O álcool é atualmente a substância proativa mais utlilizada. Mas afinal, deve ou não beber um copo de vinho por dia?
Um estudo publicado nos EUA revela que o consumo excessivo de álcool entre os adultos aumentou mais de 20% durante a pandemia.
O relatório do Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD) mostra que quanto aos portugueses, entre 2017 e 2022, “não houve melhorias na maioria dos indicadores. Diminuiu a idade média de início dos consumos, aumentou o consumo recente e atual de álcool, a embriaguez severa, os consumos de risco elevado e a dependência (vindo a aumentar desde 2012 e quase quadruplicou em dez anos)”.
Pode ler-se ainda, que “os agravamentos foram transversais a ambos os sexos e à maioria dos grupos etários, embora mais expressivos nos homens e em algumas idades, como o consumo de risco elevado nos 15-24 anos e 25-34 anos e a dependência nos 35-44 anos e 45-54 anos”.
Já em Espanha, segundo o El confidencial, 93,2% da população entre os 15 e os 64 anos, tanto homens como mulheres, afirmam ter consumido bebidas espirituosas em algum momento da sua vida — estes dados provêm do último Inquérito sobre Álcool e Outras Drogas em Espanha (EDADES), que recolhe dados disponíveis de 1995 a 2022.
O relatório indica que o álcool e o tabaco são substâncias que começam a ser consumidas cedo. O primeiro consumo ocorre entre os 15,9 e os 17,3 anos de idade.
De acordo com Fernando Alonso Ecenarro, médico da Unidade de Toxicologia Clínica do Hospital de Manises e membro da direção da Socidroalcohol, uma sociedade científica que estuda e investiga as doenças de dependência, há uma claro aumento do consumo. “Durante o confinamento, diminuiu, sobretudo nos adolescentes. Agora, os níveis são mais elevados do que antes da pandemia“, explica.
Ecenarro diz ainda que a chave é perceber porque é que o alcoolismo está a aumentar. “A população tem cada vez mais fatores de stress“. O médico comenta ainda que, nos adolescentes, a desinibição e o consumo social desempenham um papel importante. “Temos de avançar para o consumo zero, porque o álcool é um dos principais fatores de carga de doença em Espanha e gera muita dependência”.
O médico acrescenta um aspeto que o preocupa particularmente: as emergências relacionadas com este consumo elevado. O indicador é medido nos utilizadores de substâncias psicoativas e é compilado pelo Observatório Espanhol da Droga e das Toxicodependências, que responde perante o Ministério da Saúde.
O último, publicado em 2023, inclui informações de 1987 a 2021, e mostra que dos 12.476 episódios de emergência relacionados com o uso de substâncias psicoativas, o álcool é o mais prevalente, representando 55,5% dos episódios.
Em contrapartida, as visitas hospitalares devidas a hipnosedativos representaram 33,5%, a canábis 21,3% e a cocaína 19,3%.
“É de salientar que, historicamente, este indicador apenas recolhia informação nos casos em que o álcool aparecia em conjunto com outra substância, pelo que os valores registados para os episódios relacionados com o álcool representavam apenas dados parciais sobre o impacto do consumo de álcool nas urgências. Por este critério, está presente, juntamente com outras substâncias psicoativas, em 41,4% das urgências relacionadas com drogas, valor que revela uma estabilização nos últimos anos”, refere o documento.
Quanto aos embustes em torno das bebidas espirituosas, o especialista afirma que “não existe uma quantidade segura”. Embora a análise dos seus efeitos tenha sido objeto de muita controvérsia nas últimas décadas, insiste que a mensagem vem da curva J.
Este aspeto é abordado em inúmeros estudos observacionais que associam o consumo de álcool em quantidades pequenas a moderadas a uma redução da mortalidade total e cardiovascular.
No entanto, Ecenarro afirma que a moderação “não está bem estabelecida”: a mensagem de que beber, especialmente vinho tinto, era melhor do que o consumo zero ainda está muito difundida atualmente, mas as provas em estudos bem fundamentados mostraram o contrário.
Além disso, um estudo publicado em julho passado no Journal of Studies on Alcohol and Drugs, conclui que as publicações anteriores segundo as quais o consumo moderado de álcool prolonga a vida apresentam “contradições de seleção que podem criar associações positivas e enganosas com saúde”.
“Estas crenças são amplamente difundidas e podem dissipar os avisos sobre os riscos para a saúde. A investigação futura deve averiguar se o tabagismo medeia, modera ou confude as relações entre o risco de mortalidade e o consumo de álcool”, concluiu.
Por sua vez, Austín S., representante dos Alcoólicos Anónimos em Espanha, sublinha que o toxicodependente “será sempre um toxicodependente”. Diz também que o papel da família no pedido de ajuda é muito importante, “mesmo que nos apercebamos, não o queremos admitir. Eu tinha medo de deixar de beber porque não conhecia outra forma de me divertir”.
Diz ainda que, em Espanha, a bebida está muito associada à cultura. “Não há festa onde não a encontremos. Quando se diz ‘vamos ver um copo’, não é café, é álcool”. Por esta razão, as pessoas com uma perturbação de dependência têm de fazer uma mudança radical nas suas vidas. “A primeira coisa a fazer é reconhecer que se tem um problema e pedir ajuda. Na organização em que nos reunimos para partilhar as nossas experiências, é preciso aprender a viver sem álcool e isso não é fácil. Toda a gente diz que não faz mal beber um copo de vinho, que não faz mal para eles, mas os toxicodependentes não conseguem parar”.