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“Pior do que culpado”. Único sobrevivente da tragédia em Tróia conta o que aconteceu

O timoneiro da embarcação que naufragou em Tróia, fala pela primeira vez, publicamente, sobre o que aconteceu. Morreram quatro pessoas, entre as quais uma criança.

Manuel Emídio, de 62 anos, foi o único sobrevivente do naufrágio em Tróia, em Grândola (Setúbal), no passado dia 7 de Abril, quando uma saída para pescar acabou da pior forma.

Morreram quatro pessoas, um homem de 45 anos e o filho de 11 anos, e dois irmãos de 21 e 23 anos.

Apenas o timoneiro da embarcação se salvou e, agora, confessa que está “mal”. “Sinto-me pior do que culpado, mas sei que o mar é que me fez isto”, diz em declarações à CNN Portugal.

Tinha as condições todas para isto não me acontecer e isto aconteceu-me”, lamenta ainda.

Eu podia lá ter ficado também, se calhar, teria sido tudo mais fácil“, acrescenta Manuel Emídio, um ex-Comando que conta que, naquele dia, tudo começou da melhor forma.

Foi “uma manhã bem começada”, trata de sublinhar na entrevista à CNN Portugal.

Após ir buscar as quatro vítimas da tragédia, foi para o sítio para onde navega sempre, quando vai à pesca.

Quando se apercebeu que o mar estava “um bocado alterado, estava a engrossar”, diz que voltou para trás, mas que levou com uma onda – “nem sei de onde é que ela veio” – que lhe virou a embarcação.

“Foi uma fracção de segundos“, relata, notando que o barco “ficou com a proa para cima”.

“Houve dois que eu supus que fossem logo cuspidos, o Ricardo [o pai da criança] e o amigo dele, e eu fiquei dentro do cockpit, voltado ao contrário, mesmo lá em baixo, com o filho dele, o miúdo”, revela.

Ficou “tudo cheio de água, só com uma bolsa de ar” e Manuel salienta que tentou acalmar o rapaz, dizendo-lhe que iam conseguir “safar-se”.

Foi, então, que decidiu “empurrar” o rapaz para fora, pensando que o pai já lá estaria para o ajudar.

“Consegui enfiar o rapaz lá para fora e eu não consegui sair, tive que voltar para trás, para tomar ar”, conta.

“O miúdo era o único que tinha colete”

“Na altura em que vou para sair, o barco dá outra volta”, continua. “Quando veio outra onda que fez a vaga, consegui ver a claridade e foi quando consegui mergulhar e sair para cá para fora”, relata também.

“Consegui ainda nadar para o barco e agarrei-me ao barco, e continuei sempre a vê-los”, diz, sublinhando que pensou que “se aparecesse alguém”, ainda conseguiriam “safar-se todos”.

Eu não consegui ir buscá-los, não conseguia de maneira nenhuma porque eles já estavam longe e cada vez afastavam-se mais”, relata. “Ainda estavam com vida, a gritar – eu nem quero ouvir os gritos”, aponta, realçando que se sentiu “impotente”.

A única pessoa que eu não vi foi o miúdo, que era o único que tinha colete”, relata também, sublinhando que “é normal” e que só é costume colocar os coletes “na altura da pesca”.

“Entretanto, o barco ia andando para baixo e para cima, e houve uma altura em que perdeu o ar todo e afundou“, conta ainda. Nessa altura, largou o barco e continuou a nadar. Foi, então, que apareceu outra embarcação que o resgatou.

Manuel Emídio assegura ainda que o naufrágio ocorreu antes de chegar à zona dos Cabeços, uma espécie de ilha de areia em Tróia, e que, portanto, não há hipótese de a embarcação ter batido nalguma coisa.

O timoneiro também garante que a embarcação estava “nova, nova, nova”, que a tinha “comprado há pouco tempo”, e diz que o seguro cobria os ocupantes.

Manuel também conta que iam dividir as despesas da pescaria entre todos, mas não chegaram a fazer contas.

Duas vítimas ainda desaparecidas

Os corpos do rapaz de 11 anos e do jovem de 23 anos já foram resgatados do mar no próprio dia do naufrágio. Mas as autoridades continuam a tentar localizar as outras duas vítimas de 21 e 45 anos.

Nesta sexta-feira, foi encontrado o corpo de uma pessoa na praia do Bico das Lulas, em Tróia, suspeitando-se que possa ser o de uma das vítimas do naufrágio.

Na quinta-feira, foi encontrado outro corpo, “em avançado estado de decomposição”, numa praia da zona da Comporta, no concelho de Grândola.

Para já, não há confirmação oficial de que sejam os corpos das vítimas do naufrágio em Tróia.

Susana Valente, ZAP //

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