Chama-se Heitor. É uma tempestade muito peculiar, com a sua pontualidade única — e uma das mais estranhas ocorrências da vida.
Normalmente, os meteorologistas só dão nomes a sistemas meteorológicos que ameaçam ter impactos significativos numa grande área — como os furacões de que temos ouvido falar (e sentido os efeitos) nos últimos anos.
Mas “Hector the Convector“, ou Heitor, como decidimos chamar-lhe no ZAP, é uma exceção: é uma simples trovoada, que ganhou direito a nome próprio não pelo seu poder destrutivo, mas pela sua fiabilidade e consistência.
Este fenómeno meteorológico forma-se sobre as ilhas Tiwi, ao largo da costa de Darwin, no norte da Austrália, de forma tão fiável que se pode acertar o relógio por ele.
Quase todas as tardes, precisamente às 15 horas, durante as estações de chuva — de setembro a março — Heitor aparece e dá um ar da sua graça, conta-nos a climatologista Ceri Perkins num artigo na BBC Science Focus.
A sua consistência de relógio é o resultado de um microclima local, criado pelas brisas marítimas e pela topografia em forma de pirâmide das ilhas Tiwi.
Estas ilhas estão rodeadas de ar tropical marinho. Ao sol da manhã, o ar seco sobre a terra aquece mais rapidamente do que o ar húmido sobre o mar. À medida que o ar seco aquece, expande-se, criando uma bolsa de baixa pressão sobre as ilhas que suga o ar marinho para terra sob a forma de brisas marítimas da tarde.
Estas brisas marítimas chegam de todos os lados. Quando convergem para os picos, não têm para onde ir senão para cima, transportando consigo a humidade dos mares.
À medida que a coluna de ar sobe, arrefece e condensa, forma gotículas de água e nuvens, e injeta instabilidade na atmosfera, que rapidamente se transforma numa tempestade convectiva profunda. Daí o seu nome nativo: Hector, the Convetor.
Este nome foi-lhe dado pelos pilotos da Segunda Guerra Mundial, que usavam a sua enorme nuvem cumulonimbus como um farol de navegação quando voavam entre Darwin e Papua Nova Guiné.
De acordo com o Australian Bureau of Meteorology, Heitor é uma das tempestades mais consistentemente grandes do planeta, atingindo regularmente uma altura de mais de 19 mil metros — e ocasionalmente atingindo a estratosfera.
É também uma das mais bem estudadas. As trovoadas tendem normalmente a ser animais imprevisíveis e de curta duração, é difícil saber exatamente onde vão aparecer.
Mas desde os anos 1980 que os cientistas exploram a extraordinária fiabilidade de Heitor para sondar os mecanismos de formação de tempestades e investigar fenómenos como relâmpagos e correntes de ar ascendentes.
E também para acertar os seus relógios.