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O que é o neijuan — e porque é que a China está preocupada?

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A palavra tornou-se viral depois de um estudante ter sido filmado a trabalhar no seu computador portátil enquanto andava de bicicleta. Reflete uma mistura de competitividade e desespero no contexto do abrandamento da economia chinesa e o sentimento de que o progresso é impossível.

Na Internet chinesa, a atual situação do país — abrandamento do crescimento económico, queda da taxa de natalidade, escassa rede de segurança social, crescente isolamento na cena mundial — é frequentemente expressa através de chavões.

Foi o caso do tang ping, termo utilizado para descrever a jovem geração de chineses que a rejeitar a cultura do trabalho para “ficarem deitados” em vez de se esforçar na economia sob pressão da China, e do runxueou “filosofia da fuga” — a  vontade de emigrar do país.

Recentemente, ataques de “vingança contra a sociedade” — incidentes aleatórios de violência que ceifaram dezenas de vidas — suscitaram especial preocupação.

Agora, surge também o neijuan, o termo chinês para “involução” — um conceito da sociologia que se refere a uma sociedade que já não consegue evoluir, por muito que tente. Aplicado ao indivíduo, significa que, por mais que alguém se esforce, o progresso é impossível.

Na China, o termo tem sido utilizado para descrever a sensação de que a economia em crise está a provocar um decréscimo dos rendimentos. Os caracteres chineses “nei” e “juan” significam literalmente “rolar para dentro“.

Após décadas de crescimento rápido da economia do país, muitos chineses da geração do milénio e da geração Z sentem agora que as oportunidades que estavam disponíveis para os seus pais já não existem e que trabalhar arduamente já não oferece recompensas garantidas.

Os líderes chineses estão preocupados, e deixaram claro que não querem que a ideia do neijuan se torne mais popular do que já é, conta o The Guardian.

Em dezembro, os principais responsáveis pela política económica reuniram-se para a Conferência Central de Trabalho Económico, que define a agenda económica nacional. De acordo com a ata da reunião à porta fechada, os quadros comprometeram-se a “retificar a concorrência ‘involutiva'”.

Em junho, na cimeira de Davos, o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, alertou para a “espiral de ‘involução'” da economia mundial.

O conceito de neijuan aplica-se principalmente aos millennials e à geração Z, grupos da população que nos últimos anos foram duramente atingidos pelas dificuldades económicas da China.

O desemprego juvenil atingiu um recorde de 21,3% em junho de 2023 — após o que o governo deixou de publicar os dados. Desde então, voltou a publicar as estatísticas com uma metodologia revista. Os dados mais recentes mostram que a taxa de desemprego dos jovens urbanos entre os 16 e os 24 anos é de 17,1%.

Neijuan é também cada vez mais utilizado para descrever certos sectores. A China está a investir em massa no que chama “forças produtivas de nova qualidade“, o que significa concentrar-se mais na investigação e na produção em determinados sectores de alta tecnologia, como a energia solar, os veículos elétricos e baterias.

Mas o excesso de produção, associado às sanções dos EUA e de outros mercados ocidentais, conduziu a uma guerra de preços em alguns sectores, prejudicando a sua rentabilidade.

Embora o termo exista há décadas nos círculos académicos, tornou-se viral na Internet chinesa em 2020, depois de um estudante da Universidade de Tsinghua, uma das escolas de elite da China, ter sido filmado a andar de bicicleta com o portátil aberto, apoiado no guiador.

O jovem foi rapidamente foi coroado como “o rei involuído de Tsinghua” — e nasceu mais um meme, que  passou a representar a pressão, talvez inutilmente intensa, do ambiente de trabalho e a impossibilidade de fazer uma pausa.

O termo era particularmente popular na indústria tecnológica hiper-competitiva da China. Apesar de uma força de trabalho mais instruída do que qualquer geração anterior, muitos licenciados têm tido dificuldade em encontrar emprego em sectores rentáveis.

Esta situação tornou-se ainda mais problemática quando o governo chinês anunciou a sua política de “dupla redução” em 2021. concebida para aliviar a pressão sobre os estudantes, que proibiu as aulas particulares com fins lucrativos, tanto online como offline, torpedeando um sector que anteriormente tinha sido um importante empregador de jovens licenciados.

Segundo um estudo publicado em 2022, como resultado direto desta medida,  cerca de 10 milhões de chineses perderam os seus empregos.

ZAP //

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1 Comment

  1. Por estes lados a preocupação dos nossos políticos é nula. Até limpam o desemprego colocando as pessoas a fazer formação. Depois vêm os patrões dizer que não têm empregados para a miséria que pagam e só querem estrangeiros. É só ver na restauração que nem pagam horário nocturno a partir das 00h mas é só abrir o Uber Eats e vê-los a funcionar…

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