Dois ataques em menos de 48 horas na Eslováquia reacenderam o debate: o que deve a Europa fazer com os ursos?
Quando os bielorrussos Constantin, de 29 anos, e Tatiana, de 31, caminhavam no passado dia 15 de março até à área do pico Na Jame num parque nacional eslovaco, depararam-se com um urso macho de cerca de 120 kg e correram, em direções opostas.
Após perder o contacto com a namorada, o instrutor de esqui pediu ajuda aos serviços de resgate da montanha, que encontraram o corpo de Tatiana no fundo de uma ravina, com ferimentos na cabeça que se acreditam ter sido fatais.
Até hoje não se sabe se o jovem urso atacou Tatiana ou se os ferimentos resultaram da queda, mas o que é certo é que a sua morte reacendeu debates sobre os esforços de conservação dos ursos, que argumenta contra a segurança pública na Eslováquia e por toda a Europa, onde as populações de ursos são protegidas por lei.
O incidente — que já não era isolado — repetiu-se poucas horas depois. Noutra instância, cinco pessoas com idades entre 10 e 72 anos ficaram feridas na cidade eslovaca de Liptovský Mikuláš, perto das montanhas Tatra.
Apesar das explícitas proibições de caça sob as leis eslovacas e europeias, as discussões sobre a possibilidade de abater ursos para reduzir conflitos com humanos já não são novas. Desde que recebeu proteção em 1992, a população de ursos no continente recuperou bastante: cerca de 17 mil ursos pardos moram hoje na Europa, o que significa, além de um sucesso de conservação, mais ataques.
No entanto, os especialistas continuam a sublinhar que o problema não está nos ursos, mas sim nas pessoas.
Medo instintivo (e injustificado)
“Realmente começou com a imprensa e os políticos a fazerem algumas declarações injustificadas”, diz ao Wired Robin Rigg, um zoólogo britânico e presidente da Sociedade de Vida Selvagem Eslovaca, sobre os relatórios iniciais que sugeriram que Tatiana pode ter sido morta pelo urso e não pela queda. “Foi dito em público — na verdade por alguém do Ministério do Ambiente — que foi um ataque predatório, mas não vejo nenhuma prova disso”, confessa.
Embora o animal estivesse perto do corpo quando os socorristas encontraram Tatiana, “isso não significa que o urso tencionava matá-la e consumi-la”, diz Rigg, que reforça que nenhuma das fotos divulgadas mostra sinais de consumo.
Mas então, o que aconteceu? O incidente ocorreu numa área típica de hibernação de ursos, e numa época em que estes animais estão a acordar.
“O que pode acontecer às vezes é o urso reagir agressivamente em sua defesa, que é o que eu acho que é mais provável que tenha acontecido neste caso — que foi assustado pela aparição destas duas pessoas”, diz Rigg.
“É extremamente raro na Europa ter ataques predatórios, e não é algo comum em qualquer parte do mundo. Na verdade, estatisticamente, é mais provável ser atingido por um raio ou ter uma reação alérgica a uma picada de abelha”, diz Rigg, “mas as pessoas não se preocupam tanto com isso quanto se preocupam com um grande animal com dentes afiados e garras. Isso remonta a um medo instintivo que está connosco desde os tempos pré-históricos.”
Perante dois incidentes com ursos em menos de 48 horas, a tendência imediata é perguntar: ‘O que devemos fazer com os ursos?’.
A solução
Os especialistas argumentam que o abate não é a solução para prevenir futuras tragédias. Em vez disso, enfatizam a necessidade de educação sobre a coexistência com os ursos.
O conhecimento e comportamento adequados evitariam muitos encontros perigosos — e o mesmo aplica-se nos dois casos na Eslováquia.
“Infelizmente, o caminho que escolheram era muito arriscado”, reforça Rigg. “Não é uma rota de caminhada reconhecida, e é uma parte do parque que está estritamente protegida, por isso não deveriam estar lá. Além disso, é uma área calcária onde eu esperaria que houvesse ursos em tocas.”
“Teria sido melhor se tivessem ficado juntos e tentado manter a calma, se possível”, diz o especialista, uma vez que os ursos quase nunca atacam pessoas em grupos. Não há “um único caso onde duas pessoas se mantiveram firmes e o urso atacou”, afirma outro especialista, Tom Smith, com base no Banco de Dados de Conflitos Humanos-Ursos da América do Norte.