto Montenegro aponta que as “medidas do PS são apenas de distribuição, não modificam nada”. Afirma que o programa do PS é “pouco ambicioso” e é por isso que não prevê o crescimento económico que a AD estima.
“Superámos todas as previsões”, argumentou o primeiro-ministro. “Tivemos uma diminuição da receita de IRS – de mil milhões — mas IRC subiu, pessoas a pagar menos, empresas a contribuir mais — não políticas públicas, de transformação que geram mais capacidade de criar riqueza”.
Foi neste tópico que os ânimos mais se exaltaram, com Pedro Nuno a atirar: “Não falta ambição ao programa do PS, falta vergonha ao programa da AD”, e Montenegro a responder que “o senhor não está preparado para argumentar”.
SNS e médicos
Neste tópico, ambos os políticos tentaram convencer o eleitorado de que o outro fez pior, procurando desacreditar as medidas do adversário.
Luís Montenegro insistiu que a saúde foi resgatada pelo governo da AD. “Acusar-me de ter falhado é de facto uma coisa espantosa. Falhei quando em 11 meses fiz acordo que PS não fez em oito anos?”. Relembrou acordos com médicos, mais celeridade nas urgências e que “o SNS está a diminuir prazos”. Referiu que as PP trazem melhorias ao setor.
Mas Pedro Nuno Santos vê outro cenário: “a aposta no setor privado fracassou”, disparou. “Prefiro dar mais autonomia e flexibilidade de gestão ao nossos hospitais, sem os termos de entregar à gestão de privados”.
Spinumviva e a crise no governo
“Nós estamos aqui sobretudo para falar sobre o problema dos portugueses”, respondeu Pedro Nuno Santos à jornalista Clara de Sousa assim que o caso Spinumviva foi trazido para cima de mesa. “Mas não podemos ignorar” a situação, assume.
Neste tópico, o líder da oposição tinha a oportunidade para encostar o primeiro-ministro à parede, atirando-lhe as responsabilidades da crise política. No entanto, foi pouco incisivo, despejando factos e acusações sobre a Spinumviva, e não tanto sobre a atitude posterior do primeiro-ministro.
Mas ainda houve lugar para algumas achas atiradas para a fogueiras: “é gozar com quem trabalha” apresentar uma nova declaração horas antes do debate. “Não podia nunca ter continuado com a sua empresa depois de ter assumido funções”.
Sistema de pensões sem alteração
No que toca a pensões, “aumentámos para todos”, assegura Montenegro, defendendo sempre o papel do governo em todas as matérias. “Acredito que demos todas as razões para que pensionistas confiem mais no nosso projeto do que no do PS. Aumentámos pensões de acordo com critérios da lei”, argumentou o primeiro-ministro.
Já Pedro Nuno, acusou o adversário de querer privatizar o sistema de pensões. “Será uma das nossas primeiras decisões extinguir o grupo de trabalho para a privatização das pensões”, afirmou. “Não vamos fazer nenhuma alteração ao sistema de segurança social“, ripostou Montenegro.
Habitação, construção e competência
“Chegámos ao Governo e havia um plano de 26 mil novas habitações mas não havia dinheiro” que “não correspondiam às candidaturas das autarquias”. Com financiamento do PRR e do Orçamento de Estado, o governo passou de “26 para 59 mil casas”, mas ressalva que estas mudanças “não produzem efeito imediato”.
“O Governo foi incompetente na gestão dos apoios ao arrendamento”, atirou Pedro Nuno Santos.
Mas numa coisa os dois políticos parecem concordar: ainda que sejam necessários “os incentivos do lado da procura como fizemos com os jovens — que passaram a ter acesso a 100% de financiamento bancário”, falta também “mais construção para baixar o preço“, defendeu Montenegro. “O que temos de fazer é intensificar a construção”, afirma também o líder do PS.
Cenários de governação
Sobre a viabilização de um possível orçamento de Estado da direita, Pedro Nuno responde que “todos os esforços para dialogar e criar condições de governabilidade para haver um governo que represente uma mudança segura”. “Tudo faremos para ter a estabilidade política que, infelizmente, Luís Montenegro já não consegue dar ao país”, disse ainda.
Já Montenegro rejeita um cenário onde a AD não vença, e deixa ainda a farpa de que o “governo caiu por tática política”. Continua “firme no propósito de estar focado nos problemas das pessoas, estabilidade é aquilo que os portugueses vão decidir no próximo dia 18 de maio”.