Empresas colaboraram secretamente para atingir os adolescentes com anúncios, contornando as regras da própria Google para promover o Instagram, de acordo com documentos obtidos pelo jornal Financial Times.
As gigantes tecnológicas Google e Meta, dona do Facebook e Instagram, colaboraram secretamente numa campanha publicitária destinada a atingir os adolescentes na rede social YouTube.
O objetivo seria promover especificamente o Instagram, numa parceria que contorna alegadamente as próprias regras da Google relativamente ao tratamento de menores online.
De acordo com documentos obtidos pelo Financial Times , que recorre também a fontes familiarizadas com o assunto, a Google envolveu-se num projeto de marketing secreto com a Meta, que se centrava nos utilizadores do YouTube com idades compreendidas entre os 13 e os 17 anos.
A campanha foi concebida para promover a aplicação Instagram da Meta junto desta faixa etária, tirando partido de um grupo de utilizadores do sistema de publicidade da Google identificado como “desconhecido”, mas que a empresa sabia, alegadamente, ser maioritariamente constituído por menores.
Num dos e-mails obtidos pelo jornal norte-americano, um gestor de anúncios da empresa Spark pede à Google que faça um pitch para a campanha. Pede que se foquem no grupo dos “13 aos 17” anos e exige que os dados sejam recolhidos diretamente dos consumidores.
Empresas tentaram esconder campanha (enquanto Zuckerberg pedia desculpa)
A ação violou diretamente as políticas da própria Google, que proíbem explicitamente a personalização e o direcionamento de anúncios para utilizadores com menos de 18 anos com base em dados demográficos.
O projeto também parecia violar as diretrizes contra a “segmentação por procuração”, um método utilizado para contornar as políticas estabelecidas.
Foram feitos esforços para disfarçar a verdadeira intenção da campanha para evitar a sua deteção, sugerem ainda os documentos citados pelo jornal.
A controversa campanha estava alegadamente em curso enquanto Mark Zuckerberg, CEO da Meta, comparecia perante o Congresso dos Estados Unidos para abordar preocupações sobre a segurança das crianças nas plataformas de redes sociais. Nessa altura, Zuckerberg apresentou desculpas às famílias de crianças que tinham sido prejudicadas nas suas plataformas.
A campanha terá sido testada inicialmente no Canadá, de fevereiro a abril de 2023, antes de ser testada nos Estados Unidos em maio. O seu sucesso terá levado as empresas a fazer outros planos para expandi-la internacionalmente e promover outras aplicações da Meta, incluindo o Facebook.
“Não se pode confiar”
“Não se pode confiar nas grandes empresas de tecnologia para proteger os nossos filhos“, disse a senadora republicana Marsha Blackburn ao FT: “mais uma vez, foram apanhados a explorar as nossas crianças e estes executivos de Silicon Valley provaram que darão sempre prioridade ao lucro em detrimento das nossas crianças.”
“A Meta está a sangrar os jovens e descobriu uma porta dos fundos”, metaforizou Jeff Chester, diretor executivo do Centro para a Democracia Digital.
Contactada pelo Financial Times, a Google respondeu com o cancelamento da campanha e arrancou com uma investigação sobre as alegações.
Um porta-voz da Google reforçou que a empresa proíbe anúncios personalizados para utilizadores com menos de 18 anos e alegou que as suas salvaguardas funcionaram como pretendido neste caso, impedindo a segmentação direta de utilizadores menores de idade registados. No entanto, não negou a utilização da lacuna “desconhecida”.
A Meta, por outro lado, defendeu a campanha, argumentando que o grupo de público “desconhecido” não constituía uma personalização ou uma violação das regras.
A notícia surge numa altura em que o Senado dos EUA está cada vez mais perto de aprovar o Kids Online Safety Act, um projeto de lei que visa impor às plataformas de redes sociais o dever de proteger as crianças de conteúdos online prejudiciais.