Elon Musk está a desmantelar a NOAA, que prevê todos os dados meteorológicos, avisa sobre furacões e tsunamis e responde a derrames de petróleo. Até os GPS podem ser afetados pelos novos “trovões” de Trump.
A administração Trump, através da sua nova equipa de Elon Musk, o DOGE, está com pressa para remodelar o governo federal dos EUA. Dias depois de o dono da Tesla dizer que a Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAID) deve “morrer”, os dois bilionários terão começado a ‘lançar os seus trovões’ sobre a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA, sigla em inglês).
De acordo com fontes da CBS News, a equipa de Musk infiltrou-se nos escritórios da NOAA e começou a dar instruções ao seu pessoal para cessar a comunicação com cidadãos estrangeiros, o que, segundo alertam entidades ligadas ao setor, pode vir a representar um ameaça direta à previsão meteorológica, conservação da vida marinha e proteção ambiental não só dos EUA, mas também à colaboração global da agência em trabalhos científicos críticos para a manutenção do planeta.
Olhando para o conservador Projeto 2025 da administração Trump, a agência, que tem um papel fundamental, por exemplo, na partilha internacional de dados e na gestão das pescas, enfrenta agora cortes drásticos no pessoal e no financiamento (mais precisamente, uma redução de 50% do pessoal e cortes orçamentais de 30%, segundo antigos funcionários da NOOA).
O guia da nova administração Trump é claro: a NOAA é para “acabar”, devido ao seu papel como “um dos principais motores” naquilo a que chama a “indústria do alarme das alterações climáticas”, sendo por isso “prejudicial para a futura prosperidade dos EUA”.
O documento de 900 páginas recomenda o “desmantelamento” da agência e a “eliminação de muitas das suas funções”. A solução passa por privatizar as funções da NOAA, o que seria prejudicial, embora a maioria das pessoas possa não perceber agora a dimensão da importância da NOAA, explicam os especialistas.
A NOOA “salva vidas”. Por que é tão importante?
Quando as funções da NOAA “começarem a desmoronar-se ou a degradar-se aperceber-nos-emos rapidamente”, avisa, ao Fast Company, Jeff Watters, vice-presidente de assuntos externos da Ocean Conservancy, lembrando que é a NOAA que fornece todos os dados meteorológicos.
A agência supervisiona o Serviço Nacional de Meteorologia, que leva as previsões a todo o país, e o Centro Nacional de Furacões, que emite avisos críticos para tempestades tropicais e furacões, e fornece previsões meteorológicas espaciais relacionadas, por exemplo, com a atividade solar, que pode afetar os sistemas GPS.
É a agência, também, que prevê eventos climáticos extremos, como furacões ou tsunamis. “Podemos estar a enfrentar um potencial tsunami e não termos a previsão de que ele nos vai atingir”.
A ação da NOAA estende-se para lá da previsão do tempo: também tem mão na gestão ambiental, sendo responsável pela gestão dos santuários marinhos e dos recifes de coral, cada vez mais ameaçados pelas alterações climáticas.
A agência também gere uma rede que responde a mamíferos marinhos encalhados que reabilita animais como golfinhos, baleias, focas e leões marinhos.
O trabalho ambiental da NOAA estende-se ao combate à poluição de plástico nos oceanos, onde colabora com organizações como a Ocean Conservancy.
Outra função crucial é o papel da NOAA na resposta a derrames de petróleo. Os modelos da agência ajudam a prever o movimento do petróleo e auxiliam nos esforços de recuperação, sendo um recurso fundamental para as comunidades costeiras afetadas por derrames. Nas últimas três décadas, a NOAA recuperou mais de 10 mil milhões de dólares das empresas responsáveis por estas catástrofes.
Com uma eventual privatização, as empresas meteorológicas privadas não iriam querer assumir o encargo financeiro de recolher dados meteorológicos que atualmente são fornecidos gratuitamente pela NOAA, avisam os críticos. A falta da NOAA fazer-se-ia sentir mais em zonas remotas como o Alasca, onde seria pouco provável que as privadas investissem.
“O trabalho crítico da NOAA salva vidas. A minha equipa e eu estamos a investigar isto e não o vamos tolerar”, garantiu no X o senador democrata Chris Van Hollen, de Maryland, em representação do estado onde fica a sede do organismo.
“A meteorologia não para nas fronteiras”
Um e-mail enviado aos funcionários na quarta-feira e analisado pelo The Washington Post dizia que os funcionários teriam de passar agora a submeter qualquer “compromisso internacional” para aprovação, incluindo viagens, reuniões presenciais ou reuniões de organizações internacionais. Questionada se isso inclui e-mails com colegas de diferentes nacionalidades, a orientação da equipa de Musk diria: “de momento, não”.
Mas “é literalmente impossível gerir o Serviço Nacional de Meteorologia sem falar com parceiros estrangeiros”, avisa no X o meteorologista e jornalista de clima, Eric Holthaus: “a meteorologia não para nas fronteiras”.
Apesar de tudo, Craig McLean, um ex-funcionário da NOAA, diz ao The Post que o pedido da nova administração não é propriamente inusitado, e que as diretivas não são necessariamente uma indicação de que Trump planeia recuar na colaboração internacional em meteorologia — mas “os nervos estão definitivamente à flor da pele”.
Os dados da NOAA, pelo menos por enquanto, baseiam-se na ciência e não em agendas políticas, mas com a limpeza alegadamente orquestrada pelo gabinete de Musk, passa a caber à administração decidir se quer ou não fazer alguma coisa em relação ao clima”, alerta Watters — “mas cortar os nossos olhos e ouvidos e dizer que vamos enfrentar o mundo de olhos vendados não me parece uma boa ideia.”
Vamos ter de deixar de confiar nas agências científicas norte-americanas, incluíndo a FDA que vai ser liderada por um conspiracionista. Os EUA mergulham no obscurantismo.